Notícias
STJ: Corte Especial valida mudança de nome feita por brasileiro nos EUA
Corte homologou sentença estrangeira ao entender que a alteração foi feita conforme a lei do país de residência e não viola o ordenamento jurídico brasileiro.
A Corte Especial do STJ decidiu, por unanimidade, homologar sentença estrangeira que autorizou a alteração completa do nome de cidadão brasileiro, inclusive com a retirada do sobrenome de família. O colegiado entendeu que, estando preenchidos os requisitos legais e regimentais, a mudança é válida mesmo que o novo nome não siga o modelo tradicional adotado no Brasil.
A decisão considerou que a alteração não afronta a ordem pública brasileira nem viola normas fundamentais do ordenamento jurídico nacional, ressaltando que, conforme art. 7º da Lindb, o nome civil deve ser regido pela lei do país de domicílio da pessoa.
Entenda o caso
O pedido foi apresentado por cidadão brasileiro domiciliado nos Estados Unidos, que solicitou a homologação de sentença da Suprema Corte do Condado de Suffolk, Nova York. A decisão estrangeira reconheceu sua naturalização norte-americana e autorizou a mudança total de seu nome, sem manter qualquer sobrenome da família.
O MPF se manifestou contrariamente ao pedido, argumentando que a legislação brasileira não permite a supressão completa do sobrenome e que a sentença violaria a ordem pública nacional. Também sustentou que não foram preenchidos os requisitos formais para homologação da naturalização, motivo pelo qual requereu a improcedência do pedido.
Lei do domicílio rege questões sobre nome
A ministra Maria Isabel Gallotti, relatora do caso, acolheu parcialmente o pedido: negou a homologação da naturalização por ausência dos requisitos legais exigidos, mas deferiu a homologação da sentença estrangeira que autorizou a mudança de nome do requerente. A alteração, segundo destacou, foi realizada conforme a legislação norte-americana, e o interessado comprovou residência nos Estados Unidos.
De acordo com a ministra, o artigo 7º da Lindb estabelece que a lei do país de domicílio da pessoa rege questões relativas ao início e fim da personalidade, ao nome, à capacidade civil e aos direitos de família.
Assim, por ter sido efetuada nos Estados Unidos, a alteração de nome não está sujeita às regras da lei de registros públicos brasileira (lei 6.015/73), tampouco se enquadra entre as matérias de competência exclusiva da autoridade judiciária nacional.
A relatora também destacou que a mudança promovida não viola normas fundamentais do ordenamento jurídico brasileiro. Pelo contrário, apontou que a legislação nacional tem evoluído sobre o tema.
A lei 14.382/22, por exemplo, flexibilizou as regras para alteração de prenome – que pode ser feita de forma extrajudicial e sem necessidade de motivação relevante – e também facilitou a alteração de sobrenomes, inclusive com a possibilidade de inclusão ou resgate de nomes de ascendentes.
“A escolha de prenome e de sobrenome de origem anglófona é compreensível e razoável no caso do requerente, já que evita possível estigma ou discriminação no país de que se tornou nacional. A mudança de sobrenome não é totalmente estranha ao nosso ordenamento. Tampouco viola, no caso concreto, qualquer interesse público relevante ou de terceiros.”
Sem ofensa ao ordenamento jurídico brasileiro
Ao analisar a compatibilidade da sentença estrangeira com os princípios fundamentais do direito brasileiro, a relatora enfatizou que a cláusula de ordem pública deve ser aplicada com cautela e apenas nos casos em que houver risco de reconhecimento de situações jurídicas incompatíveis com normas do ordenamento nacional.
“A cláusula de ordem pública serve para evitar o reconhecimento de direitos que contradizem normas basilares de nosso ordenamento. Em geral, a doutrina de direito internacional privado entende, por exemplo, que países ocidentais tendem a não reconhecer mais de uma esposa, mesmo que o marido seja domiciliado em país de Direito islâmico. Entende-se que a poliginia contraria normas básicas e nucleares das regras nacionais de direito de família e de direito das sucessões.”
A ministra concluiu que não houve afronta à ordem pública e que todos os requisitos legais para a homologação da sentença estrangeira foram devidamente cumpridos.
Com base nesses fundamentos, a Corte Especial do STJ homologou, por unanimidade, a sentença estrangeira que autorizou a mudança completa do nome do requerente.
–
Martinelli Advogados analisa limite do TJ/SC ao uso da usucapião
Segundo análise de David Monteiro, advogado de Direito Imobiliário no Martinelli Advogados, a Corte passa a inviabilizar estratégia comumente usada para evitar custos tributários e taxas de cartórios.
Uma recente decisão tomada pelo Grupo de Câmaras de Direito Civil do TJ/SC trouxe um alerta importante para o setor imobiliário.
No julgamento de um IRDR – Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas, em 22/5/25, foi aprovada por unanimidade a tese que restringe o uso da usucapião em contextos em que existam caminhos viáveis e legítimos para a regularização da propriedade.
Na prática, segundo o Martinelli Advogados, a Corte padronizou a interpretação sobre o tema, inviabilizando uma estratégia que vinha sendo comumente utilizada como alternativa mais barata à formalização imobiliária via escritura e registro, que era a entrada com ação de usucapião mesmo quando havia contrato de compra e venda e possibilidade de regularização administrativa.
As ações de usucapião são frequentemente utilizadas para evitar custos tributários, como o ITBI, além das taxas dos cartórios. “A partir de agora, a tentativa de evitar essas despesas poderá ser interpretada como desvio de finalidade e resultar na extinção do processo, atingindo principalmente os chamados contratos de gaveta, que são os compromissos de compra e venda não levados ao registro, muitas vezes antigos e feitos de forma informal”, explica David Monteiro, advogado especialista em Direito Imobiliário no Martinelli.
Segundo ele, a nova orientação não proíbe a usucapião, mas estabelece um filtro rigoroso definindo que a ação só será permitida quando houver um obstáculo real e comprovado que impeça a transmissão da propriedade pelos meios tradicionais, como escritura pública e registro, com base no §2°, do art. 410, do provimento 149/CNJ. Desta maneira, o simples fato de a área ainda não estar desmembrada ou matriculada não basta.
“Até aqui, havia relativa tolerância judicial quanto ao uso da usucapião nesses casos, desde que houvesse posse prolongada e pacífica, mas a tese firmada pelo TJ de Santa Catarina afasta esse mecanismo usado muitas vezes para driblar as regras de parcelamento do solo e ilidir as custas administrativas e tributárias”, observa Monteiro.
Em termos imobiliários, o novo entendimento impacta a regularização de imóveis em fase de estruturação, sobretudo quando o histórico de propriedade do bem apresenta lacunas ou informalidades. Loteamentos informais, imóveis em áreas não desmembradas e contratos sem registro passam a exigir maior cautela jurídica por parte dos envolvidos.
Para quem opera no mercado imobiliário, especialmente investidores, loteadores e incorporadores, a mensagem é clara de que estratégias informais de titulação elevam o risco jurídico e podem comprometer o valor de um ativo.
“Em um ambiente de crescente rigor jurisprudencial, não basta a viabilidade econômica de um terreno, é preciso diligência documental e estratégia jurídica estruturada desde a origem, de modo que a segurança registral, antes vista como um detalhe resolvível “depois”, passa a ser critério determinante para viabilizar negócios e acessar crédito”, afirma o advogado.
Os efeitos da decisão foram modulados, fazendo com que a tese valha apenas para ações de usucapião ajuizadas após a publicação da decisão, o que alivia para os processos em andamento.
Embora decisões pontuais já tenham sinalizado entendimentos semelhantes, o julgamento pelo Grupo de Câmaras de Direito Civil do TJ/SC, em sede de IRDR, é inédito pela sua força vinculante no âmbito estadual e pela sistematização da tese.
Na avaliação do advogado, a tendência é que outros tribunais passem a adotar linha semelhante, sobretudo se o STJ, futuramente, confirmar a diretriz em recurso repetitivo.
“A mensagem do TJ/SC é clara: O Judiciário está disposto a separar o joio do trigo, de modo que a usucapião continua sendo ferramenta legítima de regularização, mas não pode ser banalizada como atalho para escapar de tributos ou etapas legais”, afirma Monteiro.
“No novo contexto, o mercado precisa se ajustar e quem quiser garantir segurança jurídica e valorização patrimonial dos imóveis precisa abandonar soluções improvisadas e partir para a formalização tradicional com escritura, pagamento de ITBI, emolumentos e registro volta ao centro da mesa”, observa o advogado.
Para ele, a tese fixada é relevante como orientação jurisprudencial para todo o país e deve ser considerada como elemento estratégico na análise de viabilidade da usucapião e, quando aplicável, pode ser invocada em juízo, seja para fundamentar ou afastar a pertinência da ação.
“O importante é que cada caso seja analisado à luz dos seus elementos específicos, considerando sempre a existência ou não de obstáculos reais à via tradicional”, finaliza Monteiro.