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Artigo – Importância do registro de imóveis para potencializar a satisfação da execução judicial – por Arthur Zeger

21-11-2017

O Código de Processo Civil de 2015 incorporou em seu texto o entendimento que os tribunais pátrios vinham empregando em diversas matérias modulando disposições do antigo código processual ou integrando suas lacunas.

Nesse sentido, como não podia deixar de ser, o CPC2015 tratou de diversas matérias relevantes às Serventias Extrajudiciais, dentre as quais (sem prejuízo de outras), (i) a inovação quanto à competência para a causa em que for parte serventia notarial ou de registro (Art. 53, inciso III, ‘f’), (ii) o detalhamento da disciplina da gratuidade das custas judiciais e sua abrangência/extensão aos serviços extrajudiciais (Art. 98, §1º, inciso IX e §8º), (iii) aprimoramentos em matéria de hipoteca judiciária (Art. 495), (iv) inclusão da certidão expedida por serventia notarial ou de registro como sendo título executivo extrajudicial (Art. 784, inciso XI), (v) aprimoramento do Art. 792, inciso I, no que diz respeito à fraude à execução, e (vi) inseriu a disciplina da averbação premonitória (Art. 792, inciso II e 799).

Neste breve artigo, trataremos de institutos que viabilizam aos processualistas utilizar as Serventias de Registro para maximizar os resultados efetivos dos processos em andamento. As medidas a serem doravante estudadas e analisadas, ainda que de passagem, são de suma importância por visarem a efetividade da fase de execução, presente ou futura, levando-se em conta que em recente estudo conduzido pelo Conselho Nacional de Justiça (Relatório da Justiça em Números, 2017) na fase de execução os processos são três vezes mais moroso do que na fase de conhecimento (o CNJ apurou que na média nacional, os processos levam em média 1 ano e 4 meses na fase de conhecimento e aproximadamente 4 anos e 6 meses na fase de execução).

É tempo, pois, de valer-se dos instrumentos processuais disponíveis e aptos a aumentarem as chances de eficácia da execução (existente ou futura) mediante a identificação (identificar no sentido de marcar, registrar e não no sentido de “descobrir”), no patrimônio do credor os ativos que restarão vinculados e separados para saldar execução existente ou vindoura.

Se está a falar, dessa forma, da hipoteca judiciária e da averbação premonitória.

Hipoteca judiciária

Por meio da hipoteca, um bem ou direito do devedor passa a ficar vinculado ao cumprimento de certa obrigação. A hipoteca, como bem se sabe, é modalidade de garantia real, na medida em que não recai sobre a pessoa do devedor (como ocorre no aval e na fiança, por exemplo) mas sim sobre os bens e direitos relacionados no Artigo 1.473 do Código Civil (os imóveis e os acessórios dos imóveis conjuntamente com eles, o domínio direto, o domínio útil, as estradas de ferro, os recursos naturais a que se refere o art. 1.230, independentemente do solo onde se acham, os navios, as aeronaves, o direito de uso especial para fins de moradia, o direito real de uso e a propriedade superficiária).

Em regra, a hipoteca se origina do acordo entre as partes (“hipoteca convencional”). Todavia, pode surgir por disposição legal (“hipoteca legal”) ex viArt. 1.489 do Código de Processo Civil ou mesmo em decorrência de um processo judicial (“hipoteca judicial”), nos termos do Art. 495 do Código de Processo Civil.

Tratando da hipoteca judiciária, dispõe o Art. 495 do CPC que “A DECISÃO que condenar o réu ao pagamento de prestação consistente em dinheiro e a que determinar a conversão de prestação de fazer, de não fazer ou de dar coisa em prestação pecuniária valerão como título constitutivo de hipoteca judiciária”(destaques não originais). O destaque decorre do fato de a lei anterior (CPC73) não ter conferido a “qualquer” decisão condenatória o alcance da hipoteca judiciária, mas apenas das sentenças – o que foi, com razão, aprimorado pela nova ordem processual na medida em que não apenas por sentença se impõe obrigações de pagar ou de fazer/não fazer conversíveis em obrigação de pagar.

Portanto, a hipoteca judiciária é efeito imediato da sentença, dela decorrendo automaticamente por força da lei.

Na antiga ordem processual o registro da hipoteca judiciária no Registro de Imóveis dependia de mandado judicial com fim específico – o que além de sobrecarregar as Serventias Judiciais, atrasava sua efetivação que visa justamente fortalecer o credor em acautelar o patrimônio do devedor para futura execução. Esse panorama foi alterado e atualmente a hipoteca judiciária independe de decisão, autorização ou qualquer outro procedimento do Juízo ou de sua Serventia.

Didaticamente, há quem explique a “hipoteca judiciária” como uma “pré-penhora” ou “penhora antecipada” já que antes mesmo de eventual penhora determinada pelo Juízo, pode a parte diretamente atingir/reservar certo imóvel para futura constrição judicial.

Ainda, pela disciplina do Art. 495 do CPC2015, a decisão produzirá hipoteca judiciária ainda que venha a ser impugnada por recurso dotado de efeito suspensivo (ressalvado o direito da parte que vier a ser prejudicada pelo registro de hipoteca judiciária baseada em decisão que vier a ser posteriormente reformada).

Importante observar, ainda, que qualquer decisão judicial que condene a “parte” (e não necessariamente o “réu”, pois pode o autor ser condenado como litigante de má-fé, por exemplo, de forma que não é apenas o réu quem está vinculado e sujeito à hipoteca judicial) pode ser ingressada no álbum imobiliário do imóvel que se pretenda atingir com a hipoteca judicial, independentemente de mandado. Isso porque dispôs o §2º que a hipoteca judiciária poderá ser realizada mediante apresentação de cópia da sentença perante o cartório de registro imobiliário, independentemente de ordem judicial, de declaração expressa do juiz ou de demonstração de urgência – o que é bem visto.

A hipoteca judiciária dispensa, ainda, o contraditório prévio, superando antiga[1] jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que invalidava a penhora judiciária quando a decisão que a originava não havia sido proferida com observância ao prévio contraditório da contraparte. Neste sentido, o Agravo de Instrumento 2094872-17.2016.8.26.0000 da 34ª Câmara de Direito Privado do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que, em Acórdão lavrado pelo Desembargador Nestor Duarte, consignou que: “Na vigência do Código de Processo Civil de 1973, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça se posicionou no sentido de que é necessária, na aplicação de seu artigo 466, a observância do contraditório, conforme se vê: [transcrição do AgEg no REsp 1280847/SP]. Tal entendimento era suficiente para acolher a irresignação dos agravantes antes do registro de hipoteca. Outra, porém, é a disciplina trazida pelo Código de Processo Civil vigente que prescinde, até mesmo, de decisão judicial para a efetivação da hipoteca, consoante o artigo 495, §2º (…)”.

Ainda que caiba à parte comunicar ao juízo sobre a efetivação da hipoteca judiciária, por cautela o Oficial Registrador tão logo registre a hipoteca judiciária, deve comunicar o registro ao Juiz do feito sobre a sua realização.

Deve-se atentar que sentenças homologatórias de acordo não permitem o registro como hipoteca judiciária na medida em que não têm natureza condenatória. Dessa forma, se for interesse de uma das partes constituir alguma garantia desse jaez, competirá às partes assim pactuar no acordo que vier a ser levado a homologação.

Também se deve observar que o pedido de registro da hipoteca judiciária deve ser levado a cabo pela parte interessada (leia-se credora) de forma que o pleito formulado por quem não tenha interesse legítimo desse registro inviabiliza que a Serventia Registral o efetive. A esse respeito, aliás, verifique-se o precedente do Conselho Superior da Magistratura (Apelação Cível 0069199-52.2013.8.26.0100), de relatoria do Desembargador Elliot Akel, assim ementado: “REGISTRO DE IMÓVEIS – DÚVIDA – REGISTRO DE HIPOTECA JUDICIÁRIA – CONSTRIÇÃO DETERMINADA EM PROCESSO NO QUAL A TITULAR DE DOMÍNIO NÃO É PARTE – OFENSA AO PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE – AUSÊNCIA DE DECISÃO JUDICIAL RECONHECENDO FRAUDE À EXECUÇÃO OU FRAUDE CONTRA CREDORES – DÚVIDA PROCEDENTE – RECURSO NÃO PROVIDO”. Na fundamentação do Acórdão em referência, ponderou-se que “Em suma, não havendo correlação entre o titular de domínio e a executada no processo no qual foi determinada a hipoteca judiciária, não há como deferir o registro pretendido, sob pena de se afrontar o princípio da continuidade registraria.”.

Averbação premonitória

A averbação premonitória encontra fundamento legal nos Art. 792 e 828 do CPC.

Diz o Art. 792 que a alienação ou a oneração de bem é considerada fraude à execução quando sobre o bem pender ação fundada em direito real ou com pretensão reipersecutória, desde que a pendência do processo tenha sido averbada no respectivo registro público, se houver, quando tiver sido averbada, no registro do bem, a pendência do processo de execução, na forma do art. 828, quando tiver sido averbado, no registro do bem, hipoteca judiciária ou outro ato de constrição judicial originário do processo onde foi arguida a fraude, quando, ao tempo da alienação ou da oneração, tramitava contra o devedor ação capaz de reduzi-lo à insolvência e nos demais casos expressos em lei.

Vale dizer que em 2009 o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 375 pela qual “O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente”.

O que se pretendeu, dessa forma, é de um lado garantir ao exequente que, após identificar bens passíveis de constrição em processo de execução, os reserve para essa finalidade, dando ciência erga omnes da existência da constrição para que terceiros, ainda que não identifiquem via certidões de distribuidores judiciais, tenham pleno e fácil acesso a eventuais constrições que onerem dado ativo.

Observe-se que não se está a falar da averbação de penhora ou arresto sobre bens do executado, mas sim, antes mesmo que eventual penhora ou arresto venha a ser deferido, se está a falar da possibilidade de o exequente desde logo dar conhecimento geral sobre a pendencia de uma execução que poderá futuramente recair sobre o bem que foi identificado e em cuja matricula foi advertida a pendencia do processo para que terceiros não possam futuramente alegar desconhecimento.

A averbação premonitória está vinculada, portanto, ao processo de execução ou ao cumprimento de sentença e visa, tanto quanto a hipoteca judiciária, prevenir a fraude à execução mediante a publicidade da existência de processo capaz de atingir aquele bem para a sua satisfação.

A averbação premonitória, por sua vez, somente é possível a vista de imóveis passíveis de penhora, arresto ou indisponibilidade, consoante preceitua o Art. 828 do CPC. Por esse motivo, não cabe utilizar a averbação premonitória para onerar imóvel caracterizado como “bem de família”, conforme já decidiu o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo no Agravo de Instrumento 2230526-73.2016.8.26.0000, da 38ª Câmara de Direito Privado, de lavra do Desembargador Spencer Almeida Ferreira, assim ementado: “(…) AVERBAÇÃO PREMONITÓRIA – BEM DE FAMÍLIA – Decisão que indeferiu averbação premonitória da execução em imóvel que constitui bem de família – Descabimento – O art. 828 do CPC/2015 restringe a averbação de execução em matrícula apenas a bens sujeitos à penhora, arresto ou indisponibilidade – Imóvel caracterizado como impenhorável que, portanto, não pode ser objeto de referida averbação – Sujeição à penhora que caracteriza pressuposto da averbação premonitória – Decisão mantida – RECURSO NÃO PROVIDO, na parte conhecida.”

Distinção de averbação premonitória e hipoteca judiciária

Os institutos da averbação premonitória e hipoteca judiciária são distintos apesar da aparente semelhança. Todavia, o objetivo que se percebe em ambos institutos é o mesmo: prevenir a fraude à execução na medida em que a lei processual presume-se fraude à execução a alienação ou a oneração de bens efetuada após a averbação (tanto da hipoteca judiciária quanto da averbação premonitória), a teor do Art. 828, §4º do CPC.

Conforme explanamos acima, a hipoteca judiciária depende tão somente de uma decisão judicial condenatória ou conversível em pena pecuniária (independentemente da natureza do processo no qual vier a ser proferida) ao passo que a averbação premonitória está necessariamente vinculada a processo de execução (ou cumprimento de sentença). Além disso, o procedimento para a formalização também é distinto já que a averbação premonitória depende de certidão expedida pelo juízo da execução enquanto a hipoteca judiciária independe de qualquer ato além da própria decisão condenatória.

Dessa forma, em ação comum (indenizatória, por exemplo), basta uma sentença ser proferida para que venha a ser levada ao Registro de Imóveis para fins de hipoteca judiciária – ainda que não transitada em julgado ou pendente de julgamento de recurso, independentemente do efeito no qual vier a ser recebido.

Arthur Zeger, advogado, mestre, professor universitário em cursos de graduação e pós graduação em Direito Civil e Processo Civil

Fonte: Iregistradores