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ConJur – Artigo: Dívida pode ser cobrada mesmo após cinco anos – a recente decisão do TJ-SP – Por Silvio Soares

12-09-2022

No Brasil, é comum ouvirmos a expressão de que uma dívida “perde a sua validade” após um período de cinco anos. O nome do devedor sairia dos órgãos de proteção ao crédito e a sua vida financeira seguiria como se aquela dívida nunca tivesse ocorrido. Porém, não é bem assim que funciona. A dívida continua existindo e, inclusive, pode ser cobrada pelo credor. Recente julgamento da 17ª Câmara de Direito do TJ-SP reforçou este entendimento, traduzindo o que diz o Código Civil.

O tema é tratado no artigo 206 do Código Civil, que define, na verdade, o prazo prescricional da dívida. A prescrição se caracteriza pela perda da pretensão do titular de um direito que não o exerceu em determinado lapso temporal. No caso de dívidas líquidas constantes de instrumento particular, este prazo é de cinco anos. Ou seja, ocorre a extinção de uma ação ajuizável, em virtude da inércia de seu titular durante o tempo determinado. Tal instituto tem como função garantir segurança jurídica aos negócios e evitar que situações já consolidadas há algum tempo sejam revolvidas, gerando incertezas desnecessárias que, na verdade, mais trazem prejuízos do que benefícios a um dos principais escopos da tutela jurisdicional, qual seja, a pacificação social.

A dívida, no entanto, continua a existir, e assim permanecerá até que haja seu pagamento ou que eventualmente o credor a perdoe. Desse modo, embora não possa mais realizar a cobrança judicial após o período de cinco anos, o credor poderá seguir cobrando a dívida de forma extrajudicial sem qualquer empecilho, seja através de ligações telefônicas, envio de e-mails, negociações por plataformas de conciliação, etc. Ainda, é importante destacar que a existência da dívida certamente impedirá a concessão de novo crédito por aquela instituição financeira, afinal, o cliente permanecerá no banco de devedores e isso inegavelmente influenciará de forma negativa na análise de crédito.

Neste sentido foi recente julgamento na 17ª Câmara de Direito do TJ-SP, onde o Judiciário adotou a tese de que não se pode determinar que uma dívida desapareça após determinado prazo, o que levaria alguns consumidores a não pagarem os valores na expectativa de que o débito deixe de existir. O STJ também já se manifestou acerca do tema, reconhecendo a existência da dívida prescrita, a qual perde a possibilidade de exigibilidade judicial, porém, sem qualquer empecilho para a sua cobrança pela via extrajudicial.

Também é importante destacar que a existência de uma dívida implicará em influência direta na pontuação do score, que é um mecanismo através do qual as empresas avaliam os consumidores para determinar a concessão de crédito. Quanto mais alto o score, melhor a saúde financeira do consumidor e, consequentemente, mais chances de obtenção de crédito. Se há dívidas em aberto, a pontuação será afetada negativamente, e quanto mais tempo tal situação perdurar, pior será pro devedor. A pontuação aumentará na medida em que o consumidor regularize suas pendências em aberto e/ou controle melhor seus novos contratos.

Atualmente, as empresas estão investindo em negociações através de plataformas de conciliação, onde o consumidor pode obter algumas vantagens para regularizar seu débito. Uma dessas plataformas é gerenciada pelo Serasa, contudo, é importante distinguir a inclusão do débito na referida plataforma da inscrição do nome do devedor na lista de inadimplentes. A mera inclusão na plataforma não possui qualquer empecilho pois tão somente possibilita a negociação de uma dívida que, embora prescrita, ainda existe.

Desse modo, podemos afirmar que eventuais ações judiciais objetivando indenização por danos morais decorrentes de cobranças extrajudiciais de dívidas já prescritas estarão fadadas ao fracasso, uma vez que tais cobranças constituem direito legítimo do credor e estas dívidas permanecerão devidamente anotadas até que haja o efetivo pagamento.

*Silvio Soares é sócio do escritório Urbano Vitalino Advogados.

Fonte: ConJur