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Artigo – Cyberstalking: aprenda os perigos e saiba como se proteger – Por Gisele Truzzi
O termo Cyberstalking vem do inglês stalk, que significa “caçada”, e consiste no uso das ferramentas tecnológicas com intuito de perseguir ou ameaçar uma pessoa. É a versão virtual do stalking, comportamento que envolve perseguição ou ameaças contra uma pessoa, de modo repetitivo, manifestadas através de: seguir a vítima em seus trajetos, aparecer repentinamente em seu local de trabalho ou em sua casa, efetuar ligações telefônicas inconvenientes, deixar mensagens ou objetos pelos locais onde a vítima circula, e até mesmo invadir sua propriedade.
O stalker, indivíduo que pratica esta perseguição, mostra-se onipresente na vida da sua vítima, dando demonstrações de que exerce controle sobre esta.
O Cyberstalking já era assunto de preocupação do governo americano em 1999, época em que surgiram vários estudos sobre o tema, já anunciando os métodos de abordagem dos cyberstalkers, suas motivações e danos psicossociais causados às vítimas. Nota-se que nesta época já havia americanos com dependência tecnológica e vítimas de cyberstalking, temas que se tornaram comuns no Brasil por volta de 2008/2009.
De acordo com relatório detalhado do Departamento de Justiça Americano, o cyberstalking se dá através de diversas formas: envio constante de mensagens através de redes sociais e fóruns online, e-mails, SMS, entre outros; sendo que a maioria dos stalkers (sejam “online” ou “offline”), são motivados pelo desejo de exercer controle sobre suas vítimas e alterarem seu comportamento.
No Cyberstalking há uma certa “violência psicológica”, violência esta que é muito sutil: a linha que separa uma amizade, um elogio ou demonstração de carinho é muito tênue.
Acredito que você já tenha passado por isto ou conheça alguém que enfrentou situação semelhante: um indivíduo sempre está visitando seu perfil em uma rede social, deixa recados diários ou envia e-mails com frequência, encaminha mensagens regularmente desejando uma boa noite, por exemplo, insiste em fazer parte de seu círculo social (caso já não o faça), sabe de detalhes de sua vida, sem que sequer você tenha expressado isso, encontra-o em comunidades virtuais e fóruns online que você sequer imaginaria que ele pudesse estar “rondando” por ali… Resumindo: você é “perseguido virtualmente” e isso o incomoda.
Sem dúvida, o relativo anonimato propiciado pela Internet encoraja os cyberstalkers, que podem manter certa distância física da sua vítima, tendo a falsa impressão de que estão protegidos por uma tela de computador.
O desconforto e o abalo psicológico causados por esta perseguição virtual acabam por gerar sentimentos angustiantes na vítima, que muitas vezes não sabe quais medidas tomar. Nesse ponto, cabe lembrar que dependendo do teor do cyberstalking, este pode caracterizar crime de ameaça, previsto no artigo 147 do nosso Código Penal ou contravenção penal descrito pelo artigo 65 da Lei das Contravenções Penais pelo simples fato de perturbar a tranquilidade alheia.
Cabe à vítima analisar se aquele seu “fã” está passando dos limites e interferindo em sua rotina ou abalando sua psique.
De todo o modo, não subestime esta prática: “Make no mistake: this kind of harrassment can be as frightening and as real as being followed and watched in your neighborhood or in your home.” – Em tradução livre: “Não se engane: este tipo de perseguição pode ser tão assustadora e real quanto ser seguido e observado pela sua vizinhança dentro de sua própria casa” – (Al Gore, 45º Vice-Presidente dos Estados Unidos, em “1999 Report on Cyberstalking: a new challenge for Law Enforcement and Industry – A report from the Attorney General to the Vice President” 1 ).
O que fazer se constatada a prática de Cyberstalking?
1. Armazenar sempre as provas eletrônicas, a fim de manter sua integridade (guardar os e-mails originais recebidos, mensagens recebidas através de aplicativos ou de redes sociais, fotos, áudios, publicações efetuadas em redes sociais ou sites, etc.). Não apagar o conteúdo ofensivo recebido ou publicado até garantir que esta prova esteja preservada de modo íntegro.
2. Vale arquivar as capturas de tela dessas provas (tirar print-screen) e armazenar eventuais mídias recebidas (áudios, vídeos, fotos).
3. De posse das provas eletrônicas originais, dirigir-se até um Cartório de Notas a fim de lavrar uma Ata Notarial. A ata notarial é uma espécie de certidão elaborada por um Tabelião de Notas, onde ele descreverá o conteúdo visualizado e poderá armazenar eventuais mídias.Como o Tabelião possui fé pública, a ata notarial é uma prova incontestável perante o Judiciário, e poderá ser utilizada em futuros procedimentos judiciais, extrajudiciais ou policiais.
4. Procurar um advogado (ou a Defensoria Pública), para verificar a necessidade de medidas judiciais ou extrajudiciais relacionadas ao caso. Poderão ser necessárias ações judiciais específicas para identificação do ofensor, bem como eventual possibilidade de retirada do conteúdo difamatório publicado ou posterior condenação do sujeito identificado.
5. Registrar um Boletim de Ocorrência na Delegacia de Polícia mais próxima, apresentando as provas coletadas.
6. Se necessário, procurar um perito em forense digital, a fim de extrair as provas eletrônicas com integridade. O perito forense poderá coletar as provas necessárias, apresentando um laudo pericial que será importante para futuros processos judiciais.
7. Buscar acompanhamento psicológico, se necessário;
8. Nunca revidar as agressões.
Como evitar a prática de Cyberstalking?
Na realidade, não há como garantir que não seremos vítimas de cyberstalking ou de cyberbullying. Não existe ambiente digital 100% seguro. No mundo atual, todos nós somos vítimas em potencial, mesmo que não tenhamos perfis em redes sociais.
É importante ter um comportamento atento, a fim de minimizar eventuais riscos:
1. Evitar fazer checkin em locais públicos em tempo real;
2. Evitar publicações pessoais abertas ao público;
3. Não mencionar e-mails ou números de celulares pessoais nas redes sociais;
4. Evitar publicar abertamente fotos dos filhos menores de idade;
5. Tomar cuidado com as “curtidas” em publicações de terceiros, fanpages, locais e assuntos de seu interesse. Evitar confirmar presença em eventos públicos. Deixar a sua lista de amigos oculta. Seu stalker poderá monitorar sua atividade na rede social, praticando engenharia social: verá quem são seus amigos, os locais que frequenta, os eventos que comparece, os assuntos que tem interesse, tendo acesso a uma gama infinita de informações gratuitas sobre você.
6. Fazer uso das listas de privacidade disponibilizadas por algumas redes sociais (mas ter em mente que mesmo algum “amigo” da lista poderá tirar print de sua publicação e desvirtuar seu conteúdo);
7. Não preencher totalmente as informações solicitadas pelos formulários das redes sociais, principalmente telefone; atentando-se ao cadastramento somente das informações obrigatórias para acesso à rede;
8. Ter consciência de que a maioria das redes sociais sincronizam os seus perfis com os contatos cadastrados na agenda do seu celular. Ou seja: Facebook, Instagram e Whatsapp (por exemplo) cruzam seus perfis dessas plataformas entre si e sincronizam com os números de celulares cadastrados em seu telefone, sugerindo periodicamente seus perfis para que essas pessoas o adicionem, e vice-versa.
9. Ter cautela com o que publica/compartilha nas redes sociais ou com o conteúdo que encaminha para terceiros. Qualquer material poderá ser manipulado ou distorcido, e servir como conteúdo para difamação ou extorsão, contra você mesmo ou contra terceiros, bem como gerar fake news, ou outros incidentes. As consequências dessas situações podem ser desastrosas, acabando com uma reputação profissional, com a imagem de uma marca ou instituição, ou deixando marcas indeléveis na vida de um indivíduo.
*Gisele Truzzi é advogada especialista em Direito Digital e fundadora da Truzzi Advogados.
Fonte: IstoÉ Dinheiro