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Artigo: Da retificação de registro civil e suas modalidades – Por Rogério Alvarez de Oliveira
Os registros públicos dizem respeito aos atos registrados nos Cartórios de Registro Civil das Pessoas Naturais, tais como os nascimentos, casamentos, óbitos, emancipações, interdições, sentenças declaratórias de ausência, as opções de nacionalidade e as sentenças que deferirem a adoção, além das respectivas averbações e anotações, e estão regulados na Lei n. 6.015/73.
A retificação de registro civil, em sentido genérico, é a correção de informações ou dados constantes do assento, pressupondo-se a existência de erro. Há também a alteração do registro civil, relacionada ao estado da pessoa, como na hipótese em que o interessado deseja modificação do seu gênero e nome ou somente de seu nome. Neste caso, embora denominada como retificação de registro civil, a ação ajuizada para essa finalidade não cuida de qualquer retificação, mas de alteração do nome ou do gênero da pessoa, conforme o pedido.
Há que se distinguir a retificação, que pressupõe a existência de erros, como já dito, da restauração de assento de registro civil, porquanto esta última pressupõe a perda ou extravio do registro, tal qual nos casos de inundação ou incêndio do cartório, redundando na destruição dos livros registrários. Não há que se confundir a restauração com o registro civil tardio, hipótese que demanda a demonstração da inexistência do registro por não haver sido lavrado em qualquer época.
Como é cediço, as retificações de registro civil podem ser realizadas pela via judicial ou administrativa, conforme o caso. O artigo 13, inciso I, da Lei 6.015/73 permite que alguns atos do registro civil possam ser praticados a requerimento verbal ou escrito dos interessados, independentemente de ordem judicial. No caso da via judicial, a ação deve ser ajuizada perante o foro de domicílio da pessoa interessada ou no foro do local do cartório onde se acha o assento. Em regra, esse processo segue a jurisdição voluntária e deve ser postulado por advogado perante o juiz competente.
A lei registral já possibilitava a modificação do nome e do assento sem a necessidade de ação judicial, conforme disposto nos artigos 56 e 110, nos seguintes casos: I) o interessado que, no primeiro ano após ter atingido a maioridade civil, poderá alterar o nome, desde que não prejudique os apelidos de família; II) erros que não exijam qualquer indagação para a constatação; III) erro na transposição dos elementos constantes em ordens e mandados judiciais, bem como de outros títulos; IV) inexatidão da ordem cronológica e sucessiva da numeração do livro, da folha, da página, do termo e da data do registro; V) elevação de distrito a município ou alteração de suas nomenclaturas por força de lei.
O pedido apresentado diretamente no cartório é registrado e deferido ou indeferido pelo registrador. Com a mudança introduzida pela Lei 13.484/2017, deixou de ser necessária, inclusive, a oitiva do Ministério Público nesses casos de retificação administrativa de erros mais simples ou que não exijam qualquer indagação. Se o oficial registrador entender que o caso enseja maiores indagações, deverá remeter a parte para a via judicial. Do indeferimento, contudo, cabe inconformismo pela parte interessada, caso em que o registrador remeterá os autos ao juiz corregedor permanente, que decidirá após a oitiva do Ministério Público. Todavia, o pedido, nesse caso, ainda possui natureza administrativa, devendo ser observadas as hipóteses do referido artigo 110.
Outras situações ainda ensejam autorização judicial, tais como: VI) as questões de filiação (art. 113); VII) averbação do patronímico do companheiro pela mulher (art. 57, §2º); VIII) alteração de nome em razão de fundada coação ou ameaça decorrente de colaboração com a apuração de crime (art. 57, §7º e 58, parágrafo único); IX) averbação do nome de família do padrasto ou da madrasta pelo enteado (art. 57, §8º); X) modificação de nome pelo interessado fundado em motivo relevante (art. 57, caput); XI) substituição do prenome por apelidos públicos notórios (art. 58).
Se a correção depender da verificação do estado da pessoa natural (art. 103, LRP), ou seja, questões envolvendo filiação, como investigação ou desconstituição de paternidade, ou casamento, como nulidade ou anulação, a ação judicial deverá ser proposta perante o juízo da família competente, seguindo o procedimento de jurisdição contenciosa. Nos casos em que o interessado alegar que o nome de um de seus genitores constantes de seu assento de nascimento estiver completamente errado, havendo dúvida quando à pessoa, será necessário o ajuizamento de ação de filiação perante o juízo de família, não sendo possível a mera retificação perante o juízo de registros públicos.
Há, ainda, a hipótese de decisão pelo juiz quando os pais não se conformarem com a recusa do oficial quanto ao prenome suscetível de expor ao ridículo a pessoa (art. 55, parágrafo único) (XII). Nesse caso, a competência é do juiz corregedor permanente do cartório de registro civil de determinada região.
Em suma, os casos enumerados no art. 110 da lei registrária podem ser objeto de retificação pela via administrativa. Nas demais hipótese, a retificação deve ser judicial. Vem prevalecendo o entendimento nas Varas de Registros Públicos desta Capital o entendimento de que para a correção pela via administrativa há que existir erro no assento e este deve ser evidente, de nítida constatação mediante a confrontação da documentação apresentada, tal como, p.ex., para correção de erro do nome da pessoa constante de assento de casamento que não esteja exatamente com a mesma grafia constante de seu assento de nascimento. Se houver dúvida ou necessidade de dilação probatória, a parte deverá buscar a via judicial.
É importante ressaltar que os registros públicos são regidos pelos princípios da anterioridade, continuidade e veracidade, dentro outros, de modo que, p. ex., se o nome constante do assento de nascimento de determinada pessoa não estiver reproduzido exatamente com a mesma grafia no assento de casamento, este último é que deverá ser retificado para se ajustar ao primeiro, por se tratar de registro lavrado posteriormente. Somente por exceção – no caso de justificada necessidade – o juiz poderá deixar de observar o princípio da anterioridade, tomando-se o exemplo citado, para manutenção do nome tal como registrado no assento lavrado posteriormente (assento de casamento).
Há, ainda, a possibilidade de modificação do nome da pessoa no primeiro ano em que completada a maioridade civil, que poderá ser pleiteada pela via administrativa. Esta via, contudo, constitui uma opção ao interessado, que poderá também fazê-lo pela via judicial, segundo o princípio da inafastabilidade da jurisdição previsto no inciso XXXV, art. 5º, da CF (“a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”).
Por fim, uma vez determinada a retificação pelo juiz competente, a parte deverá encaminhar os mandados judiciais aos cartórios de registro civil para as devidas averbações, devendo comprovar nos autos haver cumprido com tal determinação no prazo assinalado.
Quando chamado a intervir, o Ministério Público deverá permanecer atuando para zelar, nessas ações, pela observância dos princípios da legalidade, publicidade, segurança jurídica e eficácia dos atos jurídicos, dignidade da pessoa humana, dentre outros.
Rogério Alvarez de Oliveira é promotor de Justiça do MP-SP e associado do Movimento do Ministério Público Democrático.
Fonte: ConJur