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ConJur – Artigo: Controvérsias da cobrança de ITCMD sobre bens no exterior – Por Juliana Cardoso, Gabriela de Andrade e Henrique Paslar
Recentemente, o Supremo Tribunal Federal julgou procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão — ADO nº 67, ajuizada pela Procuradoria Geral da República, em maio de 2021, reconhecendo a omissão do Congresso ante a falta de Lei Complementar que regulamente a cobrança do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doações (ITCMD) sobre bens no exterior.
Na decisão, o STF estabeleceu o prazo de 12 meses, a partir da data de publicação da ata do julgamento de mérito da referida ADO, para que o Congresso edite a Lei Complementar que deve regulamentar a incidência do ITCMD nas hipóteses de 1) doador domiciliado ou residente no exterior e 2) de cujus que possuía bens, era domiciliado ou residente no exterior, ou ter inventário processado no exterior.
A criação dessa Lei Complementar está prevista na Constituição, em seu artigo 155, inciso III, porém nunca foi pauta de grandes debates.
Contudo, mesmo com a inércia do legislador, os estados e o Distrito Federal há tempos tentam instituir a cobrança aos contribuintes de uma parcela sobre a transmissão desses bens, com a edição de normas locais, sob justificativa do exercício da prerrogativa constitucional prevista no artigo 24, do mesmo diploma legal, que prevê que ante a inexistência de lei federal que regulamente as normas legais, poderão os estados exercer a competência legislativa plena, de forma a atender suas peculiaridades e, também, com base no parágrafo 3º do artigo 34, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) que apregoa que os estados poderão editar leis de forma a regular a aplicação do sistema tributário nacional.
Em razão dessa aparente competência legislativa suplementar, o estado de São Paulo previa a hipótese de incidência do ITCMD para os casos de doador/de cujus residente no exterior e, o bem objeto de transmissão que se encontrasse em território do estado, ou quando o bem se encontrasse no exterior, mas o donatário, herdeiro ou legatário tivessem domicílio no estado, nos termos do artigo 4º, da Lei Estadual nº 10.705/2000.
Assim, tal disposição, preenchia a lacuna causada pela ausência da Lei Complementar, de modo que passou a ser exigido dos contribuintes paulistas o ITCMD sobre 1) doações recebidas de doadores no exterior, 2) na transmissão causa-mortis de bens no exterior, 3) de cujus domiciliado e residente ou que teve seu inventário processado no exterior. Contudo, essa exigência sempre foi alvo de questionamentos na esfera judicial, formando uma corrente jurisprudencial favorável, pró-contribuinte.
Diante de inúmeros processos dos contribuintes, que obtinham êxito na alegação de que o imposto não poderia ser exigido face a ausência de existência de lei complementar, o assunto atingiu a alçada do STF por meio do Recurso Extraordinário nº 851.108/SP da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo. O julgamento ocorreu em 2021, com trânsito em julgado em 25/05/2022, negando seguimento ao recurso e fixando a seguinte tese:
“TEMA nº 825 — É vedado aos Estados e ao Distrito Federal instituir o ITCMD nas hipóteses referidas no artigo 155, §1º, III, da Constituição Federal sem a intervenção da lei complementar exigida pelo referido dispositivo constitucional“.
Mesmo com a decisão favorável aos contribuintes, a sua aplicação não é automática. Por outro lado, para os contribuintes que contavam com decisão diversa à proferida para implementação de planejamentos patrimoniais e sucessórios sem a exigência de edição de lei complementar é recomendado que considerem, desta forma, buscar alternativas que contemplem estruturas no exterior, de modo a evitar a tributação em território nacional.
Atualmente, tramita na Câmara dos Deputados, ainda em fase inicial, o projeto de Lei Complementar nº 67/2021, de autoria do deputado Ricardo Barros (PP-PR) o qual, caso seja sancionado, passará a prever as seguintes hipóteses de incidência de ITCMD:
“Na transmissão causa mortis de bens imóveis e bens móveis, situados no exterior, em que o domicílio do de cujus seja no Brasil, será devido ao estado de domicílio do de cujos. Já na transmissão de bens imóveis e bens móveis situados no exterior e com domicílio do de cujos no exterior, será devido ao estado do domicílio do sucessor.”
Nas hipóteses de doação de bens imóveis situados no Brasil, em que o doador seja domiciliado no exterior ou no Brasil, o ITCMD é devido ao estado da localização do respectivo bem. Já na hipótese de doação de bens imóveis e bens móveis, situados no exterior, o ITCMD é devido ao estado de domicílio do donatário.
Em que pese as hipóteses do projeto de Lei Complementar acima, ainda que meramente especulativas, a decisão do STF já acarreta aumento de demandas nas áreas de Wealth Planning & Tax nos escritórios de advocacia, considerando a preocupação dos clientes para a implementação de planejamentos patrimoniais e sucessórios visando a melhor eficiência fiscal.
Nota
[1] https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2280239
Autores:
Juliana Cardoso é advogada tributarista e sócia do escritório Abe Giovanini Advogados.
Gabriela Gomes de Andrade é advogada da área de Wealth Planning & Tax do escritório Abe Advogados.
Henrique Paslar é advogado da área de Wealth Planning & Tax do escritório Abe Advogados.
Fonte: ConJur