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Clipping -A Tribuna – Após decisão do STF, transexuais de Santos já podem alterar o nome Juiz corregedor editou portaria que libera os cartórios da Cidade a fazer o procedimento

02-04-2018

Em imagem de 2013, cartório de registro civil na Rua Amador Bueno (Foto: Alberto Marques/A Tribnua/Arquivo)

As pessoas transexuais nascidas e registradas nos cartórios de Santos já podem buscar sua cidadania plena. O juiz corregedor dos Cartórios de Registro Civil do Município, Frederico dos Santos Messias, da 4ª Vara Cível, editou na última quinta-feira (29) uma portaria liberando os estabelecimentos da Cidade para fazer a retificação de nome e gênero dessa população sem precisar de decisão judicial, como já mandou o Supremo Tribunal Federal (STF), em 1º de março. Segundo juristas especializados em direito homoafetivo ouvidos pela Reportagem, ainda não houve medidas nesse sentido em outras comarcas do País.

Messias editou a Portaria 01/2018, que, na prática, determina: agora, todo cidadão trans que tiver sido registrado em Santos poderá solicitar a alteração, direto no cartório. “O cidadão se dirige ao cartório, providencia uma declaração de próprio punho, em que pede a mudança do prenome e do gênero”, explica o juiz corregedor dos cartórios santistas. Messias diz que será necessário apresentar uma certidão negativa de antecedentes criminais e de ações cíveis. “Isso não quer dizer que quem tiver antecedentes não pode alterar. Mas quando acontecer a mudança, vai ser preciso dar conhecimento nos processos judiciais onde constava o prenome anterior”, explica o juiz.

O que vai ser alterado Quando a pessoa solicitar a alteração, isso não vai criar novos números de documentos, como o RG e o CPF. “O que vai mudar é o assento em que a pessoa foi registrada no cartório. Nenhum número muda, apenas o nome, o gênero e imprime-se uma nova certidão”.

Segundo ele, não há um “esquecimento” da vida pregressa da pessoa. No assento do registro civil, haverá a informação de que, até determinada data, aquela pessoa tinha um gênero e um prenome e que, depois, houve a mudança. “Mas isso não ficará escrito no documento da pessoa. Aliás, apenas o transgênero poderá solicitar a certidão nova”, conta o juiz.

De porte do documento retificado, a pessoa trans poderá solicitar a alteração nos outros documentos – sem a alteração dos números. Pioneirismo Esta não é a primeira vez que o juiz-corregedor dos cartórios de registro civil de Santos desburocratiza o processo para retificação de nome e gênero de pessoas trans. No ano passado, ele baixou portaria semelhante. “Era como eu sempre entendi: que submeter a retificação à decisão judicial era um limitador. Naquela época cheguei a pedir atestado de acompanhamento psicológico, coisa que o próprio Supremo afastou”, explica Messias. Cinco dias depois, no entanto, a Corregedoria do Tribunal de Justiça determinou que a portaria fosse extinta. “Naquela oportunidade, não havia decisão do Supremo. Agora é diferente. Há uma decisão, não tem porque ficar esperando a publicação do acórdão, que ainda deve demorar mais 30 dias.

O Supremo se pronunciou no início de março, já deve prevalecer o entendimento”. O juiz alerta também que a portaria dele vale apenas para os cartórios de registros de Santos. “Não adianta vir de fora da cidade para solicitar, pois a minha decisão reflete apenas nos registros efetuados na minha jurisdição”. Positiva A coordenadora da Comissão Municipal de Diversidade Sexual de Santos, Taiane Miyake, vê a decisão como positiva. “O nosso nome nada mais é que o cartão de visita, quando retificado acabam todos os constrangimentos. É o passaporte para uma nova vida! É constrangedor mostrar o RG ainda não retificado.

Você não se vê cidadã. Agora eu me vejo”. Para o advogado Paulo Iotti, doutor em Direito Constitucional e presidente do Grupo de Advogados pela Diversidade Sexual e de Gênero (Gadvs), a decisão “é um avanço”. “Principalmente por reconhecer que quem tem antecedentes criminais e civis pode fazer a alteração”. “Entendo que, como disse a Corte Interamericana de Direitos Humanos, o Estado que tem que ir atrás dos antecedentes da pessoa, sem impor a ela o ônus de conseguir as certidões. Estado tem mais estrutura que a pessoa para isso”, analisa o especialista. Mesmo assim, para ele, “não deixa de ser um importante avanço essa posição do juiz corregedor de Santos”.

Atualmente, a Associação dos Registradores de Pessoas Naturais do Estado de São Paulo (Arpen-SP) recomenda que os cartórios continuem exigindo a decisão do juiz corregedor, inclusive com a necessidade de outras provas. “O posicionamento da ARPEN-SP, ao recomendar que se submeta o caso necessariamente a um juiz corregedor e dizer que este pode exigir outras provas que não a mera declaração escrita de vontade da pessoa trans é um retrocesso, pois desrespeita dois pontos centrais da decisão do STF: a dispensa de decisão de juiz e de qualquer outra prova que não a mera declaração escrita de vontade da pessoa transgênero”, resume Iotti”.

Fonte: A Tribuna