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OAB SP realiza primeira audiência pública sobre Reforma do Código Civil
Na casa da advocacia, especialistas debateram a atualização do mais importante documento legal que norteia o Direito Civil no país
A sede da OAB SP (Ordem dos Advogados do Brasil secional São Paulo) recebeu a primeira audiência pública sobre a Reforma do Código Civil nesta segunda-feira (23). No evento, relatores das diversas subcomissões temáticas (Parte Geral, Direito das Obrigações, Direito de Responsabilidade Civil, Contratos, Direito das Coisas, Direito de Família, Direito das Sucessões, Direito Digital e Direito de Empresa) apresentaram sugestões de melhorias legislativas para a reforma do Código Civil.
A Comissão é presidida pelo ministro Luis Felipe Salomão, do Superior Tribunal de Justiça, e composta pelo ministro Marco Aurélio Bellizze, também do Superior Tribunal de Justiça, e pelos relatores gerais Flávio Tartuce, professor e diretor da Escola Superior da Advocacia da Ordem paulista, e Rosa Maria Nery, professora da Faculdade de Direito da PUC/SP.
“Quero agradecer a acolhida e dizer que temos imensa satisfação em estarmos aqui na casa do advogado para a primeira audiência pública da Comissão de Juristas para a revisão e atualização do Código Civil. Escolhemos o estado de São Paulo para o debate porque é o centro da atividade econômica do país, a locomotiva que puxa o Brasil”, disse o Ministro Salomão em sua fala de abertura.
A presidente da OAB SP, Patricia Vanzolini, também compôs a mesa que abriu a Audiência Pública. “A verdade é que quem funda as relações de uma sociedade é o Direito Civil, ele é o alicerce do funcionamento de uma sociedade. Eu sinto que hoje, aqui, estamos fincando os alicerces para a sociedade com a qual sonhamos.. Essa data ficará marcada para sempre e será um orgulho saber que foi na casa da advocacia que construímos esses alicerces iniciais”, celebrou.
As apresentações das propostas das subcomissões tiveram início com a explanação da Comissão das Obrigações, que sugeriu a redação de parágrafos novos para acentuar a diferença entre contratos paritários e simétricos na linguagem da lei da liberdade econômica dos demais contratos.
Além disso, também foi mencionado pelos membros do grupo de trabalho a necessidade de se debater se os juros merecem um tratamento único para todos os contratos.
A Comissão de Responsabilidade Civil defendeu a sistematização da responsabilidade civil e do enriquecimento injustificado de forma coerente para atender às novas exigências da sociedade. O grupo trabalha em três grandes focos de mudança: a esquematização dos diversos nexos de imputação de responsabilidade civil, inclusive com parâmetros para o risco da atividade, a ordenação dos danos patrimoniais e extrapatrimoniais com critérios de quantificação e delimitação perante o enriquecimento injustificado e, finalmente, a introdução de um capítulo sobre a função preventiva da sociedade civil que anteceda a compensatória.
Para a revisão da Parte Geral do Código, foram propostas melhorias nos regimes jurídicos das incapacidades e sugestões para que se confira uma maior eficácia aos direitos de personalidade, inclusive aos que dizem respeito à alteração do marco inicial da personalidade. Além disso, também foi mencionada a ideia de melhor uniformização dos prazos prescricionais, principalmente com redução do prazo residual.
A subcomissão de Direito dos Contratos pontuou a urgência de se sugerir apontamentos de direito digital para todos os contratos, visto o momento de digitalização dos processos. O grupo de trabalho responsável por Direito de Empresas, por sua vez, disse estar ouvindo agentes de vários mercados para colher as demandas do setor.
Entre elas, citam alguns pleitos: a revogação do artigo 977, que dispõe sobre a proibição de sociedade entre marido e mulher, a supressão da distinção entre firma e denominação, a volta da possibilidade do exercício da gerência por pessoa jurídica, a criação de um sistema nacional de registro de emissões para viabilizar a captação de recursos pelas sociedades limitadas, a regularização da representação dos sócios nas reuniões, a uniformização e modernização das regras de contabilidade, e o reforço à ideia que as cooperativas são um tipo societário específico.
A subcomissão do Direito das Coisas discursou sobre a necessidade de que o tratamento de bens digitais encontre no artigo 1196 um suporte jurídico que dê base à posse dos bens incorpóreos.
Já a explanação do porta-voz do grupo de trabalho de Direito de Família expôs que as mudanças da sociedade nas últimas décadas tornam essenciais uma atualização do Código, especialmente no que se refere à facilitação do divórcio unilateral e à incorporação de uma nova norma para que, na falta de anuência de um dos cônjuges, possa o outro requerer averbar seu divórcio no cartório de registro civil do casamento, quando não houver nascituro ou filhos incapazes.
Também foi abordada a redação de uma regra quanto aos efeitos da separação de fato, para que, quando a separação ocorra, cessem os deveres de fidelidade e coabitação, bem como os efeitos decorrentes do regime de bens, resguardado o direito aos alimentos.
Em sua exposição, o grupo de trabalho de Direito das Sucessões falou sobre as questões da sucessão na reprodução assistida pós-morte. Ele julga necessário definir a questão da legitimidade sucessória dos filhos havidos após a abertura da sucessão, uma vez que a regra vigente no Código Civil diz que só são legitimados a suceder aqueles que já estão concebidos na data da abertura da sucessão e, hoje, há situações em que a própria concepção ocorre após a abertura da sucessão.
Última a explanar, a subcomissão de Direito Digital reforçou que suas propostas impactam todas as demais subcomissões e que o grupo está direcionando seus esforços a temas de assinatura eletrônica, herança digital, direito da personalidade, tokenização e registro imobiliário, uso de IA e contratos digitais, entre outros.
Para finalizar a primeira parte da Audiência Pública, o ministro Marco Aurélio Bellizze tomou a palavra e disse estar impressionado com a dimensão do trabalho de todas as subcomissões. “O trabalho está andando de forma segura e coerente. Parabenizo a todos os envolvidos, que muito contribuirão para que o cidadão seja completamente atendido pela constituição.”
“Não estamos tratando apenas de atualização, teremos uma modificação significativa de todos os livros do Código Civil. Nós vemos a perspectiva de um estudo muito profundo, que faz com que os relatores gerais fiquem atônitos, mas desafiados a um estudo constante e cuidadoso”, afirmou a relatora Rosa Maria de Andrade Nery.
O relator Flávio Tartuce concordou com os colegas e reforçou a importância do debate. “Nós vamos mudar questões que dizem respeito à vida de todas as pessoas. Vamos trazer grandes avanços para a sociedade brasileira. Mudar o Código Civil é uma missão de vida, por isso é preciso comprometimento total. Estamos mais que preparados para entregar o melhor projeto possível, para uma reforma feita de modo a melhorar a nossa sociedade.”
Na segunda parte do evento, foram ouvidos dez juristas convidados, que discursaram sobre seus temas de especialidade.
Foram eles: Nestor Duarte (temas de Parte Geral), Cintia Pereira Rosa (temas de Direito da Personalidade), José Roberto Castro Neves (temas de Direito das Obrigações), Sílvio de Salvo Venosa (temas de Responsabilidade Civil), Maurício Bunazar (temas de Contratos em Espécie), Francisco Eduardo Loureiro (temas de Direito das Coisas), João Ricardo Brandão Aguirre (temas de Direito das Sucessões), Juliana Pela (temas de Direitos de Empresa), Juliana Abrusio (temas de Direito Digital) e Ana Cláudia Scalquette (temas de Direito de Família e Reprodução Assistida).
A terceira e última parte da Audiência Pública contou com palavra aberta e debates. Os cidadãos enviaram suas perguntas e demandas por meio do portal do e-cidadania do Senado Federal.
“Estamos chegando ao fim de um dia muito proveitoso. Agradeço muito a participação de todos que nos trouxeram valiosíssimas contribuições. Essa abertura da comissão com as sugestões públicas cumpre com as necessidades de fazermos uma comissão democrática e permeável aos anseios da sociedade”, disse a Ministra Maria Isabel Diniz Gallotti Rodrigues ao encerrar o evento.
A segunda audiência pública da Comissão de Juristas para a Reforma do Código Civil acontecerá no dia 20 de novembro, às 14h, no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre.
Fonte: OAB/SP