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Parecer – Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) nos serviços de Registros Públicos, cartorários e notariais
Por Roque Antonio Carrazza, Professor Titular da Cadeira de Direito Tributário da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – Consultor Tributário
Parecer
Consulta
O prestigioso SINDICATO DOS NOTÁRIOS E REGISTRADORES DO ESTADO DE SÃO PAULO – SINOREG (Consulente), na pessoa de seu ilustre Presidente, o Dr. CLAUDIO MARÇAL FREIRE, solicita-nos uma manifestação opinativa acerca da juridicidade dos itens 21 e 21.1, da lista de serviços anexa à Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003, que consideram “fato gerador” do imposto sobre serviços de qualquer natureza (ISS), a prestação de “serviços de registros públicos, cartorários e notariais”.
Posto isto, o preclaro Presidente do SINOREG submete à nossa apreciação os seguintes quesitos:
“1º) Teria a Lei Complementar nº 116/03 o condão de alterar a natureza jurídica de ‘taxa de serviço’ dos emolumentos remuneratórios dos atos praticados pelos serviços notariais e de registros?
“2º) Sendo os emolumentos fixados para a prática dos atos notariais e de registros, remuneratórios de serviços públicos, ainda que em caráter privado por delegação do Poder Público, estão sujeitos à tributação por meio de imposto sobre serviços de qualquer natureza(ISS)?
“3º) Quais as indicações quanto a vícios de inconstitucionalidade ou ilegalidade dos itens 21 e 21.1, da Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 116/03 e quais os possíveis caminhos jurídicos que nos poderiam ser apontados?”.
2. Circunscrição do problema e encaminhamento de sua solução jurídica
Pretende-se saber, em síntese, se uma lei complementar pode considerar passíveis de tributação por meio de ISS, os “serviços de registros públicos, cartorários e notariais”.
Para levarmos a bom termo a honrosa missão que nos foi confiada, teceremos, num primeiro momento, algumas considerações sobre o perfil constitucional do ISS e o alcance da lei complementar a que alude o art. 156, III, in fine, da Constituição Federal.
De seguida, com base nas conclusões a que tivermos chegado, cuidaremos do caso concreto, tratando de dar respostas cientificas aos quesitos que nos foram apresentados.
3. O Perfil constitucional do ISS
I – É ponto bem averiguado que a Constituição Federal ocupa, dentro do ordenamento jurídico, posição sobranceira, dando fundamento de validade a todos os atos emanados dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. Encimando a pirâmide jurídica, consagra grandes princípios, que interferem, de modo especial, no significado, conteúdo e alcance das normas tributárias.
Realmente, estas devem estar em perfeita sintonia com os princípios fundamentais (legalidade, igualdade, justiça, segurança etc) postos no Código Supremo, que não só apontou os fatos que podem ser alcançados pela tributação, como estabeleceu os limites e condições de seu exercício.
Em suma, a União, os Estados-membros, os Municípios e o Distrito Federal, enquanto tributam, encontram, na Constituição, perfeitamente demarcados, os caminhos que podem palmilhar. Dito de outro modo, mais técnico, ela disciplinou, rigorosa e exaustivamente, as competências tributárias, traçando a regra-matriz de cada figura exacional, aí incluído o imposto sobre serviços de qualquer natureza(IPI).
Com estas breves anotações, desejamos pôr em destaque que o perfil jurídico do ISS, tributo de competência municipal, já se encontra desenhado, com retoques à perfeição, no próprio Texto Magno. Deveras, ela traçou, com grande riqueza de pormenores, os contornos desta figura exacional, de tal sorte que o legislador ordinário, ao institui-la, não poderá superar uma série de limites constitucionais.
II – Sendo mais específicos, o ISS vem genericamente previsto no art. 156, III, da Constituição Federal, que estabelece:
Impende notar que só por amor à brevidade é que escrevemos que “podem ser alcançados pelo ISS os serviços prestados”. Na realidade,
“Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:
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” III – impostos sobre serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar.”
Portanto, no Brasil, o Município é competente para tributar, por meio de imposto, os serviços de qualquer natureza, exceção feita aos serviços de transporte transmunicipal e de comunicação, estes tributáveis por meio de ICMS (ex vi justamente do art. 155, II, da CF).
Na realidade, o ISS não alcança simplesmente o serviço, mas sim a prestação (onerosa) do serviço.¹ Daí podermos já avançar o raciocínio no sentido de que o tributo em questão nasce sempre de um fazer, isto é, de um prestar serviços.
III – Mas, quais serviços podem ser alcançados pelo ISS?
Como demonstra Elizabeth Nazar Carrazza,² podem ser alcançados pelo ISS, os serviços prestados – por particulares, empresas privadas, empresas públicas ou sociedades de economia mista – sob regime de Direito Privado.
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¹. Embora a Constituição, em seu art. 156, III, faça expressa menção a serviços, ela, elipticamente, está aludindo a serviços prestados a terceiros, ou seja, a prestações de serviços. Isto fica mais claro se cotejarmos este dispositivo com o art. 155, II, do mesmo Diploma Magno ( referido no art. 156, III), que confere, aos Estados, competência para tributar, via ICMS, “prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação” (grifamos).
². O ISS na Constituição, dissertação de mestrado, inédito, apresentada na PUC/SP, em 1976.
alcançáveis pelo ISS são aspessoas, físicas ou jurídicas, que prestam serviços, a terceiros, sob regime de Direito Privado.
Impende notar que só por amor à brevidade é que escrevemos que “podem ser alcançados pelo ISS os serviços prestados”. Na realidade, alcançáveis pelo ISS são aspessoas, físicas ou jurídicas, que prestam serviços, a terceiros, sob regime de Direito Privado.
Registramos, a propósito, que o regime de Direito Privado pressupõe a liberdade de contratar. Por isso, o serviço tributável por meio de ISS deve advir de um contrato de Direito Privado,³ livremente pactuado entre o prestador e o fruidor.4
Deveras, o Iss depende, para nascer ” in concreto”, da existência de um serviço, prestado, a terceiro, com autonomia e fito de lucro, na mesma linha da definição do Código Civil, que, no seu art. 594, assim dispõe sobre a prestação de serviço: “toda a espécie de serviço ou trabalho lícito, material ou imaterial, pode ser contratada mediante retribuição.”
Portanto, o serviço sobre o qual pode incidir o imposto em exame é o colocado in commercium ( no mundo dos negócios), sendo submetido, em sua prestação, ao regime de direito privado, que se caracteriza pela autonomia das vontades e pela igualdade das partes contratantes.
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³. Pontes de Miranda, a propósito, é categórico: ” O contrato de serviços e o contrato de trabalho, estrito senso, são, no Código Civil e na legislação do trabalho, contratos de direito privado” (Tratado de Direito Privado, 2ª ed., tomo XLVII, Rio de Janeiro, Borsói, 1964, p. 9).
4. No mesmo sentido, Aliomar Baleeiro pontifica: ” o fato gerador (do ISS) pressupõe prestação de serviços a terceiros côo negócio ou profissão” ( Direito Tributário Brasileiro, 10ª ed. , Rio de Janeiro, Forense, 1981, p. 282 – esclarecemos no parêntese).
Esta idéia é suficientemente lata, de modo a albergar toda e qualquer prestação de utilidade, assim material ( v.g., uma obra de engenharia), que imaterial (p. ex., os serviços prestados por profissionais liberais stricto sensu), que não tipifique serviço público.
IV – De fato, o serviço público, isto é, a prestação de utilidade material, fruível individualmente, sob regime de direito público,5escapa ao ISS, nos expressos termos do art. 150, VI, a, da Constituição Federal.6
Este dispositivo veda que os serviços da alçada do Poder Público (serviços públicos) abram espaço à tributação por meio de impostos. Tais serviços, desde que específicos e divisíveis, somente podem ensejar taxas (de serviço).
Detalhando o assunto, Aires Fernandino Barreto averba:
Será, pois logicamente aberrante ( e inconstitucional) a previsão de ‘imposto’ recaindo sobre o patrimônio, as rendas e os serviços das pessoas públicas – por isso, inclusive, referidos pela regra imunitória do art. 150, VI, a, da Constituição Federal.
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5. Este conceito de serviço público deita raízes nas clássicas lições de Celso Antônio Bandeira de Mello; verbis: ” Serviço público é toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material fruível diretamente pelos administrados, prestada pelo Estado ou por quem lhe faça as vezes, sob um regime de direito público – portanto consagrador de prerrogativas de supremacia e de restrições especiais – instituído pelo Estado em favor dos interesses que houver definido como próprios no sistema normativo” ( Prestação de serviços Públicos e Administração Indireta, Editora Revista dos Tribunais, São Paulo, 1973, p. 1).
6. Constituição Federal – ” Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (…) VI – instituir impostos sobre: a) o patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros”.
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“Disso resulta evidente e manifesto que a prestação de serviços públicos – típica e ontológica atividade estatal que é – não pode consistir em hipótese de incidência de imposto; de nenhum imposto, inclusive do imposto sobre serviços“.7
Ademais, na medida em que as taxas não podem ter “base de cálculo própria de impostos” (art. 145, § 2º, da CF), elas só podem medir atuações estatais; nunca fatos regidos pelo Direito Privado, como, por exemplo, as prestações de serviço livremente contratadas, por particulares, mediante retribuição.
Logo, a contrario sensu, os impostos, aí compreendido o ISS, só podem tomar por base de cálculo o valor de fatos regidos pelo Direito Privado; jamais – sob pena de irremissível inconstitucionalidade – o valor de atuações estatais (v.g., os serviços públicos específicos e divisíveis).
Serviços públicos específicos e divisíveis só podem ser remunerados por meio de taxas de serviço, ex vi do disposto no art. 145, II, 2ª parte, da Constituição Federal.8 E tais tributos não se descaracterizam, ainda que, por autorização legislativa, venham
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7. ISS na Constituição e na Lei, Dialética, São Paulo, 2003, p. 61 – grifamos.
8. Constituição Federal – ” Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:
(…) II – taxas, em razão do exercício do poder de polícia oupela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição” (grifamos).
arrecadados por pessoas diversas daquelas que os instituíram, caso em que estaremos diante do fenômeno jurídico da parafiscalidade.9
V – Temos por demonstrado, pois, que, nos termos da Constituição, a hipótese de incidência10 do ISS só pode ser a prestação, a terceiro, de uma utilidade (material ou imaterial), com conteúdo econômico, sob regime de Direito Privado.
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9. Parafiscalidade é a delegação de capacidade tributária ativa (direito de cobrar o tributo) que a pessoa política, por meio de lei, faz a terceira pessoa ( de direito público ou se de direito privado, perseguidora de finalidade públicas), que, por vontade desta mesma lei, passa a dispor do produto arrecadado.
Ressalte-se que o tributo não perde esta natureza jurídica, ainda que arrecadado por pessoa diversa daquela que o criou, como, de resto, procuramos demonstrar em nosso livro ” O sujeito Ativo da Obrigação Tributária” ( Ed. Resenha Tributária, São Paulo, 1977, pp. 36 a 56).
10. Hipótese de incidência é o fato, descrito em lei, que, acontecido, faz nascer a relação jurídica tributária, que tem por objeto a dívida tributária. Ou, se preferirmos, invocando as lições sempre preciosas de Geraldo Ataliba, é o fato, descrito em lei, que, se e quando acontecido, faz nascer, para uma dada pessoa, o dever de pagar o tributo.
Não devemos confundir este fato, descrito em lei, e por ela alçado à condição de hipótese ou suposto, com a ocorrência real deste fato. Noutros termos, mais técnicos, não devemos confundir a hipótese de incidência tributária (fato gerador “in abstracto” do tributo), com o fato imponível do tributo (fato gerador “in concreto” do tributo).
Esta, diga-se de passagem, é distinção conceitual que a melhor doutrina vem fazendo com clareza. Deveras, uma realidade é o fato descrito em lei, que, acontecido, faz nascer o tributo (a hipótese de incidência) e, outra, muito diversa, é o fato que aconteceu, isto é, que realizou o tipo tributário e, por isso mesmo, determinou o surgimento, “in concreto”, da exação (o fato imponível). Estamos, neste passo, diante de dois planos distintos e, por isso mesmo, inconfundíveis: o primeiro abstrato, normativo; o outro, concreto, fático. A hipótese de incidência está na lei; o fato imponível, no mundo fenomênico.
O tributo só pode ser validamente exigido quando um fato ajusta-se rigorosamente a uma hipótese de incidência tributária. E este fato outro não é senão o fato imponível. Vale, a propósito, a clássica asserção de Albert Hensel: ” Só deves pagar tributo se realizas o fato imponível” ( Diritto Tributário, trad. De Dino Jarach, Milano, Dott. Giuffrè – Editore, 1956, p. 148. Literalmente, a frase é: ” Il comando – tu devi pagare delle imposte – é sempre condizionato dalla frase: se tu realizzi la fattispecie legale”).
Atentemos, agora, para a parte final do art. 156, III, da Constituição Federal ( ” definidos em lei complementar”).
3.1 Os ” serviços definidos em lei complementar”
I – Sem embargo de nossa opinião em contrário, tem prevalecido o entendimento de que cabe à lei complementar apontar quais serviços podem ser tributados, pelos Municípios, por meio de ISS e, por exclusão, quais os que escapam à incidência deste tributo.
Noutras palavras, a doutrina tradicional ¹¹ sustenta que a Lista de Serviços étaxativa, de tal sorte que só quem presta os serviços nela referidos pode ser alcançado pelo ISS.
Com supedâneo nesta diretriz – que não discutiremos¹² – a Lei Complementar nº 116/03 (que veio dar nova
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¹¹. Lidera esta corrente o inolvidável mestre Aliomar Baleeiro, cujas lições, sobre este assunto, encontram-se magnificamente bem expostas em seu clássico Direito Tributário Brasileiro (Forense, Rio de Janeiro, 11ª ed., 1999, pp. 500 e 501).
¹². A nosso ver, uma interpretação sistemática do art. 156, III, ” in fine”, da Constituição, revela que não cabe à lei complementar apontar quais serviços podem ser tributados pelos Municípios.
Com efeito, se os Municípios desfrutam de ampla autonomia e se tal autonomia é assegurada principalmente com a decretação e arrecadação dos tributos de sua competência (art. 30, III, da CF), indisputável que o campo de incidência do ISS não pode ser alterado por lei complementar. Do contrário, estaríamos aceitando, ao arrepio do princípio da autonomia municipal, que é o Congresso Nacional, por meio de lei complementar, que confere aos Municípios competências para que tributem os serviços de qualquer natureza.
Na verdade, estamos convencidos de que a lei complementar referida no art. 156, III, da Constituição, só pode veicular normas gerais em matéria de legislação tributária. Assim, deve ater-se a dispor sobre conflitos de competência, entre o ISS e outros tributos federais, estaduais ou municipais e a regular as limitações constitucionais ao redação ao Decreto-lei nº 406/68, ao Decreto-lei nº 834/69 e à Lei Complementar nº 56/87 e à Lei Complementar nº 100/99) veicula uma Lista de Serviços tributáveis pelos Municípios. Sob esta óptica, somente a pessoa que vier a prestar um dos serviços nela expressamente referidos, poderá ser alcançada pelo ISS.
Exercício da competência para tributar por meio de ISS. Afora isso, segundo pensamos, tal lei complementar nada pode fazer.
Percebemos, pois, que ao legislador complementar não é dado determinar quais serviços o Município pode e, em contrapartida, quais serviços o Município não pode tributar, por via de ISS.
Apesar de tudo, a Lei Complementar nº 116/03 ( que veio dar nova redação ao Decreto-lei nº 406/68, ao Decreto-lei nº 834/69, à Lei Complementar nº 56/87 e à Lei Complementar nº 100/99, veiculou uma Lista de Serviços tributáveis pelos Municípios.
Esta Lista não pode ser taxativa, sob pena de termos de aceitar que a União, querendo, pode esvaziar a competência que os Municípios receberam, da Carta Constitucional, para tributar, por via de imposto, os serviços de qualquer natureza.
Deveras, fosse taxativa a Lista, que hoje arrola mais de 500 serviços tributáveis pelos Municípios, nada impediria, em tese, que, amanhã, por força da edição de novas leis complementares, viesse a reduzi-los para 50, 30, 20, 10 ou 5. Ainda em tese, nada impediria fosse pura e simplesmente revogada. Muito bem: que aconteceria, nesta ” situação limite”? Uma lei complementar (norma infraconstitucional) paralisaria a eficácia de uma norma constitucional de eficácia plena, subvertendo o sistema constitucional tributário, já que, por via reflexa ( ou seja, pelo esvaziamento de uma competência impositiva), desconsideraria o magno princípio da autonomia municipal.
Terá, então, a lista de serviços caráter exemplificativo? Também não, porquanto muitos dos “serviços” nela contidos simplesmente não são serviços de qualquer natureza. É o caso da locação de bens móveis, típica cessão de direitos e, nesta medida, intributável por meio de ISS. A única pessoa política que poderia tributar, por meio de imposto, a cessão de direitos seria a União, com base em sua competência residual (art. 154, I, da CF). Lembramos que as competências tributárias – todas elas, sem exceção – estão sob reserva constitucional.
Portanto, a Lista de Serviços, segundo estamos convencidos, não é nem taxativa, nem exemplificativa, mas, meramente sugestiva. Contém sugestões que, desde que constitucionais, poderão ser levadas em conta pelo legislador municipal, ao instituir, “in abstrato”, o ISS. Prestações de serviços não mencionadas na referida Lista, desde que, evidentemente, tipifiquem verdadeiras prestações de serviços, poderão ser alvo de tributação municipal (se, é claro, o Município legislar neste sentido).
Feito o registro, no entanto, vamos aceitar que a Lista de Serviços é taxativa, porque nossa posição flagrantemente minoritária, não encontra a menor acústica em nossos Tribunais.
Dito de outro modo, a maioria dos doutrinadores aceita que a Lista encerra um numerus clausus, de tal sorte que prestações que tipificam serviços podem perfeitamente nela não estar incluídas, inibindo, destarte, a competência tributária dos Municípios. Portanto, para os adeptos desta corrente, o Município não pode, nem mesmo por meio de lei, ampliar o rol de serviços constantes da Lista.
Tal linha de pensamento tem encontrado acústica em nossos Tribunais, sendo mansa, pacífica e remansosa no Pretório Excelso.¹³
Assim, vamos aceitar,como premissa de trabalho, que compete à lei complementar apontar os serviços que os Municípios estão credenciados a tributar por meio de ISS. Em contranota, vamos igualmente aceitar que, à falta de autorização em lei complementar, não é dado, aos Municípios, tributar qualquer serviço. Ou, em se preferindo, vamos ter presente que os Municípios podem tributar apenas os serviços de qualquer natureza que a lei complementar vier a definir.
II – Uma coisa, porém, é certa: fatos que não configuram prestações de serviços privados, ou que estejam no campo material de impostos federais ou estaduais,14 não podem ser tributados por meio de ISS, ainda que uma lei complementar assim o permita. Aliás,
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¹³. O Supremo TribunalFederaldecidiu, vezes iterativas, que a Lista de serviços tributáveis pelo Município é taxativa. Tudo sinaliza, pois, no sentido de que eventuais afrontas a esta posição cairão por terra, quando forem levadas à apreciação da mais alta Corte do País.
14. Absolutamente não pode a lei complementar submeter ao ISS fato jurídico que a Constituição reservou à tributação dos Estados ou da União. Se o fizer, será inconstitucional, por atentatória ao princípio da reserva das competências tributárias.
lei complementar deste jaez seria inconstitucional, porque estaria ampliando o âmbito de abrangência do ISS e, o que é muito pior, atropelando o direito subjetivo que todos os contribuintes têm, de só serem tributados pela pessoa política competente, observadas as regras-matrizes exacionais, postas no Diploma Magno.
Serviços novos só podem ser inseridos na Lista se forem, em tese, tributáveis por meio de ISS. Ou, se preferirmos, a lei complementar não pode “definir” ou “arrolar” fatos intributáveis pelo ISS ( que poderíamos chamar de não-serviços).
Também a Lista não pode criar “serviços tributáveis” por analogia, equiparação, ficção ou presunção. Tampouco considerar serviços, para fins de ISS, fatos regidos pelo Direito Público (v.g., os serviços públicos).
É que não é dado a nenhuma lei complementar transformar em serviço tributável por meio de ISS, o que prestação de serviço privado não é, por faltar-lhe as características apontadas no item 3, supra.
III – Tudo isto nos leva a concluir que a lei complementar definidora de serviços tributáveis, não diz a última palavra, quando dá à estampa a ” Lista de Serviços” (ainda que – insista-se – esta “Lista” seja havida por taxativa). Não. Mesmo nesta hipótese, a última palavra já está dita pela Constituição Federal. A previsão em lei complementar, por si só, não garante que se está em face de uma verdadeira prestação de serviço, tributável por meio de ISS.
Detalhando o assunto, pode acontecer de a lei complementar incluir no rol dos serviços tributáveis pelos Municípios, serviços públicos. Nesse caso, não há o que discutir: a lei complementar será irremissivelmente inconstitucional.15
É que a lei municipal, ao cuidar do ISS, não poderá, por força do princípio da rigidez das competências tributárias, ir além do conceito de “serviços tributáveis”, constitucionalmente posto. Mesmo que a lei complementar a tanto a “autorize”.
Com base nestas ponderações, vejamos qual a natureza jurídica dos “serviços de registros públicos, cartorários e notariais” e se são alcançáveis pelo ISS.
4. Natureza jurídica dos serviços de registros públicos, cartorários e notariais
Os serviços de registros públicos, cartorários e notariais são serviços públicos. Realmente, são prestados, mediante procedimento de Direito Público, para a satisfação de interesses coletivos.
Mais: são serviços públicos específicos e disisíveis, porque sempre se referem a alguém e podem ter sua utilização, efetiva ou potencial, individualmente considerada.
A equação não se altera, mesmo sendo exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público. 16 Ainda assim, continuam a ser serviços públicos específicos e divisíveis.
Ora, serviços públicos específicos e divisíveis, como vimos no item 3-IV, supra, só podem ser remunerados por meio de taxas de serviço. 17
O que estamos querendo significar é que os emolumentos remuneratórios dos atos praticados pelos serviços notariais e de registro (serventias de Notas, Protesto de Títulos, Registro de Distribuição, Registro de Imóveis, Registro de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Naturais) têm natureza jurídica de taxas de serviço.
É o que também pensa Sacha Calmon Navarro Coelho; verbis:
“As ‘custas’ e os ‘emolumentos são taxas’, pela prestação dos serviços públicos ora ligados à certificação dos atos e negócios ora conectados ao aparato administrativo e cartorial que serve de suporte a prestação jurisdicional”.18
Aliás, a natureza jurídica de taxas de serviço, dos emolumentos remuneratórios dos atos praticados pelos serviços notariais e de registros, encontra-se pacificada, por força de uma série de decisões do Supremo Tribunal Federal (v.g., na ADIN 1444-7 PR). Como o tema é incontroverso e conta com o prestigioso abono da jurisprudência da Suprema Corte, aqui não o desenvolveremos.
Segue-se, pois, que a Lei Complementar nº 116/03, a pretexto de veicular a Lista de Serviços tributáveis por meio de ISS, não tem o condão de alterar a naturez
a jurídica de “taxa de serviço” dos emolumentos remuneratórios dos atos praticados pelos serviços notariais e de registros.
Fixada esta premissa, questionaremos a possibilidade jurídica das serventias de Notas, Protestos de Títulos, Registro de Distribuição, Registro de Imóveis, Registro de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas jurídicas e Registro Civil das Pessoas Naturais, enquanto praticam seus atos típicos, isto é, enquanto prestam “serviços de registros públicos, cartorários e notariais”, virem a ser compelidas a recolher ISS.
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15. A competência tributária municipal para criar o ISS está delineada na Constituição Federal, não podendo ter suas fronteiras alteradas por meio de lei complementar.
16. A titularidade de tal delegação dá-se mediante concurso público de provas e títulos, realizados de acordo com ditames fixados por lei dos Estados e do Distrito Federal, em observância às normas gerais veiculadas pela Lei Federal nº 10.169, de 28 de dezembro de 2002.
Esta lei federal buscou fundamento de validade no art. 236, § 2º, da Constituição Federal: “Art. 236. (“omissis”) – § 2º. Lei federal estabelecerá normas gerais para fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro” (grifamos).
17. Os serviços públicos são indisponíveis, estando, pois, fora do comércio (extra-commercium). São, pois, insusceptíveis de negociação, quer por parte do Estado, quer do contribuinte. O Estado é obrigado a presta-los, nos termos da lei. Não podem ser remunerados por meio de preços (também chamados preços públicos ou tarifas), já que estes configuram a contrapartida de uma prestação contratual voluntária, sendo informados pela autonomia da vontade e, não, pela força da lei.
Para maior aprofundamento do assunto, v. nosso Curso de Direito Constitucional Tributário (Malheiros Editores, São Paulo, 19ª ed., 2003, pp. 477 a 483).
18.Comentários à Constituição de 1988: Sistema Tributário, Forense, Rio de Janeiro, 2ª ed., 1990, p. 65.
Já adiantamos que esta possibilidade jurídica não existe, apesar do disposto nos itens 21 e 21.1, da Lista de Serviços veiculada pela Lei Complementar nº 116/03, que são inconstitucionais. Todavia, para não ficarmos no plano das simples alegações, trataremos de demonstrar a assertiva.
5. A inconstitucionalidade dos itens 21.e 21.1, da Lista de Serviços
A Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003 (que deu nova redação à “Lista de Serviços”), estipula, em seus itens 21 e 21.1, serem tributáveis, por meio de ISS, os “serviços de registros públicos, cartorários e notariais.”
Tais itens são inconstitucionais.
Com efeito, os “serviços de registros públicos, cartorários e notariais” são serviços públicos específicos e divisíveis, tanto que remunerados por meio de taxas de serviços.
É o quanto basta para que se infira que a serventias que os prestam não podem, nem mesmo com base em lei complementar definidora de serviços, ser compelidas a recolher ISS.
Note-se que a circunstância de a Lei Complementar nº 116/03 haver, nos preditos itens 21 e 21.1, da Lista, rotulando de “serviços” tributáveis por meio de ISS as atividades de registros públicos, cartorárias e notariais, não altera as conclusões a que chegamos.
É que, como é sabido e consabido, o noniem iuris, em si mesmo, nada significa.
Com efeito, a natureza de qualquer figura de Direito é-nos revelada pelo regime jurídico19 a que está submetida e, não, pela designação recebida.
Corretíssima, a respeito, a lição de Pontes de Miranda:
“Na exposição científica do Direito não podemos deixar que a terminologia perturbe o sistema jurídico ou a visão dele”20
As palavras e expressões são meros rótulos que utilizamos para designar as coisas e realidades que formam nosso Universo. Absolutamente não alteram a essência destas coisas e realidades.
Como preleciona Hospers,²¹ qualquer palavra ou expressão é conveniente, na medida em que nos colocamos de acordo sobre ela e a usamos de maneira adequada. As palavras ou expressões manifestam, somente, o estabelecido, convencionalmente, pela linguagem comum ou científica, e não estão ligadas a exclusivas essências conceituais, determinadas como verdadeiras e únicas.
Transplantando estas idéias, apenas esboçadas, para o nosso campo de trabalho, se um fato tipifica uma prestação de serviço público específico e divisível (porque obedece ao regime jurídico próprio da espécie), pouco importa, máxime para fins tributários, venha rotulado “prestação de serviço” alcançável pelo ISS.
Dentro decorre que os serviços públicos específicos e divisíveis de registros públicos, cartorários e notariais não se transmudaram em prestações de serviços privados, só porque assim vieram atecnicamente denominados pelo legislador complementar. Não é positivamente o nome que atribui entidade às coisas.
Afinal, como averbava o grande Agostinho Alvim, os problemas da dogmática jurídica não podem ser resolvidos pela taxinomia. Frase extremamente feliz, quer pela síntese, quer pelo rigor científico.²² Não é a designação que revela a natureza dos institutos jurídicos.
Sustentar que as expressões da Lista “serviços de registros públicos, cartorários e notariais”, em si mesmas consideradas, eliminam a possibilidade de estar-se diante de serviços públicos específicos e divisíveis (intributáveis por meio de ISS), é fazer tábua rasa das clássicas lições dos antigos romanos, que nos legaram o conhecidíssimo brocardo “verba non mutant substantia rei.”
Do exposto, a despeito do estatuído nos itens 21 e 21.1, da
Lista de Serviços, os atos praticados pelos serviços notariais e de registros não tipificam serviços prestados sob regime de Direito Privado, não, podendo, destarte, ser alvo de tributação por meio de ISS.
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19. Regime jurídico é o conjunto de princípios e normas que incidem sobre um determinado objeto de Direito, moldando-lhe as feições.
20. Tratado de Direito Privado, vol. 22, Rio, Borsói, 1958, p. 13.
21. Introdución al Análisis Filosófico, Tomo I, Buenos Aires, Abeledo Perrot, 1966, p. 35.
22. De modo mais empírico, a sabedoria medieval já proclamava “barba non facit monachum” ( a barba não faz o monge).
Remarcamos que nem mesmo a lei complementar (no caso, a Lei Complementar nº 116/03) pode quebrar a estrutura constitucional do ISS, muito menos para prejudicar direitos subjetivos dos contribuintes.
6. Medidas judiciais que podem vir a ser tomadas pelo Consulente
Para precatar-se, inclusive contra possíveis autuações, o Consulente pode valer-se de várias medidas judiciais.
Antes de cuidarmos de algumas delas, lembramos que a Lei das Leis, máxime em seu art. 5º, § 2º, implicitamente confere, a todo e qualquer contribuinte, o direito de não pagar tributo criado ou cobrado em desacordo com os ditames constitucionais. É o chamado “direito de resistência à tributação indevida”.
Noutras palavras, o atual Diploma Constitucional não se limitou a reconhecer a possibilidade de o contribuinte insurgir-se contra a tributação indevida. Fez muito mais do que isto: conferiu-lhe os meios processuais adequados a este fim (o mandado de segurança, a ação declaratória acompanhada de antecipação de tutela, o direito à repetição do indébito tributários etc).
Aprofundando a idéia, a Constituição Federal, em seu art. 5º, XXXV, garante, a todas as pessoas (físicas ou jurídicas), livre acesso ao Poder Judiciário; verbis:
“Art. 5º – (“omissis”):
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“XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.
Este inciso garante a ação, isto é, o direito – insuscetível de restrição ou supressão por norma infraconstitucional – de postular em Juízo, com todos os seus consectários: direito à citação regular, direito ao contraditório (direito de defesa), direito ao juiz competente (juiz natural), direito ao devido processo legal (due processo of law) etc.
Calham bem, as seguintes ponderações de Alessandro Pace:
“Quando se alude à ‘tutela jurisdicional’, como a garantia mais importante dos direitos, o discurso não pode limitar-se, obviamente, ao mero ‘acesso à jurisdição’. Se não existissem específicos técnicas de garantia (independência da função jurisdicional, imparcialidade do magistrado, motivação da decisão, direito à prova, princípio do contraditório etc), o recurso à ‘Justiça’ não se distinguiria do recurso a qualquer outro órgão público”²³
Sendo mais específicos, as pessoas têm a assisti-las o direito de, a qualquer tempo, irem ao Judiciário, para que este Poder decida, com imparcialidade, se as exigências do Fisco encontram, ou não, boa acústica na Constituição.
É que o inciso XXXV em análise encerra normas constitucionais de eficácia plena, que, como se sabe, atuam prontamente, assim que postas em vigor. Independem, para produzir todos os efeitos que lhes são próprios, da edição de normas inferiores que lhes explicitem o conteúdo. Por isso mesmo, são de aplicabilidade imediata (José Afonso da Silva).
Muito bem, nesta altura de nosso parecer cremos que está mais do que demonstrado que os itens 21 e 21.1, da Lista de Serviços veiculada pela Lei Complementar nº 116/03, padecem de incontornáveis inconstitucionalidades.
Para afasta-las há vários remédios, dentre os quais merecem destaque a ação direta de inconstitucionalidade, o mandado de segurança e a ação declaratória.
6.1 Do cabimento da ação direta de inconstitucionalidade
O controle abstrato de constitucionalidade dos itens 21 e 21.1, da Lista de Serviços veiculada pela Lei Complementar nº 116/03, pode ser realizado por via de ação direta de inconstitucionalidade.
Permitimo-nos lembrar que, no Brasil, o controle da constitucionalidade, pelo órgão jurisdicional, pode dar-se por via deação ou deexceção (defesa).
De fato, a alegação de inconstitucionalidade de qualquer lei ou ato normativo pode ser feita incidentalmente, no curso do processo judicial. Neste caso, acolhida a defesa, a decisão opera efeitos entre as partes litigantes (“inter partes”), isto é no caso em litígio (justamente porque proferida “in casu”). Este controle de constitucionalidade é chamado de “difuso”.24
Mas, como adiantamos, a declaração de inconstitucionalidade pelo órgão jurisdicional também pode ser obtida por via de ação (em que se visa expungir, do ordenamento jurídico, a lei havida por inconstitucional). Neste caso, os efeitos da decisão que acolhe a argüição de inconstitucionalidade são “erga omnes”. Aí ocorre o chamado controle de constitucionalidade “concentrado”.
Esta ação subdivide-se em direta interventiva e direta genérica. Trataremos, apenas, desta última.
A representação genérica de inconstitucionalidade, introduzida em nosso sistema normativo pela Emenda 16/55, à Constituição de 1946, é mecanismo apto a garantir a observância de todos os dispositivos da Constituição. Colina obter a declaração, em tese, da inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual, em face da Constituição da República (cfs. arts. 102, I, ae 103, incs. e § 3º, da CF) ou estadual ou municipal , diante da Constituição do Estado (cfr. Art. 125, § 2º, da CF).
Podem propor, perante o Supremo Tribunal Federal, a ação direta de inconstitucionalidade, a teor do art. 103, da Carta Magna, o Presidente da República, a Mesa do Senado Federal, a Mesa da Câmara dos Deputados, a Mesa de Assembléia Legislativa, o Governador de Estado, o Procurador-Geral da República; o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, partido político com representação no Congresso Nacional e confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.
Assim, é dado ao Consulente valer-se de qualquer destas autoridades ou entidades, para que, via ação de inconstitucionalidade, o Pretório Excelso possa fulminar, com efeitos erga omnes, os itens 21 e 21.1, da Lista de serviços veiculada na Lei Complementar nº 116/03.
6.2 Do cabimento de mandado de segurança
No caso concreto, o Consulente, sendo organização sindical legalmente constituída e em funcionamento há mais de um ano,25 pode também impetrar mandado de segurança preventivo, para que seus filiados não venham a ser compelidos a recolher ISS, enquanto prestam “serviços de registros públicos, cartorários e notariais”.
O mandado de segurança é uma ação constitucional que as pessoas, físicas ou jurídicas, têm ao alcance da mão, para se protegerem, de modo pronto e eficaz, contra ofensa ou ameaça de ofensa, por ato de autoridade, a seus direitos líquidos e certos, não amparáveis por habeas-corpus ou habeas-data.
Nesse sentido dispõe o art. 5º, LXIX, da Constituição Federal:
“Art. 5º – (“omissis”):
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23. Problemática Delle Liberta Costituzionali, Pádua, CEDAM, 1.984, P. 67 (traduzimos).
24. No direito brasileiro, se a lei for declarada inconstitucional, por decisão definitiva do Pretório Excelso, o senadopode suspender-lhe a execução (cf. art. 52, X, da CF). Escrevemos pode (e, não, deve), porque o Senado Federal, em rigor, não tem prazo para faze-lo, nem é sancionado se adia indefinidamente o exercício desta sua competência. Quando, porém, tal se dá, a lei declarada inconstitucional num caso concreto, perde completamente sua eficácia “erga omnes”, ou seja, também em relação a todas as outras pessoas que não integram a lide.
25. Nos termos do art. 5º, LXX, da Constituição Federal, o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado “por organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados”.
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“LXIX – conceder-se-à mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por hábeas corpus ou hábeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público”.
Estamos percebendo que o mandado de segurança cabe quando presente o direito líquido e certo a defender contra ato de autoridade.
Direito líquido e certo, ensina-nos Hely Lopes Meirelles, ” é o que se apresenta manifesto em sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração”.26 Noutros termos, é o que se apresenta, no momento da impetração, comprovado de plano, dispensando, pois, a produção de prova da sua existência. Nesse sentido, a prova no mandado de segurança deve vir preconstituída, já que nele não há instrução probatória.
O direito líquido e certo, em suma, é o que não se submete a controvérsias factuais,27 permitindo que o magistrado forme, ab initio, a convicção da admissibilidade do direito pretendido. Logo, o direito incontroverso, deduzido de plano com a inicial, a ensejar, ao julgador, a convicção de sua plausibilidade, abre espaço à impetração do writ.
Permitimo-nos salientar, ainda, que o mandado de segurança admite medida liminar, “quando sejam relevantes os fundamentos da impetração e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da ordem judicial, se concedida a final” (art. 7º, II, da Lei nº 1.533/51).
Em suma, cabe liminar, desde que manifeste o prejuízo irreparável (ou, pelo menos, de difícil composição) causado pelo abusivo ato de autoridade. Dito de outro modo, esta providência cautelar impõe-se ante a demonstração inequívoca da existência do direito lesado (fumus boni iuris) e da irreparabilidade do dano que o ato de autoridade causará, se seus efeitos não forem imediatamente coartados (periculum in mora).
É justamente o caso: o mandado de segurança a ser impetrado comportará a sustação, “in limine”, dos efeitos das leis municipais que vierem a ser editadas, com respaldo nos inconstitucionais itens 21 e 21.1, da Lista de Serviços veiculada pela Lei Complementar nº 116/03. Tais itens, como vimos e revimos, ferem direitos constitucionais subjetivos dos filiados do Consulente.
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6.3 Do cabimento de ação declaratória
Os processualistas ensinam que as ações judiciais classificam-se em de conhecimento, executivas e cautelares. As primeiras, tendo em vista o particular modus da prestação jurisdicional a ser dada, subdividem-se em declaratórias, condenatórias, constitutivas e, segundo a
lguns, também em mandamentais.
As denominadas ações declaratórias ou meramente declaratórias, segundo o que habitualmente se sustenta, têm por objetivo último propiciar a declaração, fundamentalmente, da existência ou inexistência de uma relação jurídica. Ou, como quer Celso Agrícola Barbi, ” visam apenas a declarar a existência ou a inexistência de uma relação jurídica, a autenticidade ou falsidade de um documento, a inconstitucionalidade de uma lei.”28
Sua admissibilidade, no direito processual positivo brasileiro – exceção feita à ação declaratória de inconstitucionalidade, que vem diretamente prevista em nossa Constituição Federal -, vem tratada no art. 4º, do Código de Processo Civil:
“Art. 4º O interesse do autor pode limitar-se à declaração:
” I – da existência ou da inexistência de relação jurídica;
” II – da autenticidade ou falsidade de documento.
” Parágrafo único. É admissível a ação declaratória, ainda que tenha ocorrido a violação do direito”.
Induvidoso, portanto, que a ação declaratória a ser eventualmente proposta pelo Consulente fundar-se-á, de modo direto e efetivo, no inc. I, do art. 4º, do Código de Processo Civil. Com efeito, a ação colimará ver declarada a inexistência do dever jurídico de os filiados do Consulente virem a recolher ISS pela prestação de “serviços de registros públicos, cartorários e notariais”.
6.3.1 Da possibilidade de antecipação de tutela no caso em consulta
Introduzida em nosso direito processo civil pela Lei nº 8.952, de 13 de dezembro de 1994, a antecipação da tutela encontra-se hoje basicamente prevista no art. 273, do CPC:
_______________________
26. Mandado de Segurança e Ação Popular, S. Paulo, Ed. RT, 7ª ed., 1.980, p. 10.
27. Cfr. Carlos Mário Velloso, Conceito de direito líquido e certo, in Curso de Mandado de Segurança, S. Paulo, Ed. RT, 1986, pp. 69 a 100.
28. Comentários ao Código de Processo Civil, Forense, Rio de Janeiro, Vol. I, tomo I, 1977, p. 68.
“Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e:
” I – haja fundado receito de dano irreparável ou de difícil reparação; ou
” II – fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu”.
A admissibilidade deste instrumento processual, na ação que o Consulente eventualmente ajuizará, exige duas ordens de consideração. Uma liga-se à possibilidade da utilização deste instrumento processual em ações propostas contra a Fazenda Pública. A outra passível de ser analisada apenas após a superação da primeira – vincula-se à configuração, ou não, no caso em exame, dos pressupostos processuais exigidos para seu deferimento.
Vamos a elas.
I – No que concerne à admissibilidade do instituto processual da antecipação de tutela em ações propostas contra a Fazenda Pública, a matéria apresenta-se controvertida, em sede doutrinária.29
Estamos convencidos, no entanto, de que esta possibilidade existe.
Neste sentido, de resto, a lição abalizada do jovem professor da PUC/SP, Cássio Scarpinella Bueno:
” A tutela antecipada é, com efeito, importante (aliás fundamental) mecanismo de efetividade do processo contra as ingerências indevidas do Poder Público naqueles casos em que o particular apresenta-se perante o Estado-Juiz não como titular de um direito líquido e certo de lesão ou ameaça à afirmação de seu direito, mas como titular de ‘prova inequívoca de verossimilhança’ desta alegação ou, ainda, dos elementos referidos no § 3º do art. 461 do CPC, critérios igualmente valorados e prestigiados pelo legislador atual, para legitimar a antecipação da tutela, mesmo em lides envolvendo relações de Direito Público, sem prejuízo de ampla produção probatória posterior.
” Por tal razão, do mesmo modo que a concessão da liminar em mandado de segurança (preenchidos seus pressupostos específicos) sempre foi tida como meio eficaz para voltar-se contra o ato estatal, a antecipação de tutela (quando demonstrados seus próprios pressupostos específicos) não pode ser descartada como mecanismo hábil para o mesmo desiderato”.30
Realmente, em inúmeras situações, o autor de uma ação contra o Poder Público tem legítimo interesse em ver, de imediato, atendida a pretensão deduzida em Juízo, sem que se veja obrigado a aguardar a solução definitiva da lide. Afinal, os fundamentos que levaram à criação da figura da antecipação da tutela em nada se comprometem pelo fato de estarem voltados contra atos lesivos ou omissões injustificáveis do Poder Público.
É o que nos ensina Nelson Nery Júnior:
” A antecipação de tutela é mecanismo que visa, entre outras coisas, tornar o processo efetivo, evitando o dano iminente (art. 273, I, do CPC) ou a procrastinação indevida da prestação da tutela jurisdicional (art. 273, II, do CPC).
…………………………………………………………………………………………………………………………………
” O que é preciso indagar do autor é o motivo porque pretende a medida. Comprovada a existência do interesse processual na obtenção da tutela antecipatória, em tese ela deve ser concedida”.³¹
Na mesma trilha segue a jurisprudência colacionada pelo conspícuo Theotônio Negrão:
” Não se pode afastar, em princípio, o cabimento da cautela em ação declaratória para obter a antecipação provisória da prestação jurisdicional. Ela é admissível, embora excepcionalmente, sempre que houver fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação(RTFR 134/15). No mesmo sentido: RTFR 157/233, 158/97, RTJESP 106/319, JTA 99/33. (…)
” O processo cautelar não visa, necessariamente, a assegurar a execução de sentença a ser prolatada em outro processo, mas sim garantir-lhe a eficácia, resguardar-lhe a utilidade. Se a mudança da situação de fato for apta a perturbar seriamente a utilidade prática de demanda de conteúdo simplesmente declaratório, pode justificar-se o deferimento de medida cautelar (RSTJ 34/417)”.³²
Na companhia de tão ilustres e renomados processualistas, não temos dúvidas de que a antecipação de tutela é perfeitamente compatível com as ações propostas contra o Poder Público.
29. Há quem negue esta possibilidade, como o faz Antonio Raphael Silva Salvador, para quem “é impossível a tutela antecipada concedida em favor de autor contra a União, o Estado e o Município, pois aí haveria, obrigatoriamente, pedido de reexame necessário se a concessão fosse em sentença final, o que mostra que não é possível, então, a tutela antecipada, que burlaria a proteção legal prevista no art. 475, II, do Código de Processo Civil” (Da Ação Monitória e da Tutela Jurisdicional Antecipada”, São Paulo, Malheiros Editores, 1.996, p. 56).
30. “Tutela antecipada e ações contra o Poder Público”, in Aspectos Polêmicos da Antecipação de Tutela – Coordenação de Teresa Arruda Alvim Wambier, Revista dos Tribunais, São Paulo, 1997, p. 95.
31. Procedimentos e tutela antecipatória, in Aspectos…, pp. 395 e 396.
Pois bem, no caso concreto, se as leis municipais, estribadas nos itens 21 e 21.1, da Lista de Serviços veiculada na Lei Complementar nº 116/03, vierem a considerar passíveis de tributação por meio de ISS, os “serviços de registros públicos, cartorários e notariais”, os filiados do Consulente que deixarem de recolher este tributo fatalmente serão autuados, a menos que obtenham a cautela.
II – Estamos igualmente convencidos de que se encontrariam presentes os pressupostos legais exigidos para o deferimento do pedido de antecipação de tutela. Se não, vejamos.
O artigo 273, do Código de Processo Civil, exige venham preenchidos os seguintes requisitos, para o deferimento da antecipação de tutela: a) existência de ” prova inequívoca” capaz de autorizar, no momento processual em que se postula a medida, uma prestação jurisdicional favorável ao autor; b) “verossimilhança da alegação”, de modo que exista uma grande probabilidade de serem verdadeiras as alegações do litigante; ou c) “fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação” (inc. I).
Muito bem: os fatos que fundamentarão a propositura da eventual ação declaratória, por parte do Consulente, estão antecipadamente provados e comprovados. Aliás, conforme consignamos ao longo de todo este parecer, é manifesto seu direito de não recolher ISS, enquanto prestam serviços de registros públicos, cartorários e notariais.
7. Considerações finais
As linhas de argumentação acima desenvolvidas levam-nos à irretorquível conclusão de que são inconstitucionais os itens 21 e 21.1, da Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003.
Por esse motivo, tais itens não têm força jurídica bastante para possibilitar que os Municípios venham a tributar, por meio de ISS, as prestações de “serviços de registros públicos, cartorários e notariais”. Eventuais leis municipais que neste sentido disponham, padecerão o mesmo vício da inconstitucionalidade.
Estamos finalmente convencidos, data venia, de que o Poder Judiciário, devidamente provocado (via ação direta de inconstitucionalidade, mandado de segurança, ação declaratória etc) impedirá que os itens 21 e 21.1, da Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 116/03, venham a irradiar efeitos concretos, em detrimento dos filiados ao Consulente.
_________________________
³². Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, São Paulo, Editora Saraiva, 33ª ed., 2002, pp. 98 e 99 ( os negritos constam do original).
RESPOSTAS AOSQUESITOS
Tudo posto e considerado, só nos resta responder objetivamente, aos quesitos que nos foram formulados.³³ Para maior clareza, vamos reproduzi-los:
1º) Teria a Lei Complementar nº 116/03, o condão de alterar a natureza jurídica de “taxa de serviço” dos emolumentos remuneratórios dos atos praticados pelos serviços notariais e de registros?
Resposta: Não. Os serviços notariais e de registros são serviços públicos, porque prestados, mediante procedimentos de Direito Público, para a satisfação de interesses coletivos. São, ainda, específicos e divisíveis, porque sempre se referem a alguém e podem ter sua utilização, efetiva ou potencial, individualmente considerada. A equação não se altera, mesmo sendo exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público.
Ora, serviços públicos específicos e divisíveis só podem ser remunerados por meio de taxas de serviço.
Logo, os emolumentos remuneratórios dos atos praticados pelos serviços notariais e de registro ( serventias de Notas, protesto de Títulos, Registro de Distribuição, Registro de Imóveis, Registro de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas e Registro Civil das Pessoas Naturais) têm natureza jurídica de taxas de serviço. Tal natureza, diga-se de passagem, encontra-se pacificada, por força de uma série de decisões do Supremo Tribunal Federal (v.g., na ADIN 1444-7 pr).
Segue-se, pois, que a Lei Complementar nº 116/03, a pretexto de veicular a Lista de Ser
viços tributáveis por meio de ISS, não tem o condão de alterar a natureza jurídica de “taxa de serviço” dos emolumentos remuneratórios dos atos praticados pelos serviços notariais e de registros.
2º) Sendo os emolumentos fixados para a prática dos atos notariais e de registros, remuneratórios de serviços públicos, ainda que em caráter privado por delegação do Poder Público, estão sujeitos à tributação por meio de imposto sobre serviços de qualquer natureza (ISS)?
Resposta: Não. Inexiste qualquer possibilidade jurídica de as serventias de Notas, Protestos de Títulos, Registros de Distribuição, Registro de Imóveis, Registros de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas e Registro Civil das Pessoas Naturais, enquanto praticam seus atos típicos, isto é, enquanto prestam ” serviços de registros públicos, cartorários e notariais”, virem a ser compelidas a recolher ISS.
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36. Evidentemente, assuntos correlatos e a própria fundamentação das respostas, encontram-se no corpo do presente parecer.
E isto apesar do disposto nos itens 21 e 21.1, da Lista de Serviços veiculadas pela Lei Complementar nº 116/03, que são inconstitucionais.
Melhor explicitando:
I – Os “serviços de registros públicos, cartorários e notariais” são serviços públicos específicos e divisíveis, tanto que remunerados por meio de taxas de serviços. As serventias que os prestam podem, nem mesmo com base em lei complementar definidora de serviços, ser compelidas a recolher ISS.
II – A circunstância de a Lei Complementar nº 116/03 haver, nos itens 21 e 21.1, da Lista, rotulando de “serviços” tributáveis por meio de ISS as atividades de registros públicos, cartorárias e notariais, não altera a conclusão, já que a natureza de qualquer figura de Direito é revelada por seu regime jurídico e, não, pela designação que recebe.
III – Os serviços públicos específicos e divisíveis de registros públicos, cartorários e notariais não se transmudaram em prestações de serviços privados, só porque assim vieram atecnicamente denominados pelo legislador complementar.
IV – A despeito do estatuído nos itens 21 e 21.1, da Lista de Serviços, os atos praticados pelos serviços notariais e de registros não tipificam serviços prestados sob regime de Direito Privado, não, podendo, destarte, ser alvo de tributação por meio de ISS.
V – Nem mesmo a lei complementar (no caso, a Lei Complementar nº 116/03) pode quebrar a estrutura constitucional do ISS, muito menos para prejudicar direitos subjetivos dos contribuintes.
3º) Quais as indicações quanto a vícios de inconstitucionalidade ou ilegalidade dos itens 21 e 21.1, da Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 116/03 e quais os possíveis caminhos jurídicos que nos poderiam ser apontados?
Resposta: Sem embargo de outras medidas judiciais, pensamos que, para evitar possíveis autuações, por parte das Fazendas Municipais, podem ser utilizados a ação direta de inconstitucionalidade, o mandado de segurança preventivo (com pedido de liminar) e a ação declaratória (com pedido de tutela antecipada).
Este é nosso parecer, s.m.j.
São Paulo (SP), 15 de setembro de 2003.
Roque Antonio Carrazza
Professor Titular da Cadeira de Direito Tributário
Da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo – Consultor Tributário -(OAB/SP nº 140.204)