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Patrão não pode emprestar mais do que empregado pode pagar
por Nadia Demoliner Lacerda
Os empréstimos consignados, instituídos pela Lei 10.820/03, ainda suscitam dúvidas quanto aos procedimentos para o desconto das parcelas dos empréstimos em folha de pagamento e nas verbas rescisórias. Não raro, os sindicatos se recusam a homologar rescisão de contrato de trabalho por não concordarem com os descontos efetuados a título de empréstimos consignados contratados pelo trabalhador.
A Lei 10.820/03, regulamentada pelos Decretos 4.840/03 e 5.892/06, se refere aos conceitos de remuneração básica, descontos legais, remuneração disponível e descontos voluntários, como elementos de orientação à aplicação dos descontos dos empréstimos consignados.
A lei permite ao empregado autorizar de forma irrevogável e irretratável descontos em folha de pagamento e nas verbas rescisórias de prestações de empréstimos, financiamentos e operações de arrendamento mercantil, concedidos por instituições financeiras e sociedades de arrendamento mercantil.
Qualquer desconto em folha e em verbas rescisórias só poderá ser efetuado se a autorização do empregado constar expressamente no contrato firmado entre o empregado e a instituição financeira.
O empregador é responsável pelas informações prestadas, pela retenção e repasse dos valores às instituições, até o quinto dia útil após o pagamento do empregado, respondendo sempre como devedor principal e solidário perante a instituição consignatária por valores a ela devidos que deixarem de ser retidos ou repassados por sua falha ou culpa. Não será, porém, co-responsável pelo pagamento dos empréstimos, financiamentos e arrendamentos mercantis concedidos aos mutuários, salvo disposição contratual contrária.
É importante mencionar que a lei não restringiu a quantidade de empréstimos consignados, mas estabeleceu que o percentual de desconto em folha não pode ultrapassar 30% da remuneração disponível do empregado, de acordo com o Decreto 4.840/03.
Em relação ao percentual máximo de desconto, após análise da fórmula apresentada no referido decreto, se conclui:
– a soma dos descontos (de um ou mais empréstimos consignados) não pode exceder a 30% da remuneração disponível;
– a soma total dos descontos (empréstimos consignados (+) quaisquer outros descontos salariais autorizados voluntariamente pelo empregado, por exemplo, um outro empréstimo ajustado livremente com o empregador) não pode exceder a 40% da remuneração disponível;
– Em caso de rescisão do contrato de trabalho, a soma dos descontos não pode ultrapassar os 30% das verbas rescisórias devidas.
Como se observa, o limite máximo de desconto dos empréstimos consignados é de 30% da remuneração disponível. Mesmo quando o empregado tenha outra operação ajustada livremente com o seu empregador com desconto mensal sobre os seus salários e verbas rescisórias, permanece o limite máximo de 30% de desconto. Mas o desconto da operação voluntária não poderá ultrapassar 10% da remuneração disponível.
O Decreto 4.840/2003 estabelece também que a base de cálculo para o desconto em folha de pagamento é a remuneração disponível do empregado. A lei conceitua como remuneração disponível o valor que sobrar da remuneração básica, após as deduções de contribuição para a Previdência Social oficial; pensão alimentícia judicial; imposto sobre rendimentos do trabalho; decisão judicial ou administrativa; mensalidade e contribuição em favor de entidades sindicais; e outros descontos compulsórios instituídos por lei ou decorrentes do contrato de trabalho.
A ei também define que remuneração básica é a soma das parcelas pagas mensalmente ao empregado, excluídas: diárias; ajuda de custo; adicional pela prestação de serviço extraordinário; gratificação natalina; auxílio-natalidade; auxílio-funeral; adicional de férias; auxílio-alimentação, mesmo se pago em dinheiro; auxílio-transporte, mesmo se pago em dinheiro; e parcelas referentes à antecipação de competência futura ou pagamento retroativo.
Em síntese, a remuneração disponível é a resultante da subtração da remuneração básica e dos descontos (consignações legais). O percentual de desconto em folha é de 30% da remuneração disponível, condicionado ainda ao máximo de 40% da mesma remuneração, além dos descontos autorizados pelo empregado (consignações voluntárias), além dos legais.
Exemplificando, se o empregado tem remuneração básica de R$ 1 mil e descontos legais de R$ 300, possui remuneração disponível de R$ 700. Nesse caso, o limite de desconto das prestações será de R$ 210. Se o empregado não tem deduções voluntárias, este é o valor máximo do desconto das prestações. Porém, se tem descontos voluntários, o limite para desconto das prestações é de R$ 280 (40% sobre R$ 700). Assim, mesmo se os descontos voluntários forem superiores a R$ 70, ficarão automaticamente limitados a R$ 70, porque o desconto máximo das prestações não poderá exceder a R$ 210.
É importante observar que se empregado tem dívida voluntária, o empregador poderá deduzir o percentual de 40%, mas desde que observada a seguinte base de cálculo: deduzir da remuneração as deduções legais e sobre esse resultado descontar as prestações do empréstimo consignado equivalente a 30% e no máximo mais a resultante de 10% do empréstimo voluntário. Em relação à base de cálculo para as deduções em verbas rescisórias, esta corresponde à importância devida pelo empregador ao empregado em razão da rescisão, excluído o adicional de férias e a gratificação natalina.
Com essas considerações, se conclui que o empregador que excede os limites fixados pela lei de empréstimo consignado assume o risco de não obter homologação das rescisões contratuais perante os sindicatos, além de ficar sujeito a discussões judiciais.
Revista Consultor Jurídico, 8 de setembro de 2007
Sobre o autor
Nadia Demoliner Lacerda: é especialista em Direito do Trabalho do escritório Mesquita Barros Advogados