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ConJur – Artigo: O direito de preferência do parceiro outorgado: a jurisprudência do TJ-RS – Por Flavia Trentini e Vitor G. T. de Batista
Seguindo a série de artigos acerca da aplicação do direito de preferência nos contratos de parceria rural, é necessário estudar também as decisões judiciais do estado do Rio Grande do Sul. Quanto à classificação das decisões adquiridas, categorizaram-se conforme as seguintes matrizes interpretativas: 1) inaplicabilidade por interpretação gramatical; 2) inaplicabilidade por interpretação por natureza jurídica; 3) aplicabilidade por interpretação extensiva; 4) aplicabilidade por interpretação extensiva. Sobre a categorização, vide o artigo anterior, “O direito de preferência do parceiro outorgado: a jurisprudência do TJ-SP“.
Relembra-se que se discute na doutrina a existência de duas espécies de direito de preferência nos contratos de parceria rural. Por um lado, o direito de preferência do parceiro outorgado na aquisição do imóvel rural cedido em caso de alienação onerosa e, por outro, o direito de preferência do parceiro outorgado na renovação do contrato.
No Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) [1], dos dez acórdãos totais [2], oito versavam acerca da aplicação, ou não, do direito de preferência do parceiro outorgado na aquisição do imóvel rural no caso de alienação onerosa desse bem e foram assim categorizados: três na categoria de inaplicabilidade por interpretação gramatical; dois na categoria de inaplicabilidade por interpretação por natureza jurídica; três na categoria de aplicabilidade por interpretação extensiva; nenhum na categoria de aplicabilidade por interpretação principiológica.
Desse modo, obtiveram-se os respectivos percentuais: 62,5% para o entendimento de inaplicabilidade e 37,5% para o entendimento de aplicabilidade do direito de preferência ao parceiro outorgado no caso de alienação do imóvel rural cedido. O posicionamento de inaplicabilidade foi justificado pelo tribunal da seguinte maneira: 37,5% por interpretação gramatical e 25% por interpretação por natureza jurídica. Já o posicionamento de aplicabilidade seguiu o seguinte percentual: 37,5% por interpretação extensiva.
Portanto, a partir do procedimento metodológico empregado, nota-se que o TJ-RS tende, majoritariamente (62,5%), a não aplicar o direito de preferência nos contratos de parceria rural quando se trata de alienação onerosa do imóvel rural.
Uma importante comparação com o TJ-SP deve ser feita. Nesse sentido, a espécie de preferência mais discutida no TJ-RS é aquela que versa no caso da alienação do imóvel rural, alcançando oito dos dez acórdãos tratados nesse tribunal. Ao passo que, no TJ-SP, apenas dois dos 16 tratados, versavam sobre a preferência no caso de alienação do imóvel rural. Com isso, é possível concluir que no Rio Grande do Sul o direito de preferência está mais atrelado ao direito real de propriedade; por seu turno, em São Paulo está mais atrelado ao direito obrigacional renovatório.
Em relação às cinco decisões que se manifestavam acerca da aplicação [3], ou não, do direito de preferência do parceiro outorgado na renovação do contrato de parceria rural, foram assim categorizadas: um na categoria de inaplicabilidade por interpretação gramatical; um na categoria de inaplicabilidade por interpretação por natureza jurídica; três na categoria de aplicabilidade por interpretação extensiva; nenhum na categoria de aplicabilidade por interpretação principiológica.
Desse modo, obtiveram-se os respectivos percentuais: 40% para o entendimento de inaplicabilidade e 60% para o entendimento de aplicabilidade do direito de preferência ao parceiro outorgado no caso de renovação do contrato. O posicionamento de inaplicabilidade foi justificado pelo tribunal da seguinte maneira: 20% por interpretação gramatical e 20% por interpretação por natureza jurídica. Já o posicionamento de aplicabilidade seguiu o seguinte percentual: 60% por interpretação extensiva.
Portanto, a partir do procedimento metodológico empregado, nota-se que, ao contrário do caso da alienação do imóvel rural, o TJ-RS tende, majoritariamente (60%), a aplicar o direito de preferência na parceria rural quando se trata de renovação do contrato. Nesse sentido, prepondera a categoria, aplicabilidade por interpretação extensiva, que estende às parcerias a aplicação do artigo 22 do Decreto 59.566/66 [4].
Desse modo, é possível afirmar que, dada as devidas proporções, existe uma simetria entre o TJ-RS e o TJ-SP no seguinte sentido: aplica-se o direito de preferência ao parceiro outorgado apenas aos casos de renovação do contrato de parceria rural.
Notas:
[1] Optou-se pelo recorte temporal que vai de 10 de janeiro de 2003, data do início da vigência do Código Civil de 2002, até 31 de dezembro de 2020. Ressalta-se que a data final foi determinada por razões práticas. A pesquisa jurisprudencial foi realizada com os seguintes termos de busca: “parceria rural” “preferência”, “parceria agrícola preferência”.
[2] Com a primeira busca, obtiveram-se 7 acórdãos, dos quais, após leitura de ementa, foram selecionados 5. Com o segundo termo de busca, obtiveram-se 12 acórdãos, dos quais, 8 foram inseridos no repertório de jurisprudência inicial. Dos 13 acórdãos, com a leitura do inteiro teor, 3 foram descartados por não versarem sobre o direito de preferência no contrato de parceria, os outros 10 foram categorizados.
[3] Nas Apelações Cíveis nº Apelação Cível nº 70006087951, nº 70014685785 e nº Apelação Cível nº 70071061469 obtiveram-se posicionamentos tanto acerca do direito de preferência na alienação do imóvel rural, quanto do direito de preferência na renovação do contrato de parceria. Por isso, a somatória de posicionamentos resulta em 13 (08+05) e não em 10, uma vez que com 03 dos acórdãos tratados retiraram-se 06 posicionamentos distintos.
[4] “Artigo 22 – Em igualdade de condições com terceiros, o arrendatário terá preferência à renovação do arrendamento, devendo o arrendador até 6 (seis) meses antes do vencimento do contrato, notificá-lo das propostas recebidas, instruindo a respectiva notificação com cópia autêntica das mesmas (artigo 95, IV do Estatuto da Terra). § 1º Na ausência de notificação, o contrato considera-se automaticamente renovado, salvo se o arrendatário, nos 30 (trinta) dias seguintes ao do término do prazo para a notificação manifestar sua desistência ou formular nova proposta (artigo 95, IV, do Estatuto da Terra). § 2º Os direitos assegurados neste artigo, não prevalecerão se, até o prazo 6 (seis meses antes do vencimento do contrato, o arrendador {leia-se arrendatário ou parceiro outorgado} por via de notificação, declarar sua intenção de retomar o imóvel para explorá-lo diretamente, ou para cultivo direto e pessoal, na forma dos artigos 7º e 8º deste Regulamento, ou através de descendente seu (artigo 95, V, do Estatuto da Terra). § 3º As notificações, desistência ou proposta, deverão ser feitas por carta através do Cartório de Registro de Títulos e documentos da comarca da situação do imóvel, ou por requerimento judicial. § 4º A insinceridade do arrendador poderá ser provada por qualquer meio em direito permitido, importará na obrigação de responder pelas perdas e danos causados ao arrendatário”.
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*Flavia Trentini é professora associada do Departamento de Direito Privado e de Processo Civil da Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP) e do programa de mestrado da mesma instituição, pós-doutora pela Scuola Superiore Sant’Anna di Studi Universitari e Perfezionamento (SSSUP, Pisa, Itália), com bolsa Fapesp, pós-doutora em Administração/Economia das Organizações (FEA/USP) e livre docente em Direito Agrário pela FDRP-USP.
*Vitor G. T. de Batista é bolsista do Programa Unificado de Bolsas da Universidade de São Paulo (PUB-USP) pela Faculdade de Direito de Ribeirão Preto (FDRP) em Direito Agrário e bolsista PEEG da Universidade de São Paulo (USP) em Direito Agrário: Teoria Geral e Política Agrária.
Fonte: ConJur