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Escritura pública para inventário e divórcio

30-03-2015

Por Adriano Perácio de Paula

Deve ser prevista de maneira bem clara a questão dos alimentos, seja entre cada um dos cônjuges, se houver acordo, e desses em relação aos filhos. Essa definição pode ser alterada no futuro e a qualquer tempo

LEI Nº 11.441

Desde sua publicação, já vigora a Lei nº 11.441, de 4 de janeiro de 2007, a permitir que o inventário, o divórcio e a separação de casais se façam diretamente em cartório de notas, mediante escritura pública. Apontamos alguns dados que reputamos importantes, mas que dependerão ainda de eventuais regulamentações e do exercício prático das novas medidas. Quanto ao inventário, temos que até que se lavre a escritura pública, a herança cabe a todos os herdeiros de forma unitária e indivisível, devendo ser aberto o inventário até 60 dias depois do óbito.

Correto afirmar que a companheira ou companheiro sobrevivente de relação de união estável deve participar da sucessão, podendo ter direito à totalidade da herança na falta de parentes que sucedam a quem morreu. Tem-se ainda a possibilidade de que a renúncia à totalidade ou parcela da herança se faça na escritura pública de inventário, mas ressaltando que o ato de renúncia é irrevogável (art. 1.812 do Código Civil). Anote-se que essa forma de inventário dispensa a indicação do inventariante.

Ainda que não conste da escritura pública, a herança responde pelas dívidas mesmo depois da partilha. Já a possibilidade desta ser anulada existe, e pode ser feita consensualmente a qualquer tempo e pelas mesmas partes envolvidas. Porém, a anulação judicial deve ser exercida até um ano depois de lavrada a escritura.

Sobre separação e divórcio, temos que os prazos para ser pedida a separação a partir da celebração do casamento civil continuam sendo de um ano, mas pode se pedir o divórcio direto, desde que no ato da escritura o casal comprove a separação por mais de dois anos (art. 1.580 do Código Civil). Daí ser importante que também compareça, pelo menos, uma testemunha a confirmar essa situação.

Com isso, a escritura pública de separação ou divórcio direto importa na conseqüente separação de corpos e na partilha de bens do casal, não podendo ser usada a escritura pública quando houver filhos menores. Mas esse recurso pode ser empregado até mesmo sem a presença dos interessados, que podem nomear os respectivos advogados para representá-los no ato de lavratura da escritura pública. Essa procuração deve ser outorgada por instrumento público e contendo poderes especiais, mesmo para o inventário.

Uma vez que a separação ou divórcio por escritura pública é consensual, não há que se falar em declaração de culpa por qualquer dos cônjuges, e nem a escritura pode ser lavrada com ressalvas. Devendo ainda constar, obrigatoriamente, se os cônjuges voltam a usar o nome de solteiro ou não.

Ao contrário do que ocorre nos processos judiciais, se dispensa a tentativa de reconciliação, assim como a indicação das causas que redundaram na separação ou no divórcio. Desde já, nessa escritura de separação, assim se entendendo as partes, ambos podem outorgar reciprocamente, um ao outro, a procuração, para que, depois de um ano dessa separação, apenas um deles compareça, também representando o outro, e faça a conversão em divórcio, desde que sejam mantidas as mesmas estipulações feitas na separação.

Outro aspecto relevante é que somente se pode fazer separação e divórcio por escritura pública se mulher e marido forem capazes e estiverem no pleno discernimento. Verificada a incapacidade de qualquer deles, somente pela via judicial se dará fim ao matrimônio.

Ao escrivão não cabe recusar o ato de lavrar a escritura pública se nada houver que a impeça. E como o próprio nome diz, é escritura pública, ao contrário dos processos levados à Justiça, e que tramitam em segredo. Pelo que não há que se falar em sigilo da escritura pública que tratar de separação ou divórcio (art. 42, da Resolução nº 35/07, do Conselho Nacional de Justiça).

Além de tudo, o cartório de notas, a exemplo da escritura pública de alienação de imóveis, não precisa estar situado na mesma cidade do casal em separação, ou do último domicílio da pessoa que morreu em caso de inventário. Apenas se considera formalizada a separação ou divórcio, ou mesmo o inventário, depois das respectivas averbações, apesar de que, a partir da escritura, os direitos e deveres que forem ajustados já valem entre o casal e herdeiros.

Enquanto não for levado ao registro civil esse documento, o matrimônio ainda persiste e os cônjuges podem voltar a se reunir, caso queiram, independentemente de novo casamento. Valendo essas regras para o fim da união estável e com referência a eventual contrato existente.

Deve ser prevista de maneira bem clara na escritura pública, a questão dos alimentos, seja entre cada um dos cônjuges, se houver acordo, e desses em relação aos filhos. Esses alimentos podem ser alterados no futuro e a qualquer tempo, por nova escritura pública, por outro documento particular ou mesmo judicialmente. O novo casamento do cônjuge devedor da pensão ao outro não modifica essa obrigação, ao passo que o novo casamento do cônjuge que é credor da pensão alimentícia extingue a obrigação a partir do novo casamento.

De posse do traslado da escritura pública, cada interessado pode levar ao registro a partilha de imóvel, de veículo, ou qualquer outro bem móvel, como telefone e assinaturas de serviços, entre outros. Diz a lei ser indispensável para lavrar a escritura, pelo menos, a presença de um advogado comum ao casal e aos herdeiros, mas se dispensa qualquer intervenção do Ministério Público e dos representantes da Fazenda Pública, a não ser que regulamentações específicas prevejam de forma diferente.

E a questão das custas para separação e divórcio, acaso se mostrar-se mais onerosa a escritura pública, com certeza compensará pelo ganho de tempo, pois tudo se resolve em questão de dias, acentuando que o casal que declarar, com base na realidade, não ter condições econômicas, tem direito à gratuidade das custas desse documento.

*Adriano Perácio de Paula: Advogado, doutor em direito pela UFMG

Fonte : Jornal “Estado de Minas” – Caderno Direito & Justiça