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ConJur – Artigo: Mais um avanço para a desjudicialização – adjudicação compulsória extrajudicial – Rafaela Parra
Para registrar a transferência da propriedade de um imóvel é necessário, dentre outros requisitos, um título passível de registro, no caso: a escritura pública de compra e venda. A prática de compra e venda de imóveis, hoje, contudo, inicia com a assinatura do contrato de promessa de compra e venda, onde o comprador se compromete a efetuar o pagamento e o vendedor se compromete a outorgar a dita escritura pública definitiva para possibilitar ao comprador o registro da sua propriedade na matrícula do imóvel.
Por autorização do Código Civil (artigos 1.417 e 1.418) e do Código de Processo Civil (artigo 825 e seguintes) é permitida a adjudicação compulsória de imóveis por meio judicial, seguindo o procedimento e requisitos lá estabelecidos. Agora, com a promulgação da Lei 14.382/22, esta adjudicação também é permitida pela via extrajudicial — mais um grande avanço para a desjudicialização e celeridade da prestação jurisdicional.
Para os que não estão familiarizados com o tema, basta resumir que, para registrar a transferência da propriedade de um imóvel é necessário, dentre outros requisitos, um título passível de registro: a escritura pública de compra e venda. A prática de compra e venda de imóveis, contudo, inicia com a assinatura do contrato de promessa de compra e venda, em que o comprador se compromete a efetuar o pagamento e o vendedor se compromete a outorgar a dita escritura pública definitiva para possibilitar ao comprador o registro da sua propriedade na matrícula do imóvel.
O instituto da adjudicação compulsória entra exatamente aqui: se o vendedor (ou o comprador) se negar a assinar a escritura pública definitiva, o juiz — e, agora, o Oficial de Registro de Imóveis em conjunto com o Tabelião de Notas — poderá constituir o título passível de registro, para que a transferência de propriedade seja efetivada na matrícula.
Antes realizada apenas na forma judicial, por meio de sentença declaratória de mérito, agora a adjudicação ficou muito mais simples e célere.
O que é necessário, então, para proceder com a adjudicação compulsória extrajudicial?
A Lei 14.382/22 introduziu à Lei 6.015/73 o artigo 216-B, que traz os requisitos e os procedimentos (de forma um tanto limitada, diga-se de passagem), os quais serão abordados na sequência. Evidente que tais requisitos devem ser cumulados com os requisitos trazidos pelo Código Civil, com relação a adjudicação compulsória judicial (artigo 1.417 e 1.418), quais sejam: instrumento de promessa de compra e venda onde não se pactuou arrependimento (ou seja, com aquela conhecida cláusula da irrevogabilidade e irretratabilidade) e devidamente registrada no Cartório de Registro de Imóveis competente.
Primeiramente, a Lei esclarece que, antes de dar início ao requerimento perante o Cartório de Registro de Imóveis do local da situação do imóvel, deve o interessado providenciar, perante o tabelião de notas ou o próprio registro de imóveis, a notificação da parte inadimplente (da obrigação de conceder a escritura pública), para dar cumprimento em 15 dias. Daqui, partimos de 3 possibilidades: 1) o notificado responde, concordando com a transferência da propriedade; 2) o notificado responde se opondo à transferência da propriedade ou 3) o notificado não responde.
Na hipótese (1), caso o notificado aquiesça com a transferência, não poderá a adjudicação compulsória ter seguimento. Isso porque é um requisito deste instituto a negativa de outorga da escritura. Ora, se o notificado aceita transferir a propriedade, deve então, ser lavrada a escritura pública de compra e venda, sob pena de restar configurado um negócio simulado.
Por outro lado, caso o notificado se oponha — hipótese (2) — com motivos justificáveis, não poderá também prosseguir com a demanda extrajudicial, uma vez que somente é apto para julgar o contraditório, o judiciário. Foge à função dos cartórios este tipo de julgamento.
Enfim, a hipótese (3), que diz respeito à inércia do notificado. Não é clara a lei sobre este ponto e, pelas poucas interpretações que temos sobre o tema até agora — considerando ser a Lei recentíssima, levam a entender que a inércia não pode ser tomada como uma aquiescência, nem como uma negativa. A inércia não pode ser tida como um inadimplemento, pois estaríamos, então, diante do instituto da usucapião, só que sem prazo mínimo para constituição da propriedade.
Nestes casos, o interessado não poderá fugir do judiciário para conseguir sua almejada adjudicação.
Quando, então, é possível utilizarmos a adjudicação compulsória extrajudicial?
A resposta mais certeira é: quando a parte inadimplente for impossibilitada de outorgar a escritura pública. Aqui, encontramos diversas hipóteses: falecimento de uma das partes ou sua declaração de ausência; extinção ou falência de empresa; ou, ainda, a certificação, pelo oficial competente, de que a parte se encontra em lugar incerto ou não sabido.
Assim, autorizado o prosseguimento decorrente de uma dessas possibilidades, a parte interessada deverá lavrar ata notarial perante o tabelião de notas, onde atestará a identificação do imóvel, qualificação das partes, prova do pagamento do preço e prova do inadimplemento da obrigação de outorgar a escritura pública (inciso III, do artigo 216-B).
A referida ata notarial instruirá o requerimento da adjudicação compulsória perante o Cartório de Registro de Imóveis competente, juntamente com o instrumento de promessa de compra e venda, de cessão ou sucessão; certidões dos distribuidores forenses de que não há litígio envolvendo o contrato de promessa de compra e venda de imóvel em questão; comprovante de pagamento do ITBI e, por fim, a procuração com poderes específicos ao advogado.
Vejam que a constituição de advogado para providenciar o requerimento também é um dos requisitos estabelecidos na Lei. Em que pese a desjudicialização do ato, ainda é imprescindível a presença de advogado para acompanhamento dos trâmites e orientação das partes envolvidas.
Assim, muito bem-vinda a Lei 14.382/22, que com certeza acelerará o processo da adjudicação compulsória no país, em que pese ainda pender alguns pontos importantes aos registradores e, também às partes, de forma a dar mais segurança jurídica ao ato.
*Rafaela Parra é sócia do escritório Araúz Advogados.
Fonte: ConJur