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Clipping – JCNET – Bauru (SP) não tem lei eficaz de imóveis abandonados que provocam perigo

07-03-2019

Vácuo em legislação dificulta solução de problema sanitário e riscos em construções e imóveis abandonados; prefeitura recorre ao Judiciário quando precisa

Bauru não é cercada por barragens como Brumadinho e Mariana, mas sua zona urbana esconde hoje uma situação que gera riscos para toda a população: o abandono de construções e imóveis. São prédios e casas que são esquecidos pelos donos e acabam gerando ameaças sanitárias, sociais e estruturais à vizinhança. A cada ano, o problema cresce e a prefeitura se diz sem poder de ação fora das vias judiciais, apontando que as leis do município possuem vácuos. Resultado: situações urgentes acabam levando mais tempo para serem resolvidas e, muitas vezes, é preciso que acidentes aconteçam ou que as denúncias de problemas cheguem até o poder público para que algo de fato seja feito contra o imóvel abandonado.

Nas últimas semanas, a frase restrita ao filme “O Inimigo mora ao lado” ganhou sentido na vida de seo João Roberto Rosseti, de 73 anos, e de mais 79 famílias moradoras de um condomínio na Vila Nova Cidade Universitária. Eles são vizinhos de um prédio em construção que teria sido abandonado há dois anos, na quadra 1 da rua Engenheiro Alpheu José Ribas Sampaio. E relatam conviver com medo da queda de estruturas de madeira que não foram retiradas quando a obra paralisou.

Em uma das últimas chuvas, um madeirite de aproximadamente 50 quilos voou do alto da obra e acertou a janela de um apartamento no condomínio de seo João. Na sequência, o objeto caiu sobre o telhado do salão de festas e danificou as telhas.

“Imagine se tivesse atingido alguém? Por sorte não bateu na janela de vidro e os moradores não estavam lá. Estamos convivendo com o medo aqui. O madeiramento da obra ficou velho, secou e se desprega fácil. Meu prédio já tentou contato com o dono, mas ninguém aparece. É algo absurdo”, reclama o morador.

O zelador Izael Pedrozo reforça o apelo, dizendo que não foi o primeiro acidente. “Tábuas já caíram outras vezes no telhado da garagem. Em dia de chuva, os moradores até tiram o carro de medo. Está perigoso”, destaca.

A reportagem tentou contato com a construtora Versacce, mas ninguém atendeu os telefonemas.

Defesa Civil

Somente após a denúncia de acidente no condomínio é que a Defesa Civil de Bauru esteve no local e elaborou um relatório atestando os riscos de queda das estruturas.

“O madeiramento está solto. Comunicamos a Seplan e encaminhamos para o Jurídico, mas há dificuldade em encontrar os proprietários. Parece que o responsável faleceu e a família não é de Bauru. Precisamos notificá-los. Enquanto isso, a população sofre pela imprudência de outras pessoas, infelizmente”, comenta o coordenador da Defesa Civil Thiago Azambuja.

Azambuja admite que o atendimento do órgão tem funcionado só por meio de requerimento.

Sobre a existência outros possíveis imóveis em condições parecidas ou com risco de desabamento, ele afirma que não há nenhum na cidade.

“Temos uma lista de 2018 com 48 interdições em imóveis por riscos estruturais, mas a maioria é de casas. A Casa do Pioneiro, na avenida Rodrigues Alves, é um deles. Ela até gera riscos, mas não são de grandes proporções. Este prédio na Vila Nova Universitária é o único que foi abandonado com a estrutura de madeira externa montada”, compara.

Um vácuo na lei municipal

Segundo a lei municipal, as construções podem levar até 5 cincos para serem concluídas em Bauru.

Atualmente, a cidade possui uma lista com cerca de 80 imóveis abandonados. Chefe da Secretaria de Planejamento (Seplan), Letícia Kirchner explica que a lei 6.391/2013 prevê como medida administrativa a arrecadação desses locais, mas a legislação esbarra nas pendências tributárias. “É uma lei amparada em outra legislação federal. O proprietário precisa ficar três anos sem pagar IPTU, só que dificilmente eles não quitam no prazo. Discutimos, hoje, a possibilidade de um reestudo para não amarrar o abandono na pendência tributária. Só que não adianta o município criar uma lei mais rigorosa que a federal”, cita a secretária.

“Não existe uma medida simples e eficaz. Sem dúvida, é um problema social e sanitário. Vivemos em um País que ainda defende muito o direito à propriedade e para você entrar no imóvel de alguém, mesmo que abandonado, e tomar uma providência, tem que ser por via judicial movida pelo município”, completa Kirchner.

Há ainda a possibilidade de aplicação do IPTU Progressivo, se constatado que o imóvel não cumpre sua função social. Ainda assim seriam mais 5 anos apenas para majoração do valor. “Se for um imóvel em construção, poderia levar até dez anos para a prefeitura desapropriá-lo”, reforça Kirchner.

O caminho para a solução, então, tem passado pela Justiça quando o imóvel apresenta problema urgente de insalubridade ou de risco relatado pela Defesa Civil em relatório. O documento é juntado em ação judicial, que é protocolada pela Secretaria de Negócios Jurídicos ou pelo do Ministério Público. Toninho Garms, da Secretaria de Negócios Jurídicos, diz que os pedidos, antes de serem ajuizados, são submetidos à autorização do prefeito. “Mesmo abandonado, o imóvel sempre tem dono. A maioria das liminares são pela Obrigação de Fazer”, cita. Ele não soube especificar, contudo, com que frequência a prefeitura tem ajuizado as medidas.

Fonte: JCNET