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Banco pode executar hipoteca de todo o imóvel de casal

03-05-2015

Neuza Oliveira deve perder a metade do imóvel que comprou com o seu companheiro porque ele omitiu ao credor que vive em união estável. A decisão é da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que autorizou o Banco do Brasil a executar a hipoteca de todo o imóvel, mesmo sendo apenas o companheiro de Neuza o devedor da história. Para os ministros, ele agiu de má-fé ao omitir a união estável. Assim, caso a parte de Neuza seja preservada na execução, o ato ilegal dele será validado contribuindo para a insegurança jurídica.

A Turma reconheceu a validade da penhora executada pelo Banco do Brasil no contrato de hipoteca firmado pelo companheiro de Neuza Oliveira. Para o relator, ministro Gomes de Barros, “não deve ser preservada a meação da companheira do devedor que agiu de má-fé, omitindo viver em união estável para oferecer bem do casal em hipoteca, sob pena de sacrifício da segurança jurídica e prejuízo do credor”.

Segundo ele, “dentre os direitos conflitantes, é menos lesivo à vida em sociedade resguardar o do credor. As conseqüências da adoção da tese contrária conduziriam a uma situação de insegurança jurídica insustentável”, declarou Gomes de Barros. Ele destacou que Neuza também acionou o companheiro na Justiça por ele ter omitido a união estável ao banco.

O companheiro de Neuza deu como garantia o imóvel do casal e se declarou “desquitado” no documento. Quando o banco decidiu executar a penhora, a execução foi contestada por Neuza com Embargos de Terceiro (tipo de ação judicial que busca o reconhecimento de direito de terceiro).

Ela declarou que o bem foi comprado pelo casal após o início da união estável. Por esse motivo, segundo ela, o companheiro não poderia dar o imóvel em garantia sem sua autorização, pois ela tem direito à metade do bem.

Em primeira instância, o pedido foi aceito. A sentença foi confirmada, em parte, pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. O tribunal reconheceu o direito da meeira de embargar a execução para proteger sua parte no bem. De acordo com a segunda instância, para ter reconhecida a união estável não é exigível decisão judicial para o caso concreto. O TJ-RS destacou que a qualificação do companheiro como “desquitado”, no contrato, “não impede o reconhecimento do direito à meação decorrente da união estável”.

O Banco do Brasil recorreu ao STJ para pedir a declaração da validade da hipoteca. Argumentou que o contratante agiu de má-fé ao omitir sua convivência em união estável no momento em que deu o imóvel em garantia. O banco afirmou também que, à época do contrato, não era possível verificar a existência de união estável porque ainda não existia lei sobre o assunto e, além disso, o companheiro se apresentou como “desquitado”. O ministro concordou com os argumentos do banco.

Neuza Oliveira também apresentou Recurso Especial. O processo não foi admitido e, por isso, não subiu para análise do STJ.

Boa-fé e segurança jurídica

Gomes de Barros rejeitou os argumentos de Neuza contra a validade da hipoteca. O relator destacou que o tribunal gaúcho reconheceu a existência da união estável anterior à assinatura da hipoteca em favor do banco. “Esse fato não pode ser alterado em recurso especial”, salientou o ministro. Ele lembrou a vedação ao exame de provas, como prevê a Súmula 7 do STJ.

Com isso, segundo o relator, de acordo com o artigo 1.725 do Código Civil, deve-se “concluir que a recorrida (Neuza Oliveira) é mesmo proprietária de metade do imóvel dado em hipoteca por seu companheiro”.

No entanto, o ministro destacou que a Lei 9.278, que regulamenta o artigo 226 da Constituição Federal, só surgiu em 1996. “Assim, os efeitos da união estável em relação ao patrimônio ainda não estavam previstos em lei. Não se sabia, àquela época, que futuramente a união estável seria equiparada ao casamento em comunhão parcial de bens.”

O relator ressaltou que, naquele momento, “era impossível que o banco exigisse do devedor a outorga uxória (documento que atesta o consentimento da companheira à apresentação do bem como garantia no contrato), ou ato que o valha, pois não tinha como saber da existência da união estável”.

Segundo ele, “a se admitir que a recorrida ponha a salvo sua meação, em prejuízo do banco recorrente, estaríamos estimulando a conduta desleal do devedor (companheiro). A possibilidade de fraudes seria enorme, até porque não é possível que o credor tenha ciência inequívoca da situação de fato em que se envolve o devedor”. Para o relator, se a decisão fosse diferente, seria privilegiada “a má-fé nas relações jurídicas”.

Revista Consultor Jurídico, 7 de agosto de 2007