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Migalhas – Artigo: Penhora de criptomoedas. Uma missão possível? – Por Heleno Facco
Com a quantidade de execuções frustradas em expansão e os constantes avanços tecnológicos, surgem novas formas de busca de ativos para a satisfação de créditos. Um dos maiores desafios, consiste na busca pela penhora de criptomoedas. Uma missão difícil, mas não impossível.
As criptomoedas são uma categoria de ativos financeiros digitais, considerados como valores mobiliários, amplamente difundidas entre os gurus financeiros e entusiastas da tecnologia. Com alta volatilidade e boas possibilidades de rendimento, suas peculiares características, mesmo com o alto risco, têm atraído cada vez mais uma legião de fãs, ao redor do mundo, que visam lucrar com sua especulação. Embora sejam consideradas como uma categoria de ativos legais, as criptomoedas carecem de uma regulamentação que traga melhores possibilidade de fiscalização para coibir seu uso em práticas fraudulentas.
Envolvidas na filosofia de serem ativos descentralizados e independentes dos controles governamentais, as criptomoedas têm sido um terreno também utilizado para a ocultação de patrimônio, fraudes a execuções e lavagem de dinheiro. Diferente da moeda em espécie, podem-se portar os criptoativos, em diversas modalidades de wallets, ou melhor, “carteiras digitais”, tais como as “online”, fornecidas por corretoras e instituições especializadas, como as em pen drive, ou até mesmo em QR-Codes impressos. É considerado extremamente difícil rastrear as operações realizadas em criptoativos, em especial, quando os envolvidos não os declaram às autoridades competentes. Contudo sua compra e venda têm registro obrigatório pelas corretoras, conforme descrito pelo art. 6º I da Instrução Normativa 1.888 da Receita Federal do Brasil.
Quanto às execuções judiciais frustradas, que são aquelas em que se têm reconhecido o valor do crédito, mas não se encontra, pelos meios tradicionais bens do devedor, para satisfazer o saldo devedor, sua demasiada ocorrência faz aumentar o risco Brasil, a taxa de juros e diversas outras incidências prejudiciais à sociedade. Nesse sentido, o uso das criptomoedas pode ser utilizado como meio de “blindar” ilegalmente o patrimônio de devedores que não pretendam saldar seus débitos. Pelas formas tradicionais de execução, bastaria converter os bens do devedor em criptoativos, guarnecidos em carteiras “offline”, como as de pen drives ou impressos, porém haverá uma imensa dificuldade em se localizar o patrimônio, inclusive, para fins tributários.
Visando compelir as ilegais práticas em relação à tributação, a Receita Federal do Brasil instituiu a Instrução Normativa 1.888 de 2019, que passou a obrigar pessoas físicas e jurídicas, sejam eles exchanges de criptoativos ou mesmo compradores e vendedores, a declararem suas operações, havendo, dessa forma, a possibilidade de incidência de multas e punições para o descumprimento.
Tal normativa pode ser utilizada em benefício dos credores, em processos judiciais de execução, pois, embora haja uma dificuldade na efetivação do bloqueio de criptoativos, a grande maioria das Exchanges, ou melhor, corretoras que operam no Brasil, possuem personalidade jurídica própria e atuam baseadas em boa filosofia ética. Em verdade, como se trata de um mercado sem regulamentação, as instituições necessitam manter uma boa reputação, para gozar da confiabilidade dos investidores e não correrem o risco de ter sua atividade bloqueada judicialmente, ante o receio de terem suas atividades identificadas como ilegais, especialmente, ligadas à lei Federal 9613 de 1998 que trata da “lavagem” ou ocultação de bens.
Sobre a possibilidade de determinação de bloqueios sobre os criptoativos, eles são considerados valores mobiliários e, assim, não constam na proteção trazida pelo art. 833 do CPC, logo sua penhora é perfeitamente possível, contudo há um caminho a ser percorrido, para a tentativa de localização dos ativos, pois tais valores não serão localizados pelas pesquisas tradicionais.
O art. 139, IV do CPC é claro, ao prever que o Juiz deve velar pelo cumprimento das ordens judiciais, devendo determinar a realização de todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou subrrogatórias necessárias, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária.
A compra de criptoativos, em geral, ocorre por meio do cartão de crédito ou transferência bancária. Assim, a aquisição de uma criptomoeda pode envolver diversas personalidades jurídicas, aumentando a possibilidade de rastreamento da transação.
Sempre que ocorrer a suspeita de que um devedor está frustrando uma execução judicial, por meio da ocultação de bens utilizando criptoativos, deve-se requerer ao Poder Judiciário a expedição de ofícios às Exchanges de criptoativos, bancos e empresas administradoras de bandeiras de cartão de crédito, para que informem a existência de transações de compra e venda de criptoativos, bem como caso existam o seu bloqueio imediato.
Se a instituição oficiada tiver domicílio fora do Brasil, operação comum em casos de criptoativos, a expedição do ofício é possível, com base da cooperação internacional trazida pelo CPC, especialmente, considerando o art. 27 incisos II e III que trazem a possibilidade da obtenção de informações vindas de países estrangeiros e cumprimento das decisões fora do Brasil.
Já nos casos, em que se constate a existência transações em criptoativos, sem a guarda dos valores pelas Exchanges, tipicamente nas ocorrências, em que o devedor se utilize de wallets offline, como pen drives e impressos, deve o devedor ser intimado a disponibilizar os valores sob pena de incorrer nos crimes trazidos pela lei 9.613 de 1998, sem prejuízo de outros como a sonegação fiscal.
As buscas por criptoativos devem ser realizadas em execuções judiciais, visto que existe a possibilidade real de se localizar ativos e, ainda, tal atuação ajudará a coibir a prática de ocultação de patrimônios, por meio de criptomoedas, havendo assim uma cooperação para a extinção dessa prática que, se consolidada, prejudicará toda a economia, também como colocará em descrédito as tão promissoras criptomoedas.
*Heleno Facco é advogado no GHBP Advogados. Mestre em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie; Pós-graduado em Direito e Processo Civil pela Universidade União das Américas.
Fonte: Migalhas