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Proposta sobre casamento infantil gera indignação no Iraque

27-11-2017

Uma proposta no Parlamento iraquiano para eliminar a idade mínima para meninas muçulmanas poderem se casar gerou uma onda de indignação, ao ser vista como uma licença “para se violentar crianças”. Em 31 de outubro, os deputados conservadores xiitas propuseram uma emenda a uma lei de 1959 que estabelece em 18 anos a idade mínima para o casamento.

Aprovada pouco depois da queda da monarquia iraquiana, a legislação inicial transferiu o direito de decidir sobre assuntos de família das autoridades religiosas para o Estado e seu Poder Judiciário. Agora, porém, o novo projeto de lei parece dar marcha a ré, autorizando o casamento para qualquer menina que tenha o consentimento de líderes religiosos das comunidades muçulmanas xiita, ou sunita, à qual seus pais pertençam. Assim, faz “a opinião dos ‘ulemás’ [sábios] xiitas e sunitas ser obrigatória para os juízes”, afirmou um deputado liberal independente, Faiq Al-Sheikh, membro da comissão jurídica do Iraque.

Historicamente, lembrou ele, o Islã permitiu que adolescentes se casem, desde os nove anos, a idade que Aisha teria quando, supostamente, casou-se com o profeta Maomé.

As críticas contra a iniciativa legislativa inundaram as redes sociais, indo da indignação ao humor negro. Nas ruas, a insatisfação também é grande. “É uma lei digna do [grupo] Estado Islâmico, que dá cobertura legal ao estupro de menores”, denunciou o militar reformado Hadi Abbas, à AFP, na cidade de Kut, no sul do país.

O professor Ali Lefta, de 40 anos, da cidade portuária de Basra, afirmou que o projeto de lei contribuirá “para o assassinato da inocência das crianças” e que constitui “a última de uma série de leis estúpidas baseadas em formas de pensar tribais e confessionais”.

“Volta à Idade Média”

Defendendo o projeto proposto por seu partido, Ammar Toama, que lidera o grupo parlamentar xiita Fadila, afirmou que a iniciativa “não menciona a idade e estipula unicamente que ela [a noiva] deve ser púbere, capaz de decidir e contar com o acordo de seu tutor e de um juiz”. Segundo a Constituição iraquiana, os cidadãos têm de declarar sua fé religiosa em alguns casos, mas as questões do matrimônio e a herença diferem entre xiitas e sunitas.

As missões estrangeiras em Bagdá e nas Nações Unidas advertiram contra qualquer discriminação inconstitucional de mulheres e crianças.

Muitos iraquianos — como Safia Mohssen, mãe de três filhas — também se opõem, ironizando as prioridades dos deputados. “Temos guerra, crises, desemprego e, ainda assim, nosso Parlamento está ocupado com leis que violam os direitos das crianças!”, reclamou. “Os islamitas querem que voltemos para a Idade Média”, completou.

Majeda Al Tamimi, uma legisladora, disse acreditar que muitas de suas colegas no Parlamento vão-se opor ao projeto. Passando, ou não, mulheres como Umm Mohammed, da província rural de Zi Qar, conservadora, que se casou aos 14 anos, continuam achando que casamento é um assunto de família. “Apenas as famílias sabem quando sua filha atingiu a puberdade e em qual idade pode se casar”, defende essa iraquiana, de 65 anos. (AFP)

Fonte: Jornal Cruzeiro do Sul