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TJ/SP confirma regularidade de exigência de ITCMD por tabeliã: discussão sobre base de cálculo Deve ocorrer na via judicial
Processo 0013238-09.2025.8.26.0100
Espécie: PROCESSO
Número: 0013238-09.2025.8.26.0100
Processo 0013238-09.2025.8.26.0100
Pedido de Providências – Reclamação do extrajudicial (formulada por usuários do serviço) – Ouvidoria Judicial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – Eduardo Francisco de Oliveira Junior e outro – Juiz(a) de Direito: Fernanda Perez Jacomini VISTOS, Cuida-se de representação formulada por patrono de herdeiras em procedimento de inventário extrajudicial, inicialmente distribuído ao Conselho Nacional de Justiça, reencaminhado a este Juízo Corregedor Permanente pela Ouvidoria Judicial deste Egrégio Tribunal de Justiça, alegando falha na prestação de serviço pela Sra. 1º Tabeliã de Notas desta Capital ao exigir comprovantes de recolhimento do ITCMD com base em regulamentação que reputa inconstitucional e/ou ilegal. Os autos foram instruídos com os documentos de fls. 10/89. A Senhora Titular prestou esclarecimentos à fl. 95. O Senhor Representante tornou aos autos para reiterar os termos de seu protesto inicial (fls. 99/102). O Ministério Público opinou pelo arquivamento dos autos, considerando a ausência de ilícito funcional na atuação da Sra. Delegatária ao regularmente fiscalizar o recolhimento dos emolumentos (fls. 105/107). Determinou-se a juntada do documento indicado à fl. 09 (negativa de seguimento do inventário extrajudicial) pelo Sr. Representante e que esclarecesse se a ilegalidade e/ou inconstitucionalidade de Decreto por si referida envolve a alteração do parágrafo único do art. 16 do Decreto Estadual nº 46.655/02 pelo Decreto Estadual nº 55.002/09 ou outro fundamento. Em sua resposta, confirmou o objeto da controvérsia e indicou “Resposta à Consulta Tributária” efetivada junto à Fazenda Pública acerca da base de cálculo do ITCMD, pugnando pela expedição de certidão negativa pelo Tabelionato para continuidade do inventário extrajudicial. Ainda, juntou e-mails das tratativas com a Serventia. É o breve relatório. Decido. Trata-se de representação formulada em face da Sra. 1ª Tabeliã de Notas desta Capital, em razão de exigências que reputa ilegais e/ou inconstitucionais. Segundo o Sr. Representante, a unidade cartorária exigiu a apresentação de comprovantes de recolhimento do ITCMD “com base em regulamentação estabelecida por decreto estadual e/ou portaria administrativa, os quais são manifestamente inconstitucionais” por contrariedade ao Princípio da Legalidade Tributária previsto no art. 150, inciso I, da Constituição Federal. Acrescentou que a exigência impede o regular processamento do inventário extrajudicial, viola o art. 97 do Código Tributário Nacional, também referente à legalidade, e contraria jurisprudência do E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e do Supremo Tribunal Federal. Em suma, entende suficiente a geração de guia e recolhimento do ITCMD com base no valor venal do imóvel, não do valor venal referencial. A seu turno, a Sra. Tabeliã esclareceu que somente solicitou a comprovação do recolhimento tributário na forma da regulamentação estadual, vez que subordinada ao princípio da legalidade e que eventual inconstitucionalidade deve ser objeto de apreciação pelo Poder Judiciário (fl. 95). Por sua vez, o Sr. Representante reiterou os termos de sua insurgência, acrescentando que este E. Tribunal e o Colégio Notarial comungam do entendimento de que a base de cálculo do ITCMD não deve modificada por Decreto Estadual. Ademais, a Fazenda Estadual teria indicado o valor venal do bem como base de cálculo do ITCMD, de modo que restou afastado o valor venal referencial. Por fim, o Ministério Público ofereceu parecer opinando pela regularidade da atuação da Sra. Titular, visto que cumpriu seu dever de fiscalização do recolhimento tributário e não lhe é possível declarar a inconstitucionalidade da redação conferida pelo Decreto Estadual nº 55.002/09 ao Decreto Estadual nº 46.655/02. Pois bem. Primeiramente, esclareço ao Sr. Representante que a matéria aqui ventilada é objeto de apreciação no limitado campo de atribuição administrativo desta Corregedoria Permanente, que desempenha, dentre outras atividades, a verificação do cumprimento dos deveres e obrigações dos titulares e interinos de delegações afetas à Corregedoria Permanente desta 2ª Vara de Registros Públicos da Capital. Portanto, extrapola do âmbito de atribuições deste Juízo a matéria atinente à legalidade da base de cálculo do ITCMD, a qual pode ser questionada pelas vias adequadas. Infere-se dos autos que a Senhora Tabeliã alega ter cumprido a legislação referente ao ITCMD, visto que a utilização do valor venal de referência do ITBI é medida amparada pelo Decreto Estadual nº 55.002/09, ainda vigente. Conforme alegado pelo Sr. Representante, é cediço que este Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo vem se posicionando pela ilegalidade do Decreto Estadual nº 55.002/09, o qual alterou o parágrafo único do art. 16 do Decreto Estadual nº 46.555/02 para possibilitar que valor venal de imóvel seja fixado por legislação local, como ocorre na utilização do valor venal de referência do ITBI: REEXAME NECESSÁRIO Mandado de segurança. ITCMD. Base de cálculo que deve corresponder ao valor venal para fins de cobrança do IPTU. Inteligência do art. 38 do Código Tributário Nacional e dos arts. 9º e 13, da Lei Estadual nº 10.705/00. Impossibilidade de se majorar tributo por meio de decreto. Legalidade tributária (art. 150, inciso I, da Constituição Federal, c.c. art. 97, inciso II e IV, § 1º, do Código Tributário Nacional). Previsão legal de arbitramento que não confere à Fazenda o poder de estabelecer, por decreto, parâmetro genérico e indistinto para o cálculo do ITCMD. Prevalência do único referencial previsto em Lei. Custas e emolumentos notariais. Base de cálculo que deve observar o valor efetivamente recolhido a título de imposto. Precedente. Sentença mantida. Recurso oficial desprovido. (TJSP; Remessa Necessária Cível 1030789-68.2021.8.26.0053; rel. Des. Bandeira Lins; Órgão Julgador: 8ª Câmara de Direito Público; Foro Central – Fazenda Pública/Acidentes – 9ª Vara de Fazenda Pública; Data do Julgamento: 24/02/2023; Data de Registro: 27/02/2023). Denota-se da leitura da ementa e do referido julgado, o entendimento deste Tribunal: como a base de incidência do ITCMD é o valor venal do bem transmitido, previsto na Lei Estadual nº 10.705/00, o Decreto regulamentador mencionado não poderia inovar em relação à lei, sob pena de ofender o Princípio da Legalidade consagrado na Constituição Federal e no Código Tributário Nacional. Em geral, a base de cálculo do ITCMD deve ser o valor venal do imóvel lançado para fins de IPTU e, por conseguinte, a base de cálculo dos emolumentos dos notários considera o valor do imposto efetivamente recolhido. Todavia, no caso em tela, a Senhora Notária cumpriu seu dever de fiscalizar o recolhimento do tributo (ITCMD), conforme exigência da Legislação Estadual e seu respectivo Decreto regulamentador, resguardando-se em face da atuação fazendária. Nos termos do art. 134, inciso VI, do Código Tribunal Nacional e do art. 289 da Lei nº 6.015/73, incumbe aos Oficiais Registradores e aos Tabeliães a fiscalização do pagamento dos impostos devidos por força de seus atos, sob pena de serem por eles responsabilizados solidariamente. Portanto, agiu em respeito à legalidade, à segurança jurídica e à eficácia do ato jurídico que lhe foi apresentado. Por outro lado, rememoro decisão desta Corregedoria no Pedido de Providências de nº 1010141-91.2019.8.26.0100, salientando que o Egrégio Conselho Superior da Magistratura já fixou entendimento no sentido de que a qualificação feita pelos Notários e Registradores não vai além da aferição sobre a existência ou não de recolhimento do tributo, e não sobre o valor recolhido (Apelação Cível 1024222-11.2015.8.26.0577, Des. Pinheiro Franco – Corregedor Geral, Conselho Superior de Magistratura, j. 24/05/2018). Desse modo, cabe ao Município efetuar o lançamento de eventuais diferenças e se valer dos meios adequados para cobrança de valor recolhido a menor. Aliás, naqueles autos (1010141-91.2019.8.26.0100), em grau recursal, em parecer (528/2019-E) do MM. Juiz Assessor Dr. José Marcelo Tossi Silva, acolhido pelo então E. Corregedor Geral da Justiça, Dr. Geraldo Francisco Pinheiro Franco, consignou-se que “preferindo a donatária promover a declaração do ITCMD utilizando como base de cálculo o valor venal do imóvel, e não o valor venal de referência, não se verifica falta administrativa na ausência da recusa do Tabelião de Notas em lavrar a escritura (…)”. Todavia, existe o risco de imputação da responsabilidade solidária dos Tabeliães de Notas pelo débito tributário por parte do fisco, como ocorreu na autuação verificada nos autos supracitados. Nesse ponto, segundo a Ementa da Resposta à Consulta Tributária 26702/2022, de 07 de Novembro de 2022, indicada pelo Sr. Representante, “I. A base de cálculo do ITCMD, na transmissão de imóvel urbano, é o valor venal do bem, que deve refletir o valor de mercado do bem transmitido”. De outro lado, a Portaria CAT-15, de 06-02-2003, na redação atual do art. 16-A e seu parágrafo único, estabelece que: Art. 16-A- na hipótese de transmissão causa mortis ou de doação de bem imóvel ou direito a ele relativo, a base de cálculo do ITCMD é o valor venal do bem imóvel, assim considerado o seu valor de mercado na data da abertura da sucessão ou da realização do ato ou contrato de doação (§ 1º do artigo 12 do Decreto 46.655/02). (Artigo acrescentado pela PortariaCAT-29/11, de 04-03-2011, DOE 05-03-2011) Parágrafo único – para fins da determinação da base de cálculo de que trata o caput deste artigo, será admitido, em se tratando de imóvel (parágrafo único do artigo 16 do Decreto 46.655/02): 1 – rural, o valor médio da terra-nua e das benfeitorias divulgado pelo Instituto de Economia Agrícola da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo ou por outro órgão de reconhecida idoneidade, vigente à data da ocorrência do fato gerador, desde que não inferior ao valor total do imóvel declarado pelo contribuinte para efeito de lançamento do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural – ITR; 2 – urbano, o valor venal de referência do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis – ITBI divulgado ou utilizado pelo município, vigente à data da ocorrência do fato gerador, nos termos da respectiva legislação, desde que não inferior ao fixado para o lançamento do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana – IPTU. Sugerindo que a Resposta à Consulta Tributária 26702/2022 disse menos do que pretendia, veja-se a Resposta à Consulta Tributária 31158/25, em seu item 13: 13. Destaca-se ainda que o item 2 do parágrafo único do artigo 16 do RITCMD/SP traz a possibilidade de se adotar o valor venal de referência do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis – ITBI divulgado ou utilizado pelo município, vigente à data da ocorrência do fato gerador. Tendo em vista que as tabelas de referência devem ser atualizadas constantemente, entende-se que esse valor, em tese, deverá se aproximar do valor venal. Portanto, percebe-se que o intenso debate na seara tributária remanesce, devendo a questão ser decidida no âmbito jurisdicional, não administrativo, por não ser competência deste Juízo Corregedor Permanente decidir acerca da inconstitucionalidade, incompatibilidade ou ilegalidade da normativa estadual. Dessarte, diante dos esclarecimentos prestados, do intenso debate tributário e da complexidade da matéria, verifico que a insurgência não merece acolhimento, não havendo que se falar em falha ou ilícito administrativo pela Senhora Tabeliã na prestação dos serviços extrajudiciais. Por conseguinte, reputo satisfatórias as explicações apresentadas pela Senhora Tabelioa para exigência de comprovante do recolhimento do ITCMD nos termos da normativa estadual vigente ou de Mandado de Segurança que tenha lhe assegurado a base de cálculo almejada (fl. 115), não vislumbrando responsabilidade funcional apta a ensejar a instauração de procedimento administrativo, no âmbito disciplinar. Nessas condições, à míngua de providência censório-disciplinar a ser adotada, determino o arquivamento dos autos. Encaminhe-se cópia integral dos autos à Egrégia Corregedoria Geral da Justiça e à E. Ouvidoria Judicial, por e-mail, servindo a presente como ofício. Ciência ao Senhor Delegatário, ao Ministério Público e ao Senhor Representante. I.C. – ADV: EDUARDO FRANCISCO DE OLIVEIRA JUNIOR (OAB 441878/SP) (DJe de 14.05.2025 – SP)
Fonte: DJE