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Artigo – Estadão – Direito de família: até que o coronavírus nos separe – Por Carolini Cigolini Lando

27-04-2020

A sua liberdade termina quando começa a do outro, já dizia Herbert Spencer. Essa frase deveria nortear nossas relações interpessoais e profissionais, pois demonstra empatia e, sobretudo, respeito ao outro.

Esse ensinamento veste como uma luva para os dias atuais, especialmente porque com o confinamento necessário para o achatamento da curva da pandemia, muitos casais passaram a dividir a integralidade do tempo juntos, o que antes disso não era uma realidade e o que significa respeitar o espaço do outro.

Casamentos mais jovens são formados, em sua maioria, por pessoas impacientes e intolerantes com o erro, obcecados tão somente pela satisfação dos próprios anseios. Casamentos mais maduros são formados, também em sua maioria, por pessoas capazes de tolerar erros, de saber ouvir, coisas que só o calejar da relação pode trazer.

Com o advento da EC 66/2010 o divórcio ficou mais fácil, bastando a vontade das partes para que a união seja rompida. Mas, será que existe alguém que se casa pensando no divórcio? E a máxima do até que a morte nos separe? O que de tão impactante nos casamentos trouxe a epidemia senão o desafio de viver e conhecer o outro? Prometo amar e respeitar, até que a morte quarentena nos separe.

Números de divórcios explodem na China – Recentemente vêm sendo noticiado o recorde de divórcios vivenciados na cidade de Xi’am, na China. Esse crescimento é um claro efeito colateral da pandemia do novo coronavírus, já que com o isolamento, os casais passaram a ficar 24h juntos sob o mesmo teto, facilitando a ocorrência de atritos.

Mas essa estatística não é uma novidade. Desde de 2007 já se noticia aumento dos números de divórcio entre os chineses, portanto, 13 anos atrás. Os números seguem crescendo pois expectativas mais altas são criadas, as pessoas não carregam relacionamentos em que não se sintam plenamente satisfeitas e felizes.

O que esperar dos casamentos no Brasil após a crise? – O que se observa na China é um cenário muito provável no Brasil em um futuro próximo, pois muitos casais passarão a se conhecer durante o isolamento. A desburocratização do divórcio, por si só, já permite que você se sinta livre e escolha manter-se ou não dentro de um relacionamento e pelo tempo que desejar. É por isso que nos tribunais brasileiros as taxas de divórcio crescem a cada ano, e não há uma única razão para que isso ocorra.

É um conjunto multifatorial que, nesse atual cenário, muito provavelmente ficará incubado durante a quarenta e irá eclodir com a amenização da pandemia, com a possibilidade de se locomover, acionar instâncias judiciais ou extrajudiciais para colocar um ponto final na união.

Seria o divórcio a próxima pandemia? Até certo ponto pode-se dizer que sim, especialmente se observarmos a proliferação rápida e o seu crescimento (que muitas vezes sequer fará parte de alguma estatística considerando o grande número de uniões informais que existem no Brasil). Mas se pensarmos na pandemia no sentido de ser um mal, não necessariamente.

O fim de um relacionamento sempre vem acompanhado de uma desestruturação emocional, é inevitável. Mas não significa algo de todo ruim, desde que você enxergue a metade do copo cheia.

Casar é uma escolha e divorciar também é. Não existe uma receita pronta para a vitaliciedade da união. Pode ser que os números cresçam, sim, mas com toda certeza muitos ficarão intactos e ainda mais sólidos. Nunca se falou tanto em tolerância.

*Carolini Cigolini Lando, advogada de Direito das Famílias e Sucessões e Direito Homoafetivo

Fonte: Estadão