Notícias

Artigo – Direito Net – Da retificação e da anulação da partilha realizada em sede de inventário extrajudicial – Por Julio Martins

18-03-2020

Importa por fim ressaltar (dúvida muito recorrente) que não existe prazo para a retificação de uma Escritura Pública, porém, muitos problemas podem ocorrer quando se “descobre” o erro muito tempo depois da sua lavratura.

A alvissareira Lei 11.441/2007 possibilitou a realização da partilha diretamente em Cartório, sob a obrigatória assistência de advogado.

Já não é novidade que desde a edição da Lei 11.441/2007 tornou-se possível resolver muito mais rapidamente em Cartórios de Notas de todo Brasil Inventários e Partilhas, desburocratizando boa parte da liturgia até então estabelecida no procedimento que somente se podia manejar pela via Judicial – permitindo com isso e com muito mais facilidade, rapidez e economia regularizar bens componentes de heranças – ainda que evidente a facultatividade do procedimento.

A via judicial manteve a realização da modalidade simplificada do Inventário além de outras espécies.

Considerando os últimos julgados e modificações regulamentares sobre o Inventário Extrajudicial já podemos dizer que a existência de Testamento não é mais impedimento para a realização do trâmite pela via extrajudicial, portanto, havendo Testamento deixado pelo morto a solução poderá ser alcançada pela via Judicial ou pela Extrajudicial (vale lembrar que essa possibilidade existe no Rio de Janeiro desde 2014).

Mas e como fica nas hipóteses, não muito raras, de retificação ou anulação da partilha realizada através de Inventário Extrajudicial? Uma Escritura de Inventário Extrajudicial pode ser corrigida ou anulada?

Da Retificação da Partilha Extrajudicial

A Partilha que se dá na forma da Lei 11.441/2007 corporifica-se no bojo de uma Escritura Pública. Por tal motivo, em prestígio a já antigo e pacificado entendimento da seara do Direito Notarial e Registral, só se retifica uma Escritura Pública com a participação de todos aqueles que nela assentiram e participaram – não sendo nem mesmo o caso de se socorrer, como alternativa, da intervenção do Tabelião ou do Juiz de Direito. A lição basilar é de PONTES DE MIRANDA, segundo o qual,”falta qualquer competência aos Juízes para decretar sanações e, até, para retificar erros das escrituras públicas: escritura pública somente se retifica por outra escritura pública, e não por mandamento judicial” (Cfr. R.R. 182/754 – Tratado de Direito Privado, Parte Geral, Tomo II, 3ª ed., 1970, Borsoi, § 338, pág. 361).

A lição também é presente no magistério do ilustre Advogado e Desembargador Aposentado do TJSP, doutor NARCISO ORLANDI NETO, para quem,

“Não há possibilidade de retificação de escritura sem que dela participem as mesmas pessoas que estiveram presentes no ato da celebração do negócio instrumentalizado. É que a escritura nada mais é que o documento, o instrumento escrito de um negócio jurídico; prova pré-constituída da manifestação de vontade de pessoas, explicitada de acordo com a lei. Não se retifica manifestação de vontade alheia. Em outras palavras, uma escritura só pode ser retificada por outra escritura, com o comparecimento das mesmas partes que, na primeira, manifestaram sua vontade e participaram do negócio jurídico instrumentalizado.” (Retificação do Registro de Imóveis, Juarez de Oliveira, pág. 90).

Por óbvio que casos em que o objeto da retificação serão apenas erros materiais, que não importarão em qualquer modificação da substância da vontade declarada e entabulada pelo público instrumento. Para estes casos, por certo o Código de Normas local disporá sobre o procedimento, este sim, mais facilitado.

No específico caso do Rio de Janeiro, dispõe a Consolidação Normativa que bastará ressalva feita pelo Tabelião de Notas, sem assinaturas das partes, sob sua inteira e exclusiva responsabilidade (art. 23, inc. IV). Estando, nesta hipótese, já registrada no Ofício Imobiliário deverá ainda o Tabelião oficiar ao Ilustre Registrador noticiando o conserto (art. 237, par. único).

Oportuno lembrar que a retificação por erro atribuído ao Cartório que lavrou a Escritura não pode ser cobrada da parte, como assegura o art. 3º, inc. IV da Lei 10.169/2000, que estabelece normas gerais para a fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro em todo o Brasil.

Importa por fim ressaltar (dúvida muito recorrente) que não existe prazo para a retificação de uma Escritura Pública, porém, muitos problemas podem ocorrer quando se “descobre” o erro muito tempo depois da sua lavratura, sendo muito comum o falecimento de uma das partes. E nesse caso, como fica? A solução, então, nesta hipótese excepcional, será o suprimento da vontade da parte falecida com a autorização judicial como tem decidido os Tribunais (TJSP, 1005410-28.2014.8.26.0100).

Da Anulação da Partilha Extrajudicial

A anulação de uma partilha extrajudicial deve ser manejada somente através de uma Ação Judicial e dentro do prazo decadencial de 01 (um) ano conforme regras do CPC/2015 c/c CCB/2002.

Assenta o artigo 657 do Código Fux que,

Art. 657. A partilha amigável, lavrada em instrumento público, reduzida a termo nos autos do inventário ou constante de escrito particular homologado pelo juiz, pode ser anulada por dolo, coação, erro essencial ou intervenção de incapaz, observado o disposto no § 4º do art. 966 .

Parágrafo único. O direito à anulação de partilha amigável extingue-se em 1 (um) ano, contado esse prazo:

I – no caso de coação, do dia em que ela cessou;

II – no caso de erro ou dolo, do dia em que se realizou o ato;

III – quanto ao incapaz, do dia em que cessar a incapacidade.

 

Por sua vez o art. 2.027 do Código Reale assevera:

Art. 2.027. A partilha é anulável pelos vícios e defeitos que invalidam, em geral, os negócios jurídicos.

Parágrafo único. Extingue-se em um ano o direito de anular a partilha.

A questão do [exíguo] prazo específico de 01 (um) ano encontra inclusive respaldo em decisões do STJ (REsp 1.677.422/SP, p.ex.) – prazo único e específico para a anulação da partilha no âmbito da sucessão hereditária.

Nos casos onde, por exemplo, o herdeiro que propõe a ação para declarar nulidade da partilha extrajudicial tenha sido dela preterido, não há que se falar no prazo de um ano por se tratar, justamente, de ato onde a parte dele não participou – sendo o caso de prazo prescricional de 10 anos (CC 205), que flui a partir do momento em que o herdeiro tomou conhecimento da partilha. O ponto de ouro para o deslinde da questão aí diz respeito ao REGISTRO que confere toda publicidade ao ato notarial lavrado.

A respeito do caso específico de herdeiro preterido em partilha a doutrina da ilustre Advogada e Desembargadora Aposentada do TJRS, doutora MARIA BERENICE DIAS é digna de todo prestígio:

“Quando houver preterição de herdeiro, a partilha é nula e não anulável. Também o é se houver exclusão de herdeiro testamentário ou inclusão de quem não é herdeiro. […] Se o herdeiro é excluído, por não constar da declaração dos sucessores ou por não ter sido citado para o inventário, o julgado, por ser res inter alios acta, não pode prevalecer contra quem tinha interesse legítimo em ser declarado e citado no processo, mas não o foi. A ação de petição de herança serve exatamente para corrigir este erro. Leva à nulidade da partilha e o prazo prescricional é de 10 anos (CC 205), que flui a partir do momento em que o herdeiro tomou conhecimento da partilha” (Manual das Sucessões, 4ª Ed. Ed.Rev. dos Tribunais, p. 608)

Por fim, que deve ser observada a regra de competência do art. 48 do CPC/2015, sendo esgrimada a ação judicial no foro do domicílio do autor da herança.

Fonte: Direito Net