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Clipping – Jota – Travestis e transexuais irão às urnas com nome social pela 1ª vez
Há menos de dois meses para as próximas eleições no Brasil, o plenário Supremo Tribunal Federal (STF) reafirmou que a população transgênera tem o direito fundamental à alteração de seu nome e de sua classificação de gênero no registro civil sem precisar passar pela cirurgia de mudança de sexo (cirurgia de resignação sexual). Portanto, o procedimento pode ser realizado tanto via judicial quanto administrativa, ou seja, esta segunda possibilidade, diretamente no cartório. Isso significa que existe apenas o desejo da pessoa transexual ou travesti em realizar a alteração e não há impedimentos para que o procedimento não seja realizado (1).
As razões para esta sinalização foi analisada através do Recurso Extraordinário (RE) 670422, aplicando determinação fixada em 1º de março deste ano no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4275 sobre o mesmo tema (2). Além da determinação sobre a alteração sem o desgaste judicial, podendo ser realizado diretamente em cartório, o tribunal fixou outras teses citadas a seguir.
A alteração deve ser registrada sem a inclusão do termo transgênero e nas certidões não constará nenhuma observação sobre a origem do ato, exceto se solicitada pelo interessado ou interessada ou por determinação judicial. Caso a alteração seja realizada pela via judicial, caberá ao magistrado determinar, através de ofício ou requerimento do envolvido ou envolvida, a expedição de pedidos específicos para a alteração dos demais registros nos órgãos públicos ou privados pertinentes. Estes estabelecimentos deverão preservar o sigilo sobre a origem dos atos (3).
Este entendimento já havia sido firmado em 1º de março, quando o STF autorizou por unanimidade que travestis e transgêneros poderiam alterar o nome no registro civil sem a realização de cirurgia de mudança de sexo. No dia 22, o tribunal decidiu ainda a inserção do nome social no titulo de eleitor. Após as definições, o prazo estabelecido aos transgêneros e travestis para incluírem o seu nome social no título de eleitor e no caderno de votação, além de atualizarem a sua identidade de gênero no cadastro eleitoral foi estabelecido entre os dias 3 de abril e 9 de maio (4).
Em pouco mais de duas semanas após o início das alterações nos cartórios, um levantamento do TSE contabilizou mais de 1,4 mil interesses solicitados à Justiça Eleitoral para a inclusão do nome social no título de eleitor. Além disso, 791 eleitores e eleitoras tinham pedido alteração da identidade de gênero no cadastro eleitoral. As solicitações foram apresentadas por votantes de 551 cidades de todos os estados e do Distrito Federal. São Paulo foi o município com mais requerimentos para inserção do nome social, com 129 solicitações.
O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na época, o ministro Luiz Fux, considerou que o papel da Justiça Eleitoral também é zelar pelo respeito às diferenças e atuar para que a cidadania ocorra sem embaraços e preconceitos. Para o magistrado, todo eleitor tem o direito de ser identificado da forma como enxerga a si próprio e como deseja ser reconhecido em sociedade. Já o corregedor-geral da Justiça Eleitoral naquela ocasião, Napoleão Nunes Maia Filho, destacou que as medidas proporcionam acesso a direitos resguardados pela Constituição, conferindo às pessoas transexuais e travestis o respeito que elas merecem como eleitores e cidadãos (5).
Nome social é o termo no qual transgêneros e travestis utilizam para se identificar, mesmo quando não alteraram o seu registro civil ou não passaram por cirurgia de mudança de sexo (6). A utilização se refere ainda à garantia de um direito para pessoas que historicamente vivem violações, respeitando suas autodeterminações sobre o modo de tratamento em torno de sua identidade de gênero (7).
Essa pauta está no movimento trans desde o princípio, portanto, de acordo com a presidenta da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), Keila Simpson, a decisão do STF representa uma vitória ao longo de anos de luta. Isso porque os processos judiciais são demorados, podendo tramitar de oito meses a 2 anos. Além disso, na maioria das vezes, as sentenças deferem a alteração do pronome, mas não a do gênero, o que causa grande constrangimento, pois a identidade de gênero passa a não corresponder com o nome social (8).
Embora haja a necessidade de muitas outras ações em prol dos transgêneros e travestis, o Brasil obteve alguns avanços, tendo em vista que o nome social já está incluso no Sistema Único de Saúde (SUS) desde 2009 e no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) desde 2013. Há também decisões em níveis federal, estadual e municipal nesse sentido que valem para órgãos públicos, instituições de ensino e empresas estatais.
Ser reconhecido pelo seu nome social é sentir-se inserido na sociedade, uma maneira digna de garantir o direito ao voto desta parcela da população marginalizada e inviabilizada pela sociedade e, consequentemente, pelo poder político. A inserção do nome social marca um avanço nas políticas das minorias sexuais do Brasil, o país que mais mata LGBTs no planeta, só no último ano foram 445 mortes, uma em cada 19 horas, de acordo com dados do relatório de 2017, do Grupo Gay da Bahia (9).
Fonte: Jota