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Informativo de Jurisprudência do STJ destaca alteração no regime de bens
Processo: Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 25/4/2023.
Ramo do Direito: Direito Civil
Tema: Casamento. Regime de bens. Modificação. Separação total para comunhão universal. Eficácia ex tunc. Corolário lógico.
Destaque: Os efeitos da modificação do regime de separação total para o de comunhão universal de bens, na constância do casamento, retroagem à data do matrimônio (eficácia ex tunc).
Informações do inteiro teor: A modificação do regime de bens foi admitida pelo Código Civil de 2002, especialmente no seu art. 1.639, § 2º. Nos termos da literalidade da norma, a alteração do regime de bens não poderá prejudicar os direitos de terceiros. Constata-se, assim, a preocupação de se proteger a boa-fé objetiva, em desprestígio da má-fé, de modo que a alteração do regime não poderá ser utilizada para fraude em prejuízo de terceiros, inclusive de ordem tributária. Assim, em qualquer hipótese, havendo prejuízo para terceiros de boa-fé, a alteração do regime de bens deve ser reconhecida como ineficaz em relação a esses, o que não prejudica a sua validade e eficácia entre as partes e de modo geral.
Na hipótese do presente recurso, as partes casaram-se pelo regime da separação eletiva de bens e, valendo-se da autonomia de vontade, optaram por alterá-lo para o regime da comunhão universal de bens (o que supera, portanto, a comunhão parcial), manifestando, expressamente, a intenção de comunicar todo o patrimônio, inclusive aquele amealhado antes de formulado o pedido de alteração.
Nesse caso, a retroatividade (efeitos ex tunc) não teria o condão de gerar prejuízos a terceiros, porque todo o patrimônio titulado pelos recorrentes continuaria respondendo, em sua integralidade, por eventuais dívidas, conforme inteligência do art. 1.667 do Código Civil de 2002, que dispõe que o regime da comunhão universal de bens importa a comunhão de todos os bens presentes e futuros dos cônjuges e suas dívidas passivas. Com efeito, na hipótese de alteração do regime de bens para o da comunhão universal o próprio casamento se fortalece, os vínculos do casal se ampliam e a eficácia ex tunc decorre da própria natureza do referido regime.
Nessa linha, é possível que os interessados requeiram ao juiz que estabeleça a retroação dos efeitos da sentença, optando pelos efeitos ex tunc. No que tange à esfera jurídica de interesses de terceiros, a lei já ressalva os direitos de terceiros que eventualmente se considerem prejudicados, de modo que a modificação do regime de bens será considerada ineficaz em relação a eles.
A vedação, em caráter absoluto, à retroatividade implicaria inadmissível engessamento, retardando os benefícios que adviriam de um regime presumivelmente mais vantajoso para as partes e terceiros. O que não se pode fazer é retroagir para prejudicar, para alterar uma situação do passado em prejuízo da sociedade. Ao contrário, se a retroatividade é benéfica para a coletividade, se não viola o patrimônio individual, nem prejudica terceiros, ou seja, se o retroagir não produz desequilíbrio jurídico-social, deve ser admitido.
Havendo alteração da separação eletiva de bens para a comunhão universal, só haveria de fato uma comunhão “universal” se os bens já existentes se comunicarem. Sendo o regime primitivo o da separação de bens, com a alteração para comunhão universal, todos os bens presentes e futuros devem entrar para a comunhão. Como a própria lei já ressalva os direitos de terceiros (a alteração do regime de bens será ineficaz perante eles) não há por que o Estado-juiz criar embaraços à livre decisão do casal acerca do que melhor atende a seus interesses.
É difícil também imaginar algum prejuízo aos credores, visto que esses, com a alteração do regime para comunhão universal, terão mais bens disponíveis para garantir a cobrança de valores. Independentemente de constar na decisão judicial, o patrimônio continuará respondendo pelas dívidas existentes. Quanto a eventual credor prejudicado, vale a ressalva feita pela lei que diz respeito à ineficácia em relação a direito de algum terceiro que venha a alegar prejuízo.
Como regra, a mudança de regime de bens valerá apenas para o futuro, não prejudicando os atos jurídicos perfeitos. Mas a modificação poderá alcançar os atos passados se o regime adotado (exemplo: alteração de separação convencional para comunhão parcial ou universal) beneficiar terceiro credor pela ampliação das garantias patrimoniais. Aceitável, portanto, a retroação decorrente de explícita manifestação de vontade dos cônjuges.
A mutabilidade do regime de bens nada mais é do que a livre disposição patrimonial dos cônjuges, senhores que são de suas coisas. Não há sentido proibir a retroatividade à data da celebração do matrimônio livremente manifestada pelos cônjuges de comunicar todo o patrimônio, inclusive aquele amealhado antes de formulado o pedido de alteração do regime de bens, especialmente no caso em que a retroatividade é corolário lógico da mudança para a comunhão universal.
Fonte: Informativo de Jurisprudência do STJ