Notícias

Artigo – Sobre o direito das sucessões – Por Fábio Abrahão Bucci

18-04-2019

Ao morrer, o falecido perde a sua titularidade sobre o patrimônio. No entanto, todo os seus bens, dívidas e obrigações, que com sua morte passou a ser reconhecido como sendo herança, por lei, são encaminhados os sucessíveis, que podem aceitá-la ou rejeitá-la.

I – INTRODUÇÃO
Com o falecimento da pessoa física termina com ela a sua existência jurídica. Esta situação é evidenciada pela Código Civil no art. 68, n.1 O Direito das Sucessões integra todas as áreas do Direito Civil. Desde modo, a pessoa falecida deixa de ser um sujeito possuidor de direitos e obrigações.

Ao morrer, o falecido perde a sua titularidade sobre o patrimônio. No entanto, todo os seus bens, dívidas e obrigações, que com sua morte passou a ser reconhecido como sendo herança, por lei, são encaminhados os sucessíveis, que podem aceitá-la ou rejeitá-la.

Esta situação é descrita por Maria Berenice Dias (2011), como sendo a sucessão. Ou seja, por causa da morte do responsável pela herança, ele deixa de ter a capacidade jurídica sobre os seus bens passando esse direito para outra(s) pessoa(s).

Nos primórdios da humanidade, tudo que era conquistado pertencia a todos os integrantes do grupo ou tribo. Havendo morte, os bens não era devolvido para os herdeiros pois já era de uso comum de todos.

Posteriormente, a religião e o parentesco integrou-se ao processo sucessório. Com isso, os integrantes da família eram determinado de acordo com a sua ligação religiosa, ou seja, a relação de parentesco era efetivada de acordo com ao culto no qual os demais integrantes da família pertenciam (RIZZARDO, 2005).

Segundo Rizzardo (2005), as primeiras diretrizes relacionadas ao direito sucessório romano baseavam-se na relação existente entre o culto no qual a família praticava e no seu vínculo com a propriedade, ou seja, a religião era a base fundamental do direito sucessório.

A respeito do Brasil, por ter sido por muito tempo colônia de Portugal, suas leis eram submetidas às Ordenações do Reino, sendo que, segundo Gonçalves (2007), as primeiras tinham uma grande semelhança com o direito romano.

Entre as várias leis que vieram a ser implantadas para versarem sobre o tema sucessão no Brasil posteriormente, Oliveira (1952), destacou que a Lei 1.839, de 31 de dezembro de 1907, denominada de Lei Feliciano Pena, modificou os dizeres relacionados à vocação hereditária, incluindo o conjugue como herdeiro, dando-lhe prioridade sobre os demais.

Em seguida, em 1ª de janeiro de 1916, entrou em vigor a Lei 3.071, denominada Código Civil, que tratou o tema sucessão de uma forma especial. Na consolidação das Leis Civis em seu art. 978 e no Código Civil de 1916, em seu art. 1572, com base no Código Civil Francês, o Brasil passou a fazer uso do Princípio da Saisine (GONÇALVES, 2008).

Ao entrar em vigor, o Código Civil Brasileiro de 1916, entendia que somente a família constituída do casamento teriam direitos, do mesmo modo, somente os filhos tido dentro do casamento eram reconhecidos como filhos legítimos, e por consequência, possuidores de direitos.

Estas e outras discriminações, como por exemplo, com os filhos adotivos e concubinatos somente foram vencidas por lei com o reconhecimento da União Estável através da Constituição de 1988. No entanto, o direito sucessório do companheiro já vinha sendo assegurado desde 1994, através da Lei 8.971.28.

Com o passar dos anos, devido as inovações sociais, políticas e econômicas, novas leis foram surgindo para atender às necessidades da população diante da nova problemática levantada. O texto atual do Código Civil, Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002, por estar atrelado à Constituição Federal de 1988, traz algumas novidades sobre as sucessões, substituindo as premissas destacadas pela lei de 1916.

Nos dias atuais, o Direito Sucessório possui um aparato legal conforme consta no art. 5º, § XXX e XXXI da Constituição Federal de 1998; no art. 10 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro; nos artigos 982 a 1169 do Código de Processo Civil; nos artigos 1784 a 2027 do Código Civil e na Lei 11.441/2007.

II – SOBRE A SUCESSÃO E OS SUCESSORES
No que se refere à abertura das sucessões, o art. 1784 do Código Civil diz que sendo aberta a sucessão, a herança deve ser transmitida imediatamente para os herdeiros legítimos e testamentários. De fato, a sucessão só é aberta caso haja uma morte real ou presumida.

Tendo a morte, a herança, segundo o art. 1829 CC, deve ser transmitida da seguinte maneira:
Para os descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente (exceto se foi casado no regime da comunhão universal, ou da separação de bens); ou se no regime da comunhão parcial, caso o autor da herança não tiver deixado bens particulares.
Para os ascendentes em concorrência com o cônjuge.
Ao cônjuge sobrevivente.
Aos colaterais, ou seja, irmão, tios e primos.
Na falta deles, a herança será recolhida pelo município, Distrito Federal ou união (art. 1844 CC).
No momento de transmissão da herança, no caso da comoriência, ou seja, morte simultânea, onde duas ou mais pessoas morrem e não se sabe quem morreu primeiro, a abertura da sucessão e a transmissão da herança aos herdeiros ocorrem num só momento.
No entanto, para que, de fato o sucessão seja eficaz, é necessário que o herdeiro aceite a herança. Sobre isso o art. 1804 CC destaca que sendo aceita a herança, torna-se definitiva a sua transmissão ao herdeiro, desde a abertura da sucessão.
Caso o herdeiro não aceite a herança, a situação da transmissão fica na condição de não verificada.
No art. 1791 CC, fica evidente que a herança consiste em um todo. Neste caso, mesmo que haja vários herdeiros, até a partilha, o direito dos coerdeiros quanto a herança será INDIVISÍVEL.

A respeito da Sucessão legítima e testamentária, o art. 1.786 CC faz o seguinte esclarecimento:
A sucessão dá-se por lei ou por disposição de ultima vontade.
Nota-se que a sucessão pode ser simultaneamente legitima e testamentária nas situações em que o testamento não abranger todos os bens do falecido, tendo em vista que os que não estiverem incluídos serão transmitidos para os herdeiros legítimos.
A Sucessão a título universal se dá quando o herdeiro deve tomar posse da totalidade da herança, fração ou percentual dela.
No caso da Sucessão a título singular, o testador deixa claro para beneficiário que o falecido deixou um bem específico para ele.
O art. 426 CC deixa evidencia a não possibilidade de se realizar a sucessão sob a forma contratual. No entanto, a mesma lei, através do seu art. 2018 abre uma exceção: “é válida a partilha feita por ascendente, por ato entre vivos ou por última vontade, contanto que não prejudique a legítima dos herdeiros necessários”.

A respeito da Herança Jacente e Vacante, os arts. 1819 à 1823 faz as seguintes considerações:
Nos casos em que o falecido não deixar testamento e não ter nenhum herdeiro conhecido ou mesmo ao tê-los estes renunciam a herança, os bens irão para o ente federativo através de um processo legal.
No caso da Herança Jacente, a lei estabelece que se trata de uma condição onde é nomeado uma pessoa (curador) para conservar e administrar o bens do falecido até o herdeiro legitimo poder tomar posse do mesmo. Porém, na ausência do herdeiro, serão emitidos editais convocatórios para que o mesmo venha tomar posse. Se após a realização de todas as diligências possíveis no intervalo de um ano (contados através da data de emissão do primeiro edital) para localizá-lo e notificá-lo o herdeiro não aparecer, haverá a declaração de vacância.
III – EXCLUÍDOS DA SUCESSÃO POR INDIGNIDADE E DESERDAÇÃO
Os arts. 1814 e 1818 CC destacam que trata-se de uma situação onde a pessoa é privada de receber a herança. São sanções civis aplicadas para com as pessoas que não se comportam bem diante do autor da herança.

Trata-se de uma pena civil, elaborada pelo legislador para evitar que os herdeiros necessários, os legítimos e os testamentários tomem posse de uma herança, tendo antes infligido alguma das seguintes situações:
houverem sido autores, co-autores ou partícipes em crime de homicídio doloso, ou tentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente;
houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da herança, ou incorreram em crime contra a sua honra (calúnia, difamação e injúria), ou de seu cônjuge ou companheira (o);
por violência ou fraude, a inibiram ou obstaram o autor da herança de livremente dispor dos seus bens por ato de última vontade.
Neste caso, o indigno não terá direito a fazer usufruto dos bens. A exclusão do herdeiro, ou legatário, em qualquer uma das situações apresentadas acima, será declarada através de uma sentença de ação ordinária, movida por quem tenha interesse na sucessão (art. 1815 CC). O prazo é de 04 (quatro) anos, sob pena de decadência. Os efeitos da sentença declaratória de indignidade retroagem (ex tunc) à data da abertura da sucessão, considerando o indigno como pré-morto ao de cujus.
Em caso de reabilitação, o art. 1818 CC permite ao ofendido reabilitar o indigno. E para que esta reabilitação de fato ocorra, deverá ser realizado na forma de testamento ou na forma de outro documento que ateste o perdão do indigno.

Além dos motivos destacados no art. 1814, o art. 1962 destaca outras situações em que é possível realizar a deserdação dos descendentes por seus ascendentes:
ofensa física;
injúria grave;
relações ilícitas com a madrasta ou com o padrasto;
desamparo do ascendente em alienação mental ou grave enfermidade.

IV – ORDEM DE VOCAÇÃO HEREDITÁRIA
Os arts. 1829 até 1844 CC estabelecem um ordem de vocação hereditária para as pessoas que irão suceder o ente principal da família, sendo: 1ª descendentes + cônjuge; 2ª ascendentes + cônjuge; 3ª cônjuge; 4ª colaterais até 4º grau.
O art. 1836, § 2º, deixa claro que, sobre os ascendentes, não há distinção entre a linhagem materna e paterna.
No caso dos ascendentes, de acordo com o art. 1853 não é possível ter direito de representação.
Sobre os colaterais, os arts. 1840, 1841, 1843 caput e 1851 ss, destacam que os mais próximos tem preferência sobre os demais, com exceção no caso de direito de representação para filho de irmão quase morto. No caso dos irmãos germanos ou bilaterais e irmãos unilaterais, os últimos tem direito à metade do quinhão dos primeiros. Tio e sobrinho são colaterais de 3º grau, caso não haja nenhum outro herdeiro, a herança deve ser dividida entre eles. No entanto, o direito sucessório da preferência ao sobrinho em relação ao tio na sucessão, tendo em vista que o sobrinho pode entrar no lugar do irmão pré-morto, que é um colateral de 2º grau, enquanto o tio, por ser ascendente, não possui direito de representação, se mantendo no 3º grau.

V – DIREITO DE REPRESENTAÇÃO
O direito de representação é autorizado pela lei nas situações em que o parente do falecido sucederia, caso vivesse. Esta situação somente é possível na sucessão legítima, conforme art. 1.851 CC.
O direito de representação só é possível na linha reta sucessória descendente e jamais na ascendente (art. 1.852 CC). Na linha colateral, só poderá ser representada em favor dos filhos de irmãos do falecido (sobrinhos), nos casos em que irmão encontra-se na linha sucessória.

VI – SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA E TESTAMENTO
A Sucessão Testamentária refere-se a um documento no qual o sucessor é definido através de um documento. Este documento possui uma significativa utilidade por servir para a nomeação de tutores, reconhecimento de filhos, deserdação de herdeiros, revogação de testamentos anteriores, entre outras situações relacionadas a ultima vontade do falecido.
Trata-se de um ato unilateral e individual, não podendo ser realizado de forma coletiva. Caso não sejam observadas as regras de solenidades, o ato será considerado nulo, conforme consta no art. 166, V do CC.

VII – CAPACIDADE TESTAMENTÁRIA
O Código Civil, através do art. 1.860 CC, isenta da capacidade de testar somente os menores de dezesseis anos, os desprovidos de discernimento e a pessoa jurídica.
A capacidade para testar deve estar presente no ato em que o testamento é realizado, do contrário não terá validade.
A capacidade testamentária passiva ocorre nas situações em que os herdeiros são incapazes para adquirir a herança através do testamento, proibindo que se nomeiem herdeiros ou legatários.

VIII – LEGADOS
O Legado é uma situação no qual o testador deixa a pessoa estranha ou não à sucessão legítima, um determinado objeto ou certa quantia em dinheiro.
Se a herança refere à totalidade ou uma fração ideal dos bens, de acordo com o art. 80, II do CC, o legado já é a sucessão que incide sobre uma coisa certa e determinada.
A coisa legada é definida apenas pelo gênero, segundo o art. 1.915 do CC. Não sendo possível o legado de coisa alheia (art. 1.912).
Nas situações em que vários herdeiros ou legatários são chamados à herança por motivo de testamento em quinhões determinados, e algum deles não puder comparecer ou não queira aceitar a sua parte, esta parte poderá ser acrescida a outros co-herdeiros ou co-legatários, menos nos casos de direito do substituto.
A Substituição hereditária consiste em situação testamentária na qual o testador chama uma pessoa para receber, no todo ou em parte, a herança ou o legado, na falta ou após o herdeiro ou o legatário nomeado em primeiro lugar.

IX – CONCLUSÃO
O Código Civil de 1916 tinha uma visão individual, considerada por muitos como sendo inspirada em um modelo liberal onde a capacidade de testar era muito limitada.
Já com o Código de 2002, esta limitação foi superada, o capítulo relacionado à sucessão testamentária para o da sucessão legítima. Com isso, a sucessão legítima leva em consideração todos os herdeiros necessários, tendo em vista que todos os sucessores passaram a constar na lei.
Apesar de ter sido lenta esta evolução do direito de sucessão, ela foi necessária para dar um melhor entendimento as situações sucessórias particularizadas e atender de forma precisa as necessidades dos seus sucessores.

X – REFERÊNCIAS
BRASIL. Código Civil, Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.
CASSONE, V. Direito tributário: fundamento constitucionais da tributação, classificação dos tributos, interpretação da legislação tributário, doutrina, prática e jurisprudência, atualizado até a EC nº 38 de 12/06/2002. São Paulo: Atlas, 2003.
CODIGO TRIBUTARIO NACIONAL (CTN). Constituição Federal.  São Paulo: Saraiva, 2008.
DIAS, M. B. Manual das sucessões. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.
DURANT, Will (2002). História da civilização, vol. IV: A idade da fé. Rio de Janeiro: Record.
GASPARETTO JUNIOR, A. Lei das doze tábuas, 2013. Disponível em: . Acesso em 08 out. 2018.
GONÇALVES, C. R. Direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva, 2007.
GONÇALVES, C. R. Direito civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2008.
MELO, J. E. S. de. Curso de direito tributário. São Paulo: Dialética, 2003.
OLIVEIRA, A. V. I. de. Tratado de direito das sucessões. São Paulo: Max Limonad, 1952.
RIZZARDO, A. Direito das sucessões: Lei nº 10.406, de 10.01.2002. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005.
SOUSA, R. C. de. Lições de direito das sucessões. Coimbra: Editora Renovada, 1999.

 

Fonte: Direito Net