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Correio Braziliense: Contratos formais e acordos moldam os relacionamentos atuais
Comportamentos digitais, contratos afetivos e novas regras. Especialistas explicam como os casais estão redesenhando os relacionamentos
Os acordos entre namorados e as regras de relacionamento estão cada vez mais em pauta, especialmente nas redes sociais. Enquanto alguns casais optam por formalizar suas condições de convivência por meio de contratos com firma reconhecida em cartório, detalhando direitos e deveres, outros preferem estabelecer limites informais, baseados no diálogo e na confiança mútua.
Apesar dos contratos de namoro terem começado a surgir nos cartórios brasileiros em 2002, o documento teve recorde de registro em 2024, com 191 atos formalizados. Além do aumento notório na formalização desses combinados formais de namoro, celebridades também confessaram aderir à tendência. Um exemplo disso era a relação do jogador da Seleção Brasileira Endrick, 19, com a influenciadora Gabriely Miranda, 22, que não oficializaram o contrato, mas tinham diversas cláusulas combinadas, como proibição de vícios, obrigação de dizer “eu te amo” frequentemente e algumas palavras vetadas.
Mesmo sem ser oficial, especialmente porque o jogador era menor de idade quando eles criaram o “documento”, ambos deveriam seguir as regras para manter um bom convívio. Em caso de descumprimento dos combinados, havia uma espécie de “multa”, que consistia em presentear o outro. Segundo a advogada especialista em direito contratual Maria Eduarda Justino, as redes sociais têm um papel duplo na divulgação desses acordos, pois podem dar visibilidade para o contrato de namoro e ajudar as pessoas a terem uma ferramenta de proteção de seu patrimônio, mas também geram uma certa confusão.
“Alguns podem acreditar que cláusulas sobre afeto e presentes, que são acordos íntimos e simbólicos, têm validade jurídica real, mas a verdade é que essas regras são do âmbito pessoal e não se sustentam no contexto jurídico”, alerta a especialista. Maria Eduarda acrescenta que o contrato de namoro é um documento formal assinado por um casal para declarar que a relação é apenas um namoro, sem intenção de constituir família. Esse acordo tem como principal objetivo proteger o patrimônio individual, evitando que o relacionamento seja confundido com uma união estável. “Contudo, a Justiça pode invalidá-lo se for provado que, na prática, o casal já vivia em uma união estável, pois a realidade dos fatos prevalece sobre o que está escrito.”
Outro caso que chamou atenção para as normas atuais de um namoro foi a polêmica que envolveu as influenciadoras e o segundo filho de Luciano Huck e Angélica, Duda Guerra, 16, e Antonela Braga, 16, e Benício Huck, 17. A confusão começou pois Antonela Braga pediu para seguir o perfil privado de Benício — conhecido na internet como Dix —, então namorado de Duda Guerra, nas redes sociais. A polêmica repercutiu e desencadeou o fim do relacionamento entre os jovens, fazendo com que as pessoas questionassem diversas nuances da situação.
As regras do jogo
Embora o caso não tenha um contrato formal, a situação levantou reflexões sobre a dinâmica dos relacionamentos atuais e a pressão das redes sociais nessas relações. Enquanto muitos acreditam que seguir alguém nas redes sociais não significa nada, para outros isso é uma espécie de “microtraição”, gerando embates sobre o que é ou não aceitável em um relacionamento monogâmico saudável.
Essas pequenas regras são comuns entre os jovens, mas engana-se quem pensa que pessoas mais maduras não fazem contratos de namoro informais. Carolina Araújo, 41, e Warley Faria, 43, estão em um relacionamento há sete anos e tiveram idas e vindas até que resolveram estabelecer algumas “cláusulas” juntos para não cometerem os mesmos erros. De acordo com ela, os dois têm profissões, situações financeiras e filhos de idades diferentes, então precisaram ajustar para que a relação funcionasse para ambos. “Quando a gente tem por escrito o que foi acordado, não esquecemos o que foi dito”, explica.
Entre as principais regras que o casal estabeleceu estão não casar, priorizar os filhos durante a semana, não terem mais filhos, respeitarem a individualidade um do outro e algumas observações mais afetivas, como se tratar com apelidos carinhosos mesmo quando estão brigados, sempre buscarem o diálogo para evitar chateações e fazerem um esforço diário de demonstrar sentimentos. Em situações que os acordos não são seguidos, buscam resgatar o documento e conversam sobre os acontecimentos. “O contrato nos ajudou a ter um relacionamento cada vez mais claro e saudável”, afirma Carolina Araújo.
A psicóloga de relacionamentos Bruna Dandara enxerga essa iniciativa dos casais como uma busca por clareza, comunicação assertiva e autonomia para definir o que esperam um do outro. “Segundo a terapia cognitivo-comportamental, uma relação saudável depende da capacidade de ambos os parceiros identificarem suas necessidades, comunicá-las com clareza e ajustar comportamentos”, salienta. “Nesse sentido, os ‘contratos’ e acordos funcionam como ferramentas de organização relacional”, complementa.
O ideal, segundo a especialista, é que os casais tenham conversas de alinhamento ainda no início da relação, para realçarem as expectativas e o que acham certo ou errado. “Ao discutir os acordos cedo, o casal previne frustrações e apara essas arestas, promovendo um relacionamento mais funcional para ambos”, recomenda. Contudo, o tom do diálogo deve ser com o objetivo de promover respeito mútuo e prevenir conflitos, não controlar o outro. “Se vem de certas imposições, exigências unilaterais ou ameaças veladas, esses contratos podem indicar um padrão de controle e insegurança. O foco deve ser sempre na colaboração, não no controle.”
Fonte: Correio Braziliense