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AnoregSP divulga manifesto contra o Projeto de Lei 177/07

04-11-2014

Manifesto contra o Projeto de Lei que reduz emolumentos pagos aos cartórios, Defensoria Pública e Santas Casas
A diretoria da AnoregSP (Associação dos Notários e Registradores do Estado de São Paulo), vem a público manifestar-se contrariamente à aprovação do Projeto de Lei 177/07, do deputado Jonas Donizette (PSB) com proposta de emendas dos deputados Campos Machado (PTB) e Roque Barbiere (PTB).

O projeto é essencialmente fundamentado na reportagem publicada no Jornal Valor Econômico (ed. 21/03, “Receita anual dos cartórios no país chega a R$ 7 bilhões”), como não deixa dúvidas sua exposição de motivos:

“Às reclamações veio somar-se a matéria publicada no jornal ‘Valor Econômico’, edição de 21 de março de 2007, divulgando dados preocupantes sobre o faturamento anual dos Cartórios, o qual anda pela casa dos 7 bilhões de reais, em todo o Brasil. Desse total, em torno de 2,117 bilhões de reais, foram gerados pelo sistema Estado de São Paulo

“A matéria afirma, ainda, que a receita dos cartórios vem crescendo, desde 2003, a uma taxa de 10,06% ao ano, um crescimento muito superior ao de outros segmentos de mercado

Portanto, propõe o deputado em seu Projeto de Lei (artigo 1º) que:

“Os emolumentos relativos aos serviços notariais e de registro, cobrados e recolhidos com base na Lei n.º 11.331, de 26 de dezembro de 2002, de acordo com as tabelas anexas à mesma Lei, ficam reduzidos em 25% (vinte e cinco por cento) a partir da vigência desta lei”. (íntegra ao fim).

Já a proposta de emenda do deputado Campo Machado sugere em seu parágrafo único:

“Parágrafo único – Referente à Tabela II – Dos Ofícios de Registro de Imóveis, também anexa à Lei 11.331/02, a redução prevista no artigo 1º será de 50% (cinqüenta por cento), observadas as demais disposições desta Lei.”

Considerando-se as distorções, tanto da reportagem como do Projeto de Lei, a AnoregSP esclarece:

1. A prestação do serviço público notarial e de registro não deve ser analisada pelo aspecto da exploração econômica da atividade. Não existe o suposto comércio “bilionário” citado pela reportagem.

2. As informações, valores e comparativos econômicos usados como base da reportagem partiram de dados superficiais, que não levaram em conta as peculiaridades da atividade notarial e de registro, as variações de valores entre as tabelas estaduais e as parcelas em que se dividem os emolumentos;

3. Especialmente no caso de São Paulo, além da parte destinada ao notário ou registrador, as parcelas em que se dividem os emolumentos, conforme previsto no artigo 19 da Lei Estadual 11.331/02, são destinadas:

a) às receitas do Estado;

b) ao IPESP;

c) ao Fundo de Fundo de Compensação dos Atos Gratuitos do Registro Civil das Pessoas Naturais e à Complementação da Receita Mínima das Serventias Deficitárias;

d) ao Fundo Especial de Despesa do Tribunal de Justiça; e

e) às Santas Casas de Misericórdia, nos atos notariais.

4. Ressaltamos que pouco mais de 74% das receitas do Estado, por força do artigo 20 da Lei Estadual 11.331/02, são destinados ao Fundo de Assistência Judiciária; e cerca de 7,4%, ao custeio das diligências dos oficiais de justiça incluídas na taxa judiciária

5. A reportagem, no entanto, faz supor o faturamento anual dos cartórios do Estado de São Paulo, na ordem de R$ 2,117 bilhões, para tanto, baseando-se apenas nos dados obtidos junto ao Fundo Especial de Defesa do Tribunal de Justiça, que participa com 3,289473% na arrecadação bruta de todos os cartórios. Não foram levadas em conta as demais parcelas descritas acima.

6. É importante esclarecer que da verba recolhida por todos os cartórios do Estado correspondente ao Fundo de Compensação dos Atos Gratuitos do Registro Civil das Pessoas Naturais e à Complementação da Receita Mínima das Serventias Deficitárias, depende a sobrevivência de cerca de 753 cartórios de Registro Civil das Pessoas Naturais do Estado, sendo que, só no ano passado, esses cartórios praticaram 855.5 mil atos de registro gratuitos a toda população e ao governo, representando a média de 71,2 mil atos mensais

7. Os atos gratuitos do registro civil são, portanto, remunerados por parcela dos atos praticados pelas demais especialidades notariais e de registro, através do Fundo do Registro Civil. É a existência do Fundo que faz de São Paulo o Estado com menor subregistro do País.

8. Ao contrário do que faz pensar a reportagem, e o que imagina o Deputado Jonas Donizette, a realidade da maior parte das serventias de São Paulo é muito aquém daquilo que se chamou “faturamento dos cartórios”.

9. Como exemplo, podemos citar que, apenas no mês de março deste ano, foram devolvidos cinco cartórios no Estado, inclusive de comarcas grandes, como Santos, e de naturezas tidas como muito rentáveis, como de Registro de Imóveis. Além disso, é importante ressaltar que existem hoje cerca de 500 cartórios sem titular por absoluta falta de viabilidade financeira, muitos, inclusive foram a concurso, mas não foram objeto de escolha por nenhum dos aprovados;

10. Assim, a aprovação desse Projeto de Lei aumentará significativamente o número de cartórios deficitários e daqueles que são devolvidos ao Estado, além de praticamente inviabilizar a grande maioria dos demais.

11. Haverá o desemprego em massa, já uma redução da ordem de 25% da receita dos cartórios, a exemplo do que ocorreria em qualquer outro setor da economia, implicará em corte drástico nos custos e, consequentemente, na folha de pagamentos. Apenas em São Paulo, os cartórios geram mais de 20 mil empregos diretos e mais de 100 mil indiretos.

12. Isso, sem falar nos cerca de 55 mil advogados que prestam assistência judiciária gratuita, remunerados pelo Fundo de Assistência Judiciária, gerido a Defensoria Pública. No ano passado cerca de 800 mil pessoas foram beneficiadas por este convênio.

13. A própria Defensoria Pública teria comprometida grande parte de seu orçamento, comprometendo o excelente trabalho prestado em cerca de um ano, desde de sua instauração.

14. No mais, vale lembrar que, além dos atos de Registro Civil das Pessoas Naturais, há outras gratuidades previstas em lei, que já são praticadas por todos os cartórios, desde que o requerente cumpra os requisitos legais. É este o caso, entre outros, das escrituras públicas de separação, divórcio, inventário e partilha; do primeiro registro imobiliário, nos programas de Regularização Fundiária de Interesse Social.

Se apenas os fatos expostos acima não forem suficientes para que se afirme que o Projeto de Lei, ao contrário do imaginado por seu autor, é contrário ao interesse público, já que compromete de forma irremediável não apenas a renda dos cartórios, gerando des
emprego em massa, mas, principalmente, compromete todo o sistema de assistência judiciária gratuita do Estado, impossibilitando o acesso à Justiça da imensa maioria da população paulista, deve-se considerar alguns aspectos jurídicos:

1. Há vício de iniciativa, pois qualquer alteração na receita orçamentária do Estado deve partir de projeto de iniciativa do Governador, e, de acordo com o §6º do art. 174 da Constituição Estadual:

“o projeto de lei orçamentária será acompanhado de demonstrativo dos efeitos decorrentes de isenções, anistias, remissões, subsídios e benefícios de natureza financeira, tributária e creditícia”,

É bom salientar que, sendo a Lei Orçamentária de iniciativa exclusiva do Governador (art. 174, III, da Constituição Estadual), qualquer lei que, no curso do exercício fiscal, altere a receita ou a despesa prevista no orçamento também deve ser de iniciativa do Chefe do Executivo;

2. Como parte dos emolumentos é destinada à Fazenda do Estado, como exposto acima, qualquer redução de seu valor configurará renúncia de receita, indo de encontro ao disposto no artigo 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101/00):

“A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá estar acompanhada de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e pelo menos uma das seguintes condições:

“I- demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, na forma do art. 12, e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias;

“II – estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado no caput, por meio do aumento de receita proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.”

“§1º. A renúncia compreende anistia, remissão, subsídio, crédito presumido, concessão de isenção em caráter não geral, alteração de alíquota ou modificação de base cálculo que implique redução discriminada de tributos ou contribuições, e outros benefícios que correspondam a tratamento diferenciado.” (grifamos)

Por fim, apenas a título de comparação, enquanto uma segunda via de certidão de nascimento tem o custo de R$ 17,03 (existindo ainda a gratuidade para as pessoas declaradas pobres) e uma certidão positiva de protesto tem o custo de R$ 6, 85, o cidadão paga taxa de R$ 125,23 pela renovação de uma CNH; R$ 21,35 pela segunda via do RG; R$ 5,50 para emissão de CPF; e R$ 156,07 por um passaporte.

Em relação à aquisição de imóveis, o custo de uma escritura para um imóvel de R$ 10.000,00 é de R$ 342,60, enquanto a taxa de expediente cobrada pelos bancos para o instrumento particular com força de escritura pública, na hipótese de financiamento, é de R$ 400,00; caso o comprador pretenda adquirir os recursos do FGTS, a taxa sobe para R$ 1.300,00.

Ainda no Registro de Imóveis, o registro da aquisição de um apartamento de R$ 40.000,00 é de R$ 535,60; ao passo que o seguro de um veículo Celta 1.0 avaliado em R$ 25.000,00 é de aproximadamente R$ 1.500 ,00. E, diferentemente do registro, o seguro precisa ser anualmente renovado.

A AnoregSP está em permanente diálogo com diversos parceiros, como o Ministério da Justiça, Ministério do Planejamento, Ministério Público de São Paulo, Defensoria Pública de São Paulo, Secretarias de Estado da Habitação e da Justiça e da Cidadania e Jornada da Moradia, além de prefeituras municipais, com o objetivo de demonstrar para todos os extratos da sociedade a importância da atividade notarial e de registro – e o quanto é prejudicial a sua mistificação.

Não se pode admitir que um tema com tantas repercussões sociais seja tratado de forma leviana e a reboque de dados imprecisos, carentes de qualquer análise técnica.

Se este é o momento de se iniciar um amplo debate em torno dos emolumentos notariais e de registro, estamos dispostos ao diálogo: de forma democrática, transparente e em defesa do interesse público e do bem comum.

Fonte : Anoreg-SP